domingo, 31 de julho de 2011

FUTEBOL ABSURDÍSSIMO

texto publicado no jornal O estado do Maranhão,
sábado, seção Hoje é dia de...caderno Alternativo


O que é mais absurdo, quatro atacantes de uma seleção brasileira desperdiçarem todos os quatro pênaltis chutados numa decisão ou os governantes  estarem construindo,  para o Coríntians, um estádio de futebol, a custo de novecentos milhões? Ou a arrogância de Ricardo Teixeira e dos atuais técnicos de nosso futebol?
                   Vamos por partes.
                                     
1.       Em matéria de arrogância nada é mais sintomático que a última frase de Felipão, o boquirroto treinador, proclamando-se o único responsável pelas vitórias e derrotas de seu time, o Palmeiras. Como se ele fizesse gols - como Kleber, ou defendesse bolas - como Marcos.
                   Ora, se alguém quiser saber qual foi o técnico de futebol que conquistou mais títulos no futebol brasileiro quem saberia dizê-lo, de pronto? Apressadamente, a grande maioria dos torcedores se lembraria de Telê, Vanderlei Luxemburgo, Muricy Ramalho, etc. sem chegarem, nem de perto, a tangenciar a verdade. Pois respondo eu: o técnico que mais títulos ganhou  no futebol brasileiro chamava-se Lula.
                   “Quem? Lula? O cronista deve está confundindo alhos com bugalhos!”, deve estar pensando o leitor.  Nem alhos nem bugalhos. O técnico Lula, hoje completamente esquecido, foi o técnico  do Santos nos tempos áureos de Pelé, Coutinho e Pepe e ganhou tudo e mais que tudo. Venceu num tempo em que quem ganhava o jogo era o jogador de futebol e não o técnico,  e sua grande virtude - o que não era pouco  - se resumia àquela  da definição de Romário: “Bom técnico é aquele que não atrapalha.”
                   Virtude essa que nem passa pela cabeça dos atuais técnicos de futebol  cuja arrogância aumenta na mesma proporção em que são tratados como semideuses e ganham rios de dinheiro. Prepotentes como Mano Meneses, asquerosos como Luxemburgo, ou estúpidos  como Dunga, a arrogância dos mesmos só tem explicação como arma pessoal de defesa, para que os iludidos torcedores jamais  desconfiem da verdade óbvia que há por trás da supervalorização dos seus trabalhos.
                   Nenhum deles jamais ganhou sozinho jogo algum, nenhum deles tem valia para um time a ponto de prescindir dos craques. Tão auto-suficientes e enganadores são que, quando chegam a um time, quando contratados, a primeira coisa que pedem é a urgente contratação de bons jogadores. Se são contrariados,  fazem como  Muricy Ramalho que abandonou o Fluminense como um rato fujão e se mandou para o Santos, a fim de fazer história às custas de um  elenco de craques como Neymar, Ganso, Elano etc. Está se dando bem.

2.                 Na outra face do absurdo nada é mais impensável, insensato e inconseqüente do que a decisão tomada pela Prefeitura de São Paulo e do Governo Federal de , através do BNDES, doarem um estádio de futebol ao Coríntians,  sob a desculpa de moldar-se às imposições da FIFA. O argumento, tão débil, que não resiste à mera evocação de um estádio já pronto, o Morumbi, faz acreditar que no manuseio de “nosso” dinheiro  (não se esqueça de que você é que pagará por cada tijolo desse estádio )  a desfaçatez dos mandatários se socorre da apatia de um povo  que não percebe que, mais uma vez, estará sendo extorquido por oportunistas, ao som do oba-oba de uma Copa do Mundo.
                   Mais absurda que  a própria construção do estádio,  é a decisão de cede-lo a uma entidade privada. É o caso de se perguntar: se querem dar um estádio ao Coríntians, por que não ao Flamengo, ao Atlético Mineiro, ao  Boa da série B ou ao Asas de Arapiraca? Que diferenciação é essa? Fica claro que o que move os autores da façanha não é o compromisso com um projeto nacional e patriótico, mas  o de angariar votos entre os corintianos – caso de Gilberto Kassab – e, por tabela ( só Deus sabe o que está por trás disso...) renderem-se às estripulias ladinas já denunciadas pala imprensa,  de dois artífices em jogadas escusas: Andrés Sanchez o presidente do Coríntians e seu amigo de fé Ricardo Teixeira , o arrogante que (citado várias vezes  pela imprensa internacional como corrupto) se julga o dono do futebol brasileiro.
                   Em crônica recente da revista Veja dois especialistas britânicos desfazem o mito de que os gastos exorbitantes da promoção de uma Copa, terão contrapartida no retorno financeiro trazido pelos turistas.  Longe disso. Segundo eles o retorno de uma promoção de uma Copa do Mundo deixa como único respaldo a felicidade de um povo durante a realização da mesma. Felicidade? Ora, que restará de felicidade se o Brasil, por ironia do destino, perder a Copa?
                   Felicidade por felicidade (falsa ou não)  ela já existe todo ano, durante o Carnaval. Só que, desta vez, os elefantes brancos nos quais se transformarão os estádios de futebol, infelizmente, não serão apenas meros carros alegóricos percorrendo as avenidas.

                                                                                                                                                                                   ewerton.neto@hotmail.com

domingo, 24 de julho de 2011

O TELE-VIGENTE

Artigo publicado no jornal O estado do Maranhão,
caderno Alternativo, seção Hoje é dia de...

                                     ewerton.neto@hotmail.com





                            Descobriu-se no último recenseamento que uma nova raça denominada TELEVIGENTE é a maioria incontestável da população brasileira. Nem branca, nem preta, nem parda, nem mulata. Ao invés de cor de olhos, pele, ou outro atributo físico, uma única característica basta para diferenciá-la: não pode desgrudar da televisão ou da Internet.  Segundo temem os cientistas (ver entrevista na Veja) a memória dessa raça já exibe sintomas de incapacidade para atividades que exijam concentração e leitura: o que esperar deles para o futuro? 
                            Já que, pelo menos fisicamente é igual a todos, o televigente teria sentimentos? O que come, o que enxerga? Consegue perceber  a luz ao redor, o que pensa  a respeito do futuro, do sentido da vida? Essas perguntas são cruciais para os cientistas,
 Foi fácil entrevistar um deles, já que estão em todo lugar.
Nas churrascarias engolindo um pedaço de picanha ( pouco preocupados em sentir o sabor da carne, evidentemente) enquanto grudam os olhos na novela. Ou, ultimamente,  nos banheiros,  sentados no vaso, olhos na tela, tentando ler alguma asneira do twitter de algum ex-BBB, com um notebook no colo.
-         Como é seu nome?
-         Nome?
-         Seu nome... Você deve ter um nome.
                            -    Acho que é Maria. Maria-vai-com-as-outras, ou melhor Maria-vai-com o que-a- tevê-diz. Ou o facebook, ou o twitter.
-         Tem família?
                            - Devo ter. Se bem que às vezes confundo. De vez em quando passam algumas sombras pela casa a me chamarem de pai, irmão, filho, qualquer coisa dessas; outras vezes chega alguém em forma de esposa, que me pede dinheiro para comprar pão, de manhã cedo. Mas tem a Norma, o Beto, a Eunice. São personagens de novela, eu sei, mas eu passo tanto tempo com eles e pensando neles que acho que essa é a minha verdadeira família.
                            - Tem preferências musicais?
-         Depende.
-         Depende do quê?
-                    Depende da programação da tevê, depende do que a comunidade do facebook sugere. Se eles me disserem que hoje é dia do Gaviões [do forró]  eu gosto, se for dia da Calcinha [preta]  eu gosto, se me disserem que é dia do Luan Santana, ainda que o rapaz seja insuportável, mesmo assim eu gosto. Deu prá entender? Meu gosto varia conforme o humor – dos outros.  Isso tem uma vantagem, eu não preciso matar minha cabeça para ter gosto pessoal.
-          Por falar em gosto musical, por acaso já ouviu falar em clássicos?
                            - Como assim? Vasco e Flamengo? Ou Brasil e Paraguai? Ah, acho que claro que sim, estava com raiva daquela seleçãozinha, mas o Galvão Bueno e o Casagrande falaram que o Brasil jogou até bem, então mudei de idéia. Também nunca entendi porque o Coríntians vai ganhar um estádio, de graça, com o nosso dinheiro, mas já que jamais ouvi alguém da  tevê reclamar disso, achei melhor deixar pra lá. 
-         Você pensa?
-                    Acho que sim, um segundo ou dois por dia, que é o tempo que se leva para ligar a televisão, ou para passar de um canal para o outro, mas nem eu mesmo sei se isso é pensamento ou esquecimento. De qualquer forma, não sinto falta.
-         Livros?
-                    Aprecio muito, principalmente os de maior volume Servem para apoiar o lap-top antes de eu cochilar no terraço.
-         Gosta do seu país?
-                     Suponho que este seja o Brasil não? Deve ser  o que está do lado de fora da janela, na rua. É meio chato, mas ultimamente, tenho uma televisão em cada canto da casa, isso facilita suportá-lo.
-         E a vida?
-         Vida?
-         É aquilo que acontece vez por outra, enquanto você...
-         Não acredito nisso. Deve ser mentira, coisa de lunático. Não deve existir. Em que botão se liga? Vida teria de ser no mínimo colorida, com as cores da minha, digital de 44 polegadas.
-                    Você podia olhar de vez em quando para o mundo ao redor.
-                    Já tentei e desisti. Tudo é feio e triste. Parece um filme ruim em preto e branco.
-         E Deus?
-                    Se não existe vida fora da televisão, como pode existir Deus?. Para mim Deus é uma espécie de Galvão Bueno, Caco Barcelos, Pedro Bial, Suzana Vieira, ex-BBBs... tudo junto
-         Tem certeza?
-                    Absoluta. Se existisse Deus e consequentemente vida fora da televisão o Jornal Nacional já teria anunciado. Em edição extraordinária.

domingo, 17 de julho de 2011

O BE-A-BÁ DE BRASÍLIA E...

Artigo publicado na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal O estado do Maranhão


Fala-se muito em Brasília – e de Brasília – mas poucos a conhecem, de fato. Marcelo Torres, que é baiano, jornalista e radicado em Brasília irmão do consagrado escritor Antonio Torres, fez uma obra bem-humorada para suprir, um tanto, esse desconhecimento. Trata-se de o Be-a-bá de Brasília, da Thesaurus Editora, dicionário de coisas e palavras da capital federal.
            Foi pegando carona nesse livro,  com que me presenteou gentilmente, que começou  a história desta crônica que, espero, os estmulem a se deliciarem com  o livro.  Vamos ao Be-a-Bá de lá:  
BOLOLÔ. Confusão. Ex. “A reunião foi um bololô.” ( Portanto, lá em Brasília quando tudo não acaba em pizza, acaba em bolo-lô)
BOM DIA! Saudação muito pouco usada. De dez pessoas que entram num ônibus seis não dão bom dia. Dizem que o brasiliense espia pelo buraco da fechadura para não ter que dar bom dia ao vizinho. (O costume  deve ter começado com os poderosos. Como dar bom dia a um sujeito, cujas “virtudes” se conhece na intimidade?)  
BOROGODÓ. Atrativo masculino equivalente ao tchan baiano. É algo que deixa atraente um homem, quando não tem beleza física. (Alguém  duvida do que seja o  borogodó ? Borogodó em Brasília ou em qualquer lugar,  é aquilo que não faz ser bonito nem bom de cama, mas dá para pagar uma boa pensão alimentícia.)
BRASILITE. Hábito, mania ou jeito típico de Brasília. Inclui tantas reações positivas como negativas. (O primeiro cara que sofreu com isso foi JK. Tinha brasilite aguda precoce).
CADA UM NA SUA QUADRA. Em Brasília é cada um na sua quadra - ou entrequadra, ou superquadra.  (Já quem mora na periferia, para compensar que não morar em quadra,  é  en-quadrado. Pela polícia).
CAIXÃO. Ônibus. (No Maranhão o equivalente é buzu, mas o termo brasiliense é muito mais verdadeiro. Como se sabe, a única diferença entre um bom buzu e um caixão de defunto é que, no primeiro, a morte é coletiva).
BRASLONGE. Refere-se à Brasilândia, a cidade-satélite mais distante. (Não confundir com Brasíliadelonge, local onde trabalham muitos deputados e senadores que, embora lotados em Brasília dão expediente no Rio e São Paulo).
CAFUBIRA. Pessoa muito feia. (A mesma coisa que os colunistas puxa-sacos da capital - referindo-se a políticos buxudões e peruas encarquilhadas, chamam de “gente bonita” nas colunas sociais dos jornais)
COBRECHEQUE. Forma irreverente do   brasiliense   chamar o nome do seu fundador Kubitschek. (Talvez, porque este tenha deixado, por conta da fundação de Brasília, a nação por muito tempo com cheques a descoberto) .
COMIDAS TÍPICAS. Aos sábados, em Brasília come-se churrasco no clube; domingo acarajé na Torre de TV; segunda-feira farofa de ovo no restaurante do trabalho; terça,  pastel de cana na Rodoviária; quarta,  pão de queijo em todo lugar; quinta, arroz de pequi e sexta-feira, feijoada onde quer que você vá. (Ou seja, o único prato verdadeiramente típico dos poderosos de Brasília  é Povo à moda da Casa [não confundir com polvo] )
CONGRESSO NACIONAL. É o cartão postal, o retrato maior da cidade. Apesar da beleza estética, o Palácio do Congresso Nacional carrega simbologia negativa em razão do acúmulo dos escândalos. Uma das referências mais negativas circula há anos, na Internet: “Se gradear vira jardim zoológico; se murar vira presídio; se botar lona, vira circo. Se colocar luz vermelha vira puteiro; e se der descarga ninguém sobra.”
C.P.F  .  Na linguagem brasiliense dos corruptos ativos e passivos significa Comissão Por Fora, ou seja, propina, suborno, corrupção, ao contrário do C.P.F. usual.  (Outra diferença é que o C.P.F comum só tem oito números enquanto os de lá tem zeros que não acabam mais. É de se esperar que para o C.P.F. dessa turma [ como o do filho do ex-ministro dos Transportes que multiplicou o patrimônio de sua empresa de sessenta mil reais para sessenta milhões em dois anos] três letras seja muito pouco, precise do alfabeto inteiro).
JUSCELINOMYS CANDANGO. Rato típico de Brasília, descoberto na época da construção. O descobridor foi um biólogo mineiro que deparou no cerrado com um animal da família Cricetidae e, em homenagem a JK, assim o batizou. ( Bons tempos aqueles em que os únicos ratos que infestavam a cidade eram do tipo Juscelinomys Candango e não, como agora, ratazanas do tipo Alfredonomys Nascimento ou Robertonomys Arruda)  
JABURU. Nome do palácio onde moram o vice, Michel Temer e a vice-primeira-dama. (Obviamente, a bela Marcela Temer, vice-presidente,  deve ter sido bem recompensada pela sua coragem de nada Temer: mora num Jaburu e casou com um)
                                                                                  ewerton.neto@hotmail.com

terça-feira, 12 de julho de 2011

SE VOCÊ QUER MAIS FAÇA MAIS

artigo publicado na Seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, Jornal O estado do Maranhão, sábado


                                                                                                                                                                                                                                                                                                     ewerton.neto@hotmail.com
                                                                                             


            O pessoal só pensa nisso! – foi o que pensei quando li pela primeira vez a frase “Se você quer mais faça mais!”, apontando para mim, num out-door. Ainda mais que Logo depois se seguiu outra: “Se eu fosse você eu faria”, ostentando, no fundo, a figura de uma simpática anciã. “Coitadinha”, pensei  “sente falta, mas já não tem idade para isso”. O que me levou, depois, a ponderar: por que razão tanta obsessão dessa gente com o sexo dos outros?
            Enganei-me, porém. Foi o que logo descobri  ao deparar com mais de vinte cartazes espalhados pela cidade. Tratava-se não de sexo, mas – pasmem! - de cursos de aperfeiçoamento. Como explicar, então, a origem de tão peremptórias frases? Seria, talvez,  mais uma fórmula sub-reptícia,  dessas costumeiramente usadas pelos especialistas da comunicação para chamar a atenção. Será?  Vá lá, mas bote  sub-reptícia nisso, pois nada consta que , exclusive o sexo, haja outra coisa que quando você quer mais tem de fazer mais. Ou não? Suponhamos, por exemplo, que eu, como todo mundo,  quisesse que os corruptos sumissem deste país. Isso quer dizer que eu deveria sumir também? Ou que deveria – já que o negócio é fazer – sair matando-os uma a um ?
            Definitivamente, nem sempre dá para entender tanta sabedoria moderna, refletida nos out-doors.  Eis algumas dessas pérolas filosóficas   colhidas ao longo das avenidas.
            “ Quem fica parado vira paisagem.”
Antigamente,  a sabedoria popular dizia  que quem ficava parado era poste. Portanto, se agora  o sujeito adquiriu o dom de transformar-se em paisagem, pelo simples fato de permanecer parado,  é sinal de que a coisa melhorou, e  muito. Vai ver que é essa a verdadeira intenção dos comunicadores:  induzir as pessoas a ficarem paradas na doce ilusão de que se transformarão numa bela paisagem. Já pensou que ganho de qualidade se ao invés de se mexerem tanto, virassem paisagens as bocas de Lula ou de Galvão Bueno?
            “ Namorar é fazer um pacto com a felicidade.”
Belo, belo! Fazer um pacto com a felicidade... Como soa bonito! Mas, como funcionaria isso? A única coisa que me vem a mente é que o potencial contratante teria de fazer  um acordo com a felicidade mais ou menos do tipo: “ Felicidade, se você não me aporrinhar muito com essa tua chatice de  aparecer fora de hora,  eu fico com  minha namorada ainda por muito tempo, caso contrário, eu...procuro outra, certo?”
            “ Morar bem é ficar a dois passo de tudo.”
Isso mesmo, “de tudo” entendeu bem? De tudo. Da vizinha cujo cachorro adora fazer cocô no seu pé, do flamenguista que no andar de cima faz um chororô em ritmo de pagode toda vez que seu time perde, do vigia  que dá em cima de sua mulher e, até mesmo...Da morte. Afinal de contas, quem quiser morrer é só se atirar da varanda  do apartamento que tiver comprado. Obviamente,   a apenas dois passos... “do paraíso”.
            “ O colégio que tem o seu DNA”
            Que diabos o meu DNA foi parar num colégio chamado Santa Teresa?( Se inda fosse  nos braços da santa, vá lá)
Certo, o meu DNA pode não valer tanta coisa assim , mas deu um trabalhão danado para um certo espermatozóide que teve de disputar corrida com outros 280 milhões de concorrentes , tudo isso para gerar um DNA capaz de modelar um sujeito com um mínimo de orgulho por poder reconhecer, mesmo tardiamente,  esforço tão insano quanto breve desse heróico primeiro amigo.  Sendo de verdade o que estão anunciando, pelo amor de Deus faça com que me devolvam o meu DNA, minha Santa Teresa!

sábado, 2 de julho de 2011

RUMOS DA PEDINTOLOGIA

Artigo publicado hoje, sábado no Jornal
O estado do Maranhão, seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo

José Ewerton Neto

                                                                                  ewerton.neto@hotmail.com




                        Por muito tempo ser pedinte nunca foi profissão e, muito menos, a Pedintologia uma ciência. Mas, nestes tempos de pós-modernidade, profissões de todo tipo estão surgindo a cada instante, as mais curiosas e indecifráveis. Semana passada, a revista Veja anunciou mais de vinte, entre as quais as de cirurgião robótico e gerente de doenças crônicas (?).  Nada de surpreender que, segundo os jornais, o poder público de São Luis haja instituído, oficialmente,  a profissão de pedinte.
                   Imediatamente, os estudiosos e pesquisadores iniciaram o embrião do que se constitui a PEDINTOLOGIA. As bases dessa nova ciência se baseiam em um principio fundamental chamado, princípio de João Encostado ( ex-guardador de carro e hoje guardador da chave de sua própria Hilux, comprada à vista).
                   “ No Brasil para alguém se dar bem ou bem precisa roubar ou bem pedir.”
                   Como esse postulado nunca foi contestado na comunidade científica, logo surgiu o corolário.
                   “Todo brasileiro honesto que, por princípio, não sabe pedir ou roubar é completamente inviável neste país.”
                   Para não nos estendermos mais numa ciência tão extensa quanto complexa, eis um breve resumo das páginas iniciais do documento histórico.

1.                 Tudo começou quando o “futuro profissional” apareceu pedindo dinheiro, como qualquer mendigo, com a diferença de que fingia estar guardando carros. (Aliás, pedir dinheiro é a única coisa que ele faz, até hoje). Os veículos não eram tantos, de forma que ninguém duvidava de que se tratava de mendicância pura. Lembre-se que, nessa época,  o “futuro profissional”  agradecia pelo que recebia , não exigia nem xingava, a altos brados, como hoje.  
                   Durante muito tempo, a relação do benfeitor para com o pedinte, era na base da incredulidade e desconfiança, por não conceber que um sujeito novo, e com saúde, não procurasse aprender um ofício digno, para ganhar seu dinheiro trabalhando de verdade. O certo é que, com o dinheiro fácil e o progressivo aumento do número de carros os  flanelinhas proliferaram mais do que botox em rosto de perua, ou de remédio para emagrecer em farmácia de rico.
Foi então que os políticos  resolveram entrar na história, sempre de olho nos milhares de votos dos pedintes, baseado no postulado de Zé da Vaga ( ex- guardador de carro e futuro  candidato a vereador ) :
“Mais vale um  voto na mão,  que dois ociosos trabalhando” postulado cujo complemento científico é concludente: “ Desde que seja outro quem pague.”

2.                 E foi assim que pedinte virou profissão e a iniciativa maranhense veio coroar uma combinação salutar para as duas partes.  Os governantes insinuam praticar um reparo social, os guardadores fingem que trabalham, e os contribuintes pagam a conta. O papel de bobo fica para o cidadão, tendo que aceitar um serviço, supostamente de segurança, que em qualquer outro lugar do mundo é exercido pela polícia - já que, para isso, o cidadão  paga tanto imposto.
                   O futuro da profissão já ultrapassou as expectativas de outras profissões mais desprezadas hoje em dia  como professores, pedreiros, marceneiros , encanadores etc já que as vantagens, para as partes envolvidas ( os “novos profissionais” e os administradores ) , são óbvias.  Eis algumas:
                   2.1. Vencimento. O pobre do  contribuinte é que  paga
2.2 Farda de trabalho. Não precisa, basta uma flanela suja.
2.3 Estudo. Aprende-se rapidamente. Uma das lições: “mulher paga mais caro, porque morre de medo”.
2.4 Escola. Não precisa bancos de escola, aprende-se nos bancos das praças.
2.5 Contrato de trabalho. De preferência, vocal: “Se você não me der mais de um realzinho, eu furo o pneu do teu carro!”. Com variações.

3.                 Quanto ao futuro da PEDINTOLOGIA ninguém tem dúvidas de que muitos estudos surgirão para abarcar toda a gama de implicações dessa nova realidade que surge. Como se sabe, neste país hoje todos pedem alguma coisa: corrupto pede voto e depois um habeas-corpus; prostituta pede para ir pro BBB e depois para trabalhar na Globo; gay pede para casar; perua pede um gigolô; periguete pede um velho rico  e criança pede para o pai não encher o saco.  As conseqüências são múltiplas, afinal de contas, o segundo princípio fundamental da Pedintologia tem base religiosa: “Pedir é melhor que roubar”. Cujo corolário, ainda do sábio Zé da Vaga acima citado, é profundo e definitivo.
                   “... Mas num país em que se rouba mais ainda do que se pede, todo pedido é quase roubo.”