sábado, 28 de janeiro de 2012

ABAIXO O REI MOMO SARADO


VIVA O REI MOMO GORDO!




Não começou tão bem assim o carnaval quatrocentão. Primeiro, uma letra estrambótica  no samba-enredo da escola de samba carioca que homenageará a cidade.  Em segundo lugar, suas irmãs daqui que, para não ficarem atrás, sequer fizeram menção, nas letras de seus sambas, aos notáveis da “Atenas Brasileira” (escritores que deveriam ser, para sempre, o nosso maior motivo de orgulho). Por fim, a eleição de um Rei Momo sarado para ser o “rei” desse carnaval.
            Pois é, um Rei Momo sarado! Ao invés de um Rei Momo parecido com o que deveria ser a cidade em sua festa maior, aparentando opulência, riqueza, fartura,  alegria,suor e banhas  um rei  de físico minguado e grotesco a se confundir facilmente com qualquer saradão  do BBBrasil.
            Desde quando se descobriu, por aqui, tanta vocação por novidades bobas e tanta implicância com os gordos? Por que essa discriminação instalando-se em uma brincadeira onde deveria haver lugar para todos e onde seria razoável que houvesse sempre oportunidade para que os obesos pudessem reinar como nunca em outra ocasião? (Segundo soube os tradicionais pleiteantes a Rei Momo desistiram de concorrer em desagravo à última edição em que foram submetidos ao vexame de terem sido desprezados). Enfim, mais uma vez o carnaval da ilha se rende ao que de pior foi inventado em Salvador, do axé às patacoadas de Ivete Sangalo.
            Se ainda faltarem razões, eis algumas pelas quais me solidarizo definitivamente com os Gordos ( Momos ou não).

1.                 Em defesa de minorias. Alguém já viu um Rei Momo fora do carnaval? Onde será que moram, comem,  se divertem? Se  sobrevivem fora do período carnavalesco, ninguém sabe, ninguém vê.   Tudo indica que existe uma minoria de seres humanos que nasceram para serem Reis Momos e apenas isso. O resto do tempo ficam hibernando e, no carnaval,  aproveitam a única chance que têm para se consagrarem, nem que seja para que possam dizer ao mundo: existimos, e fazemos parte da mais notável das minorias: a minoria grande.

2Pela felicidade. Gordo é sinal de alegria. Não existe  gordo triste, porque se gordo  ficar triste, morre . Gordo é alegre por obrigação e aprende isso todo dia. Além disso, convenhamos, a verdadeira alegria precisa ser gorda, pois de alegria magra já tem gente penando o ano inteiro, seja atrás de banda de forró, seja torcendo à beira de um ataque de nervos pelo seu time de futebol, seja pulando em carreata de político, num processo de penúria que não tem bolsa-família que resolva.

3. Pelo símbolo e fantasia. Existe todo um simbolismo por trás da figura do Rei Momo gordo,  jamais encontrável num rei momo magro ou, pior ainda, sarado. A própria palavra, Momo, em si já é gorda. Momesco mais ainda. É por causa disso que, durante o carnaval, é tão explícita a idéia de volume que os homens se fantasiam de fofão enquanto as mulheres deixam para inchar (a barriga) logo depois do carnaval.
            Isso torna claro que, se houvesse mesmo o tal espírito carnavalesco e entendendo-se como tal a oportunidade de felicidade igual para todos, os mentores do carnaval sanluizense deveriam, de imediato,  compensar de alguma forma o que fizeram com os Reis Momos gordos. Fica lançada, então, a idéia:
                        QUE SE SUBSTITUAM AS RAINHAS DAS BATERIAS, TÃO SARADAS, PELAS GORDINHAS.
                        Nunca é  tarde para se fazer justiça e estamos conversados!                                                                                        ewerton.neto@hotmail.com                       

sábado, 21 de janeiro de 2012

ZÉ MANÉS TAMBÉM ESTUPRAM

artigo publicado na seção Hoje é dia de...
jornal O estado do Maranhão, hoje, sábado








1. Inicio esta crônica com uma frase de Pedro Bial, o apresentador da Globo que desistiu  de ser um razoável repórter para ser o bobo-da-corte do programa mais execrável da tevê brasileira: o BBBrasil .Ele mesmo confirmou isso quando disse: “ Eu não assisto porque não gosto de me ver. Mas para domar o formato tive de me despir da condição de jornalista para ser um Zé Mane, junto com os outros.” Ora, se Pedro Bial teve que se tornar um Zé Mané para participar do programa , os Zé Manés que assistem a tal programa passaram a ser o quê?”
                                   Que bom se fosse apenas estúpidos, idiotas, imbecis ou tudo que vem logo abaixo de Zé Mané ( com o perdão do genial Mané Garrincha que não merecia ter seu nome de craque enlameado por alcunha tão depreciativa). O buraco é mais embaixo, pois semana passada um Zé Mané do programa estuprou outra Zé  Mané, em plena seqüência do show, segundo consta após uma balada patrocinada pela Casa. Pensando bem, o termo Zé Mané chega a ser até inofensivo diante da realidade dos fatos, eis que, no caso, esconde impulsos sexuais animalescos incapazes de serem reprimidos racionalmente -  e que são tratados pela emissora de tevê e pelos que os  assistem como se fosse um espetáculo tão lúdico quanto uma festinha de aniversário de crianças. Portanto, ao invés de serem simplesmente Zé Manés, os participantes do programa  e os que se deliciam com isso , não passam de potenciais  estupradores.
                                   Sim, porque tão estuprador quanto o executante é aquele que sente prazer  com isso. Estupro, a rigor,  não se refere apenas ao coito arrancado sem o consentimento da vítima como também à corrupção do conceito da dignidade humana, do nível cultural e da ética nas relações com o público. Como já disse alguém “ Nada existe de mais sórdido na aventura do ser humano sobre a Terra  que o espetáculo ao vivo da degradação de sua individualidade (o que alguém pode possuir de mais puro ) em troca de um punhado de dinheiro.”    
                                   Ao fim, de quem é a culpa pela exibição de estupradores exibicionistas ao vivo? Mais gente do que se pensa - inclusive aqueles em quem votamos e que nos representam -, mas a direção da tevê pode sempre alegar que está entregando um programa ao nível dos idiotas que o assistem.  Pois o que pode pretender de melhor um Zé Mané do que ter a pureza de suas crianças  estupradas diante de uma câmera de tevê?  

                                   2. A respeito da cônica de sábado passado  “AS CINCO MARAVILHAS DE SÃO LUIS” (que não estão fora do contexto da crônica de hoje  já que algumas dessas maravilhas citadas também foram “estupradas”) reproduzo, por oportuno, a seguir,  a mensagem  que me foi enviada por uma das personalidades mais gloriosas da cultura maranhense contemporânea, o poeta Nauro Machado, não por coincidência, o nome de um dos logradouros “maravilhosos” desta cidade quatrocentona.  





Caro escritor Ewerton



                   Parabéns pela sua crônica de hoje [sábado passado], a não desmerecer daquelas do nosso grande poeta José Chagas, a quem você substitui no jornal. Faltou apenas, para o meu gosto, falar um pouco mais da maravilha -  escolhida entre as seis da nossa capital - que é hoje a praça do nosso poeta imortal, que usou de uma celebrada licença poética para cantar os sabiás  que, como sabemos, não cantam nas palmeiras. Essa praça. e você deve saber disso, já que é também um andarilho contumaz da nossa velha cidade, está dominada hoje pelos depedradores do seu patrimônio há não muito recuperado e sem que as autoridades não tomem nenhuma providência para coibir esse hediondo crime contra os nossos foros de capital cultural. Será mesmo? Eles arrebentam tudo com os seus patinetes ( é esse o nome?), afrontando ou mesmo insultando, quando lhes fiz ver que aquilo não era o local para esse "divertimento” entre aspas, o velho poeta que lá estava passeando com as duas netas antes de ir à missa das seis na Igreja dos Remédios.
                   E quanto às outras "maravilhas", algumas delas abandonadas totalmente pelo poder público? Você deve lembrar-se do que quiseram fazer com o Convento das Mercês, não? Eu o conheci em ruínas, quando lá passava pelas madrugadas em companhia do poeta José Maria. Hoje é um dos mais belos e válidos patrimônios do nosso patrimônio, e que, há não muito, pretenderam destruir por obra e graça daquela  inveja que parece ser  o traço maior de parte dos nossos políticos, entregues  à incúria e ao descaso dos que  deveriam amá-la, mostrando esse amor em obras e fatos. O Cine Praia Grande resiste galhardamente, apresentando o que de melhor  é realizado no cinema mundial. Espero que não muito breve, algum amigo meu, embora por mim desconhecido, arranque o meu depedrado busto da praça que injustamente leva o meu nome, atirando-o despedaçado do alto da amurada da Beira-Mar. Um abraço com respeito e admiração do seu
 
Nauro Machado

                                                                  ewerton.neto@hotmail.com

sábado, 14 de janeiro de 2012

AS CINCO MARAVILHAS DE SÃO LUIS












Mas, não eram sete? Sei disso, caro leitor e sou capaz de enumerá-las a partir de uma votação que contou com a participação de seis mil pessoas em todo o Brasil: a Rua Portugal, o Convento das Mercês, a Igreja da Sé, o teatro Artur Azevedo, o Palácio dos Leões, a Praça Gonçalves Dias e a Azulejaria.
                        Acontece que existe mais, muito mais:

‘                      1. O Espigão-Matador. Quem já visitou sabe que o espetáculo é paradisíaco, quando começa o pôr-do-sol. Recomendam-se, no entanto, alguns cuidados para que se possa usufruir de tanta beleza. Em primeiro lugar que se levante bem o pescoço, porque a Ponta dÀreia , que já foi uma praia, é tão cercada de prédios por todos os lados que nem sempre se distingue o sol. Em segundo lugar que, após espiar o crepúsculo, deve-se, por precaução, sair correndo. Não do pôr-do-sol, claro, que não está nem aí para admiradores, mas do próprio espigão que costuma se irritar  com a quantidade de gente que transita por cima dele, tanto é assim que já matou dois.
                        Com métodos imprevisíveis de ataque que tanto pode ser uma pedra gigante rolando pela ribanceira, como um escorregão no fundo do mar, lembremos que, propositadamente, as autoridades não pensam em colocar proteção alguma o que  torna o espigão-matador, para sempre, um dos mais emocionantes espetáculos da cidade.

2. O Mercado Central. No passado já foi chamado de Mercado Grande mas, na verdade, não chega a tanto, eis que as frutas e verduras, por falta de espaço, se espalham pelas calçadas, cisternas e - com notável freqüência -, nos sapatos e bolsos de quem por lá circula. Compondo uma magnífica manifestação de diversidade   racial socializada já que o açaí escuro reside com o arroz branco no mesmo depósito de legumes, o Mercado Central de São Luis é o testemunho universal de que a limpeza pública não é essencial para a convivência pacífica entre ratos, tomates e beringelas. Razão porque goza da preferência  e admiração dos turistas que por lá passeiam – e sempre voltam - encantados com a proliferação dos produtos típicos da região, entre eles, periguetes, gigolôs, guardadores de carros e,  se você der sopa, de seu dinheiro. Encante-se!


3. O Enterro do Bacanga. Obra-prima do planejamento e da engenharia maranhense, o Enterro (Aterro?) do Bacanga com seu interminável avanço de terra e barro pelo mar adentro, deve ter sido concebido como uma obra de arte capaz de dar inveja às pirâmides do Egito, no deserto.  Onde havia barcos, fez-se barro, onde havia barcos, fez-se o Forró do Arlindo. Ao invés da previsão nordestina que dizia  “O sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão”por aqui deu-se que o mar virou deserto e o deserto virou sertão, se lembrarmos das noites musicais enluaradas que se prolongam pelas madrugadas, sob o som eclético de reggae, forró e brega, ou de todos ao mesmo tempo. Enfim, um  espetáculo de harmonia perfeita entre paisagem e som de altíssima qualidade.jamais visto em qualquer outro lugar do mundo . Vez por outra, alguém morre, gemendo sob a ação de uma peixeira. É um fundo musical perfeito! 

4.  O Edifício Bem-Mal. Imponente, majestoso, o edifício do antigo Banco do Estado do Maranhão, também chamado edifício BEM, já não está tão bem assim. Mas continua destacando-se aos olhos dos turistas pelo seu simbolismo já que o principal “charme” arquitetônico desse edifício é a eterna indecisão que se transmite às suas vigas de concreto, comovendo quem o observa. De que se trata? Para onde vai? O que vão fazer com ele? Está querendo subir ou descer? Se alargar ou sumir?
Conscientes de que justamente essa é  a sua principal atração as autoridades pretendem, pelo visto, deixa-lo eternamente assim, fazendo do prédio uma espécie de Torre de Pisa.  Provavelmente, pretendem que no próximo aniversário secular da cidade, ele lá esteja, do mesmo jeito, soberbamente indeciso, mostrando para o resto do mundo como se cria e se conserva um monumento  turístico.

5. A Praia da Pontinha de Areia. São Luis  já possuía a Praia Grande, a primeira praia do mundo que não é praia. Hoje, por obra e graça da especulação imobiliária desenfreada sob a complacência  das autoridades, criou-se uma atração turística singularíssima: a quase praia. Melhor dizendo, a Pontinha de Areia, aquela que já foi uma praia e hoje se resume a um pequeno amontoado de grãos de areia, cercado de prédios horrorosos por todos os lados, inclusive na própria região de praia. 
Como o povo desta cidade é masoquista e deve ter assistido com prazer ao assassinato da sua ex-praia preferida, resta aos turistas (sempre tão privilegiados e decantados pelos órgãos  oficiais ) ficarem encantados com esse privilégio  inusitado e singular: terem uma praizinha particular no quintal de seus apartamentos de férias, onde podem depositar também, tranquilamente, o escoamento de seus dejetos. 
                                                                                  ewerton.neto@hotmail.com

sábado, 7 de janeiro de 2012

REPÚBLICA DOS BONDES - E DOS BECOS

artigo publicado hoje no jornal O estado do Maranhão,
seção Hoje é dia de...



 1. Mude seu passado e seja mais feliz, diz a reportagem de capa da revista Super Interessante deste mês. Dito assim parece fácil, não é? Já que não passamos de memórias ambulantes (o presente não dura mais que três   segundos que é o tempo que se leva para que todas as informações saiam da consciência e sejam arquivadas na memória do cérebro), bastaria “limpar” o cérebro das memórias incômodas para que passássemos a ser felizes. Ou seja, como a atriz sueca já havia dito:  “Felicidade é saúde e péssima memória”.
                        A grande dificuldade começa, no entanto, em não se saber exatamente o que excluir da memória. Sim, porque existem tristezas e incômodos  que nos engrandecem e sem as quais a nossa vida perderia o sentido. Complexo, não é? Basta lembrar que quando dizemos para todo mundo ouvir, com transbordante prazer, diante de algumas fotos do passado, “como eu era feliz esse tempo!”, isso não significa que estávamos, de fato, tão felizes essa época. Muitas das vezes o sorriso da foto, na verdade, escondia um recôndito de desgosto ou melancolia.
                         Neste 400º aniversário de São Luis de algo tenho certeza, relativamente às tantas coisas que vale a pena evocar da metade de século em que passamos juntos: a primeira são seus bondes e outra, seus becos. Mais precisamente, duas repúblicas: a dos becos e a dos bondes. Sim, porque como cantou Marina – na bela balada de rock nacional  “Fullgas” – tratando do que é possível fazer a partir de um sentimento: “E a gente faz um país”. Ora, se a partir de  um sentimento fazem-se países, melhor  ainda se podem fazer repúblicas.  

                        2. Dias atrás recebi pela Internet uma preciosa coletânea de fotos dos bondes que trilharam as ruas de São  Luis. Em cada foto, excepcionalmente nítida, pude rever-me em cada um deles. Lá estava eu junto àquelas pessoas, passageiros que nunca conheci, tantos já mortos, mas que eu não percebia como estranhos, mas como pessoas que faziam parte de um mundo íntimo, reconhecível para sempre. Cada vez que eu passava de uma foto para outra, contemplando aqueles bondes indo e voltando pela Rua do Sol, Rua Grande, Praça Gonçalves Dias etc. a criança que eu fui se dirigia a um dos estribos do bonde ( e tratava de “driblar” o cobrador como era comum entre os meninos  para garantir a grana do refrigerante). O menino então, a cada foto, tomava um daqueles bondes e partia... Para onde?
                        Agora sei que a criança pegava aquele bonde para chegar até aqui - esse algum lugar na república dos sentimentos, no futuro, através dos trilhos da memória que não sucumbirão jamais à essa estranha névoa do espaço onde o tempo não existe.  
                       

                        3. A segunda dessas lembranças, é a  república dos becos. Não somente os becos das esquinas dessa São Luis que, oprimidos pela modernização da cidade, juntavam-se,  aos bondes para fazer soar  um último grito de agonia, não contra o progresso, mas contra a potencial perda de nossos valores culturais. Era certamente isso, mas, também, principalmente, esses becos da alma de todo sanluizense de então, especialmente da juventude, estupefatos diante do ignoto: seus apelos luzidios, no embalo da juventude perdida, seus anseios diante da perspectiva da fragmentação dos ideais estratificados há tanto tempo.
                        Essa república dos becos, agônica, requeria um tradutor e, por sorte,  o encontrou no jovem poeta  Luis Augusto Cassas, que, num instante de ousadia e talento descreveu toda essa palpitação em versos como estes:
                        “É via preferencial, construída com cuidado para bloquear o pecado ( risco de contaminar o céu). Por isso caros amigos, em todo o percurso da estrada, anjos arcanjos, serafins e querubins montam guarda.”
                        Hoje passados trinta anos , a República dos Becos – e dos bondes – já não carece de um anjo da guarda que a traduza e a proteja do olvido, pois encontrou-o  em Cassas. Para nós outros, leitores ou não, quando, súbito, nos deparamos com a eternidade seja no livro República dos Becos ou nas fotos do melhor do que se passou em nossas vidas,  constatamos que, de fato,  como anunciou a reportagem de capa da revista, isso se chama felicidade.
                                                                                  ewerton.neto@hotmail.com