artigo publicado hoje na seção Hoje é dia de...Caderno Alternativo,
jornal O estado do Maranhão, hoje, sábado
Quando
se pensava que não podia haver coisa pior para se ouvir do que música sertaneja
eis que apareceu sua evolução: o Sertanejo Universitário. Quando se pensou que se chegara ao limite da catástrofe,
não é que inventaram o Arrocha?
Esta
semana, circulava em uma de nossas avenidas principais, quando deparei com a
Lei de Murphy (só podia ser ela) à minha frente, num bizarro Back Door. O
cartaz na traseira do ônibus anunciava: O rei do Arrochanejo se apresenta em
São Luis. Um amigo, a meu lado,
perguntou: ARROCHANEJO, que diabo será isso? Eu lhe respondi, depois de trinta
segundos de profunda reflexão “Não se preocupe: deve ser a Lei de Murphy ( aquela do porque tudo dá errado) aplicada
à atual música brasileira. Anuncia-se assim : Por pior que seja um ritmo
musical logo estarão descobrindo outro
pior”.
Ou
seja, em matéria de criatividade negativa por aqui a turma se esmera e um dos recursos mais utilizados é,
justamente, este: se não há como piorar
duas coisas, por si já bastante ruinzinhas,
basta misturar as duas: o caldo que sair é para dar, vender, comprar e se extasiar. Um exemplo sintomático
dessa ‘inventividade’ acontece com os partidos políticos. São tantos e com
tantas siglas, que às vezes dá pena do alfabeto, já que as letras nunca parecem em número
suficiente para representá-los em suas
totais inexpressividades. Mesmo assim, ainda conseguem fazer alianças entre si.
Dá para acreditar? É como se o nada se
juntasse ao nada para gerar o abaixo de zero - se a matemática permitisse.
Esse “misto quente tropical” que, por incrível que pareça, quanto mais
intragável é, mais gente surge para apreciá-lo, não acontece apenas com os gêneros musicais. Infelizmente, existe por aí
um batalhão de misturas, igualmente férteis:
A
primeira delas, esta no campo futebolístico, é a FILIPEIRA. Mistura de Felipão
com Parreira foi o mix ideal, engendrado pela CBF, para espremer patriotismos de araque em tempos
de Copa. Unem-se a arrogância siderúrgica
de Felipão com a boca murcha de Parreira para dar a impressão, finalmente, de que em matéria de futebol o céu está, de novo, ao nosso
alcance. Claro que para o sucesso do sabor da mistura, seus criadores contam com a pitadinha milagrosa de um craque
excepcional , e Neymar está aí para isso. Assim foi, com Parreira, quando Romário o
salvou do fiasco nos USA. E com Felipão, idem, quando o boquirroto gaúcho teve
de se socorrer do talento nordestino do execrado – pela crônica sulista –
Rivaldo. O mesmo nordestino que ele humilhou e não quis receber no Palmeiras,
tempos depois. O mesmo Palmeiras que ele treinava e que abandonou como um rato
fujão, tão logo pressentiu o cheiro de rebaixamento. Haja pois
talento dos craques e Deus brasileiro
para que o sabor intragável da Filipeira não nos impeça de ecoar o grito
‘Galvanizado’ entalado na nossa garganta: Brasiiillllllllllllllll!!!!!
Outra
oportunista mistura – pelo menos para um dos lados – poderia se chamar
MARINACAMPOS. Atenção, nada de confundir com Marina dos Campos A
combinação a que estamos nos referindo é de Marina Silva, egressa dos grotões e heroína dos humildes com Eduardo Campos,
ex-governador de Pernambuco. É a mistura dos olhos verdes do nascido em berço
de ouro com os olhos negros da mulher mestiça, da ex- empregada doméstica, que estudou por conta própria, com o filho de
pai milionário que sempre teve o de bom e de melhor, da revolucionária com o
burguês, da mulher de voz esganiçada com
a voz tonitruante do outro, do corpo franzino
com a opulenta barriga. Dizem que os opostos devem se atrair para que haja um bom casamento, mas dizem que
também que a corda só rebenta do lado mais fraco. Alguém duvida qual seja?
Vale
a pena ainda lembrar a recente união de ROBERTO-CHICO-GIL-CAETANO-MILTON-ERASMO-e
DJAVAN. Nesta, ao contrário das parcelas originais de baixa qualidade citadas
acima, temos até uma boa matéria-prima. Chico, Caetano Gil e Milton Nascimento são o que de melhor a
MPB produziu na segunda metade do século
passado. Mesmo assim, como todos sabem, a coisa começou a desandar quando se misturou
as partes, e o grupo resolveu ter voz uníssona a favor da censura. Um, que
bradava contra a intolerância virou proibidor, o que fazia canções românticas,
virou inquisidor, o revolucionário virou ditador, o delicado virou grosseiro e
o carinhoso virou louco furioso. Hão de dizer que o problema, mais que atávico é
da natureza humana: não há rebeldia sem
causa, da juventude, que resista às rebeldias contra as idéias libertárias, da
velhice.
Sei
não, mas acho que nesse caso o culpa vem mesmo desse talento nacional para a fusão, com
fim catastrófico. Melhor não misturar.