artigo publicado no jornal O estado do Maranhão
A respeito do
Baleia Azul, um trágico jogo da Internet
que induz adolescentes ao suicídio, lembro de que em recente palestra sobre
literatura com estudantes do Ensino Fundamental (como parte de bem-sucedido projeto
promovido pela AML) uma jovem quis saber de onde me veio a ideia original do
livro O oficio de matar suicidas.
Respondi que a ideia surgiu desses momentos em que você se sente do lado
sombrio dessa bipolaridade tão própria da juventude, que fazem passar da euforia para a angústia em
poucos segundos e que, quando se permanece desse lado por algum tempo mais que
esses poucos segundos, é fatal que você chegue até a : “E então, será que se
matar, não seria a solução?”
No
meu caso, o momento soturno passou depressa, como passam as sensaborias da vida
postas em seus devidos lugares, mas a ideia permaneceu até gerar a concepção da trama de O oficio de matar suicidas trazendo em
seu bojo a epopeia de um matador de suicidas errôneo e atrapalhado em si mesmo;
no desmantelo de sua personalidade já denunciando o equívoco da elucubração dos
momentos tensos e denunciando, como apontou
José Louzeiro, mais que um sofrimento pessoal, a degradação a que somos submetidos quando, ao buscar
soluções, nos defrontamos com seres humanos execráveis e espetáculos de
bizarria que nos são impostos pela farsa cotidiana que sobressai na mídia.
Daí
que, no livro, a tragédia daquele que se oferece para ajudar suicidas indecisos
se torna cômica, amenizando a morbidez do tema, como publicou no passado
Ferreira Junior e, recentemente, o blog português de literatura Deus Me Livro “Embora o contexto
seja depressivo e obscuro, o autor tem o mérito de transformar este romance
policial numa narrativa mergulhada num humor negro, que permanece até à última
página”.
O certo é que a realidade imitou a ficção e vários episódios
de suicídio contratado real se sucederam, extirpando, porém, o que na ficção era irônico e risível e
mostrando que os matadores de suicidas atuais já não esperam por um chamado mas se impõem,
conclamam e obsidiam os suicidas em
potencial.
A Baleia Azul ou que nome se dê a isso, não passa de um
matador de suicidas às escâncaras, escolhendo propositadamente os jovens porque
sabe onde grassam as maiores vítimas
desse “êxtase com a desesperança” por
ser a juventude “Uma travessia em que se vai tantas vezes da morte à vida em
poucos segundos que se tem a ilusão de que se atinge o dom da eternidade, por se
ter ido e voltado tantas vezes quantas se quis”. E, sendo um tipo de matador que se aproveita dessa
ilusão efêmera alheia, deixa de ser um matador de suicidas, para ser um assassino cruel - e bote crueldade nisso. O
que motivou uma pergunta ainda não respondida e que me foi exposta na indagação
simplista de um amigo:
Se o assassino está à solta, porque não se mata o
assassino? Porque se os jovens estão sendo covardemente induzidos a isso, não
se trata de suicídio, mas sim de assassinato.
Traduzindo em miúdos, isso significaria também perguntar:
“Ué, se o malfeitor é um programa (site, sei lá) que já prejudicou tanta gente inocente, porque ainda não foi excluído da net ou das
redes sociais?”
O que, perdurando sua expressão incrédula, continua a deixar estupefatos tanto ele, como eu, como
também a você, que não entendemos de leis, de juízes, de policiais ou de Internet.
José Ewerton Neto é autor de O oficio de matar suicidas
https://www.youtube.com/watch?v=ZNlO01ob9is