artigo publicado no jornal O estado do Maranhão, quinta-feira
Tudo indica
que o Não sei começou milionésimos de segundos após Deus ter criado o Universo.
Inquirido por si mesmo (Deus é pai e filho ao mesmo tempo) sobre qual a razão de
ter feito isso ele, sentindo-se culpado e já com remorso, respondeu: “Não sei”.
E foi assim que o “Não sei” começou
sua grande trajetória. Toda a matéria em expansão a partir do big-bang (átomos
se chocando entre si sem saber por que) reproduzia, em pensamento, claro, as primeiras palavras
sentenciadas pelo Todo Poderoso. Os átomos em revolução, nem precisavam falar para deixar a entender que estavam movidos de
agora em diante pela Lei do Não sei. Por que vocês estão se expandindo? “Não
sei”. Onde e quando isso vai parar? “Não sei”.
E assim o Não sei passou a conduzir
todas as ações do Universo através do tempo. A dúvida, não a certeza, comandava
as realizações, se é que podemos chamar assim. Quando 12 bilhões e muitos milhões de anos depois, os ancestrais dos homens começaram a
se formar (parecidos a chimpanzés, num planeta minúsculo de uma galáxia
desprezível) algo, ou alguém, quis saber
de Deus porque ele havia cometido o desperdício de deixar nascer esses seres
insignificantes, dando-lhes a capacidade
de pensar. Deus teria respondido: “Para ter alguém que pense e fale Não sei, como eu naquele dia. Por
vingança, talvez” Enfim, Deus precisava
de alguém para dividir sua culpa original.
E assim de Não sei em Não sei, os homens e o Universo chegaram até hoje. Cerca de 2500 anos atrás, Confúcio,
um humano que pensava um pouquinho mais que
os outros, resumiu em poucas palavras a arquitetura desse dilema divino, que se
tornou humano : “Quanto mais sei , mais sei que nada sei.”
Dizem que Deus teria ficado muito satisfeito
com o resumo de Confúcio.
2. Ninguém poderia imaginar, porém,
que, algum tempo depois, neste século de
2000 d.c. o Não sei viesse a se alastrar
como epidemia num país chamado Brasil, o país do lava-jato, a ponto de ser a
expressão mais repetida pelas autoridades que o dirigem. É Não Sei pra cá, Não sei pra lá,
a cada pergunta da Justiça, parecendo que os políticos, só sabem conjugar o verbo saber da seguinte maneira: Eu
não sei, tu sabes , ele sabe, nós sabemos, vós sabeis eles sabem. Ou seja, todo
mundo sabe que eles sabem, só eles não. Ora, que impacto tem isso para a
teoria?
Tudo indica que o Não sei da dúvida, que se iniciou divina e universal aos poucos
se tornou existencial e humana, evoluiu,
e se transformou no Não Sei do cinismo e da desfaçatez . Só assim
se explica que alguém que receba um
meliante em sua casa (ou palácio) dez horas da noite, ou então se aposse de uma
mala de dinheiro, ou então se apodere de um sítio, com gravações, vídeos, e testemunhas comprovando
o crime, tenha o desplante de dizer, com
a maior cara de pau, que não sabe e não
viu o que aconteceu.
Pobre Confúcio, pobre Deus! Os brasileiros, sem conseguir corromper a
realidade, corromperam o Não sei original a ponto de transformarem a sábia frase
de Confúcio “Quanto mais sei, mais sei que nada sei” em: “ Quanto mais eu sei que
sei, mais minto que nada sei ”
Deus não deve estar nada satisfeito.
José Ewerton Neto é autor de O oficio de matar suicidas
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