sexta-feira, 10 de agosto de 2018

TODA BELEZA É TRISTE





artigo publicado no jornal O estado do Maranhão



Ao longo de minha vida adquiri muitos livros que hoje compõem o que se poderia chamar de uma modesta biblioteca,  senão no tamanho pelo menos na qualidade.
Esse indescritível deleite se reveste de um dom especial  quando, vez por outra, entre os inúmeros livros que guardei , me deparo com a satisfação propiciada pela descoberta de um grande autor, até então desconhecido para mim , resgatado num sebo qualquer ou em alguma livraria desconhecida e pobre.
            A arquitetura dessa magia se instala mais ou menos assim: um autor incógnito que oferece o seu texto a preço de banana me acenando das páginas do livro, insinuando justificar as inúmeras horas que passo à procura. Aqui a fascinação é a da garimpagem em busca do tesouro escondido. Os tantos livros que vim a adquirir, portanto,  ficam por conta dessa virtual atração: “Como posso deixar de levar uma fortuna oferecida a  um preço tão baixo? Isso é um crime que não posso cometer comigo mesmo!” E, assim, se amontoaram livros e mais livros a ponto de não haver lido nem metade do que gostaria.
            Essa  impossibilidade faz com que, vez por outra, eu tente privilegiar alguns, colocando-os  na categoria dos próximos a ler, relevando os demais a uma leitura fortuita sabe-se lá quando. Eis que, mais por acaso do que por pertencer a alguma lista de preferência,  deparei  semana passada  com o Livro Beleza e Tristeza de Yasunari Kawabata. Ao averiguá-lo, foi como a reedição de um novo achado, pois não tive a menor lembrança de onde e quando o adquiri.









 Reli então a orelha e descobri a possível razão de tê-lo trazido. Primeiro, o título, de uma singeleza arrebatadora porque traduz uma verdade pouco lembrada: a de que é difícil haver beleza plena sem um toque de tristeza, ainda que mínima, ou vice-versa. Mas, além disso, a fascinação pela capa com uma gravura japonesa e a alegoria de um perscrutador mistério.  
            Yasunari Kawabata, seu autor, ganhou o prêmio Nobel em 1968 e suicidou-se em 1972. 









A história por ele  narrada, comum, torna-se fascinante pela sua forma de condução da narrativa,  sublimando as paixões intensas que descambam para um desenrolar trágico previsível , ao sobrepor um tom de contemplação estética que suaviza o quadro de opressiva tristeza , pela introdução, inclusive nos diálogos, do êxtase em face da beleza  física ou artística, no caso,  mais desejada que verdadeira . 
            Uma obra-prima, de leitura gratificante e, portanto  imperdível , mas que , por isso mesmo,  veio me rechear das duas  sensações sugeridas pelo título do livro:   de Beleza, pelas obras-primas de autores para mim desconhecidos e que guardo em minhas estantes; e de Tristeza por saber que, por mais que me dedique ao exercício de uma leitura intensa  jamais conseguirei ler a todas.

José Ewerton Neto é autor de O ofício de matar suicidas




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