sábado, 29 de dezembro de 2012

FELICIDADES DE FIM-DE-ANO



artigo publicado na seção Hoje é dia de...Caderno Alternativo,
jornal O estado do Maranhão, hoje, sábado



“A felicidade pode ser comprada. 93% dos brasileiros afirmaram para uma pesquisa de consultoria da Skandia  International, Revista Isto É, desta semana,  que com um salário de 23 mil teriam a felicidade”.


                Encontraram-se no réveillon do Copacabana Palace, no Rio. A princípio, Solinei não quis acreditar.
                - Você por aqui?
                É que Solinei, empresário bem-sucedido na ilha, não podia esperar que Vicente tivesse grana para estar ali, como ele, torrando-a num dia de Reveillon.  Foram colegas de escola no segundo grau de um colégio pobre. Na última vez em que o vira, coisa de cinco anos atrás Vicente lhe causou até constrangimento quando veio cumprimentá-lo: sabia-o um  funcionário público modesto, dirigindo um Fiesta  velho, comprado sabe-se lá como.
                - Sou eu mesmo, Solinei. Estou aqui com minha família.
                Solinei procurou em vão. Vicente apontou para um grupo adiante.
                - Estão lá. – Solinei engoliu em seco.  Eram mais de quinze pessoas.
                Conversaram. Solinei , a princípio, quis  se livrar da incômoda companhia de Vicente, mas morria de curiosidade em saber de onde Vicente tirara tanta grana. Na verdade, Solinei começou a  sentir-se frustrado.  (Uma de suas alegrias  era mandar publicar nas colunas sociais dos jornais  da província que podia pagar o réveillon do Copacabana Palace).  É como se a presença  de Vicente por ali desmentisse esse poder. Conversaram, trocaram idéias, as confidências iam e vinham embaladas pelo uísque que corria à solta. Lembraram dos velhos tempos de escola, mas  Solinei perdera a espontaneidade e, sem uma razão definida, não conseguia se alegrar.  Havia algo de doentio na presença de Vicente, mas  Solinei não conseguia abandoná-lo. Como se estivesse contaminado.

                                                              

                - Mas, você está feliz? – perguntou, de repente,  Solinei.
                Vicente hesitou
                - Bem...Tenho que estar não é? Eu paguei para isso.
                Solinei interpretou aquilo como uma indireta. Ficou triste. Lá fora os fogos de artifício começaram a ribombar no céu. Era fogo para todo lado, um espetáculo tão bonito quanto inútil, mas a droga, agora, é que Solinei , não conseguia se livrar da incômoda pergunta a si mesmo sobre  o que estava fazendo ali. “Merda, para que serve, ao final,  tanta palhaçada, tanto fogo de artifício por causa da passagem de uma  noite que, ao final de contas, é uma noite qualquer?” “ E por que eu tenho de estar eternamente  ao lado do mesmo bando de panacas: Peruas encarquilhadas e bestalhões buxudos e arrogantes?”. Solinei começou a se sentir mal.
                - Está mesmo gostando disso?
                - Bem..Vicente hesitou – Preciso estar não é? Eu paguei para isso.
                Solinei  percebeu  que aquela resposta já havia sido dada. De repente, tudo se tornara muito vago, estranho, vazio.  Queria  se livrar da presença definitivamente incômoda de Vicente que lhe fazia  sentir-se tão mal.  Procurou pela jovem esposa, ao longe, mas ela parecia indiferente , junto a um grupo carioca que ele não conhecia. Estranho!

                                                                   
                - Vicente, passei  a vir de São Luis para cá  desde que comecei a ter grana sobrando. Como você sabe ganho bem mais de vinte e três mil por mês – falou com orgulho,  fitando Vicente de cima para baixo.  No começo dessas festas achava tudo uma grande tolice, um bando de panacas enfeitados, mas acabei me acostumando. A gente se acostuma, não é?
                Vicente  teve um pressentimento.
                - Toma mais um gole, Solinei. Brindemos à felicidade!
                - A felicidade? Que felicidade, Vicente?
                - Aquela que se pode  comprar, Solinei.
                Solinei  julgou ter entendido :  “ Aquela que eu finjo que compro  todo fim de ano e , agora, ele também”.Levantou de um salto. Vicente se interpôs entre ele e sua intenção. Não foi suficiente: Solinei era mais forte e o empurrou. Vicente chamou os seguranças.  Vicente é que parecia agora nervoso, fora de si.
                - Segurem-no, não o deixem ficar só.
                Os seguranças demoravam a chegar, os  vizinhos acudiram e seguraram Solinei tentando demovê-lo de algo que não sabiam o que era. Vicente  explicou:
                - Ele pode fazer a besteira que quiser, pode até se matar, mas não hoje. Se hoje não conseguiu felicidade  tem dinheiro para comprá-la de novo amanhã, depois  ou o dia que quiser. A minha não, só vale para hoje, custou-me muito  caro e ai de quem me impedir de gozá-la até o fim.  
                                                                                              ewerton.neto@hotmail.com
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sábado, 22 de dezembro de 2012

INSETOS SABOROSOS




“Gosto de grilos, mas recomendo as larvas da mariposa, que são as minhas favoritas. Para insetos mais selvagens prefiro  saborear cupins formigas e gafanhotos”. David Gordon, biólogo

                Recente reportagem da revista Superinteressante oferece sete razões para comer insetos. Entre elas estão energia, economia, limpeza ( o nojo que você sente é relativo) etc.O cientista acima citado, escreveu, inclusive um livro com suas receitas de insetos mais apreciadas, que está fazendo muito sucesso em restaurantes chiques. 
                Se muita gente torce o nariz para tal preferência,  nada como conhecer alguns deles (e outros artrópodes) quando mais não seja para acrescentar mais uma oitava razão para gostar de comê-los: vingança.  A maioria deles  acha muito saborosa a carne humana.

1. Escaravelho. Muita gente o conhece como besouro, mas existem diferenças. A primeira é que estes são muito mais pesados e voam de maneira muito barulhenta e desengonçada.  (Imagine um trio elétrico querendo voar).  O mais forte deles, chamado de Hercules consegue levantar 850 vezes o próprio peso, o que é raro no reino animal. Se você é halterofilista e ficou empolgado com esse desempenho, hesite um pouco antes de seguir sua dieta de robustez, à base de fezes e porcarias. Não confunda: Escaravelho é escaravelho e não escarra-em-velho, como certos halterofilistas, bombados  e mal-educados.

2. Barata. Se você é daqueles que morre de medo de barata agradeça a Deus pela sua sorte. Das 4 mil espécies que existem no mundo apenas 1% vivem ao seu redor. Portanto, pode respirar aliviado, coisa que, aliás, a coitada tenta fazer quando, prestes a morrer,  fica de barriga para cima. Ao contrário do que você pensa  ela não está gozando de sua cara ridicularizando sua ‘imortal’ incompetência em matá-la, mas só está  tentando respirar melhor antes de morrer.  Isso é raro, mas, às vezes, acontece.

3. Viúva Negra. É a aranha mais famosa que existe (virou até atriz de cinema), mas tanta fama não provêm apenas  da sua cor, como também do fato de comer (literalmente ) o macho depois do ato sexual. Como todo mundo sabe entre as aranhas e as  mulheres existe muita coisa em comum, mas, quanto a esse talento é necessário diferenciar as fêmeas humanas:  estas, quando muito, depois que comem os machos, os deixam completamente lisos -  não chegam a devorá-los.

                                                                

4. O Tatuzinho de Quintal. Coitado do tatuzinho de quintal! Ninguém dá bola para ele , embora também seja... Um Tatu-Bola. Todo mundo que cuida de jardim já os percebeu, enroladinhos, como uma bola. Os coitadinhos – que fazer? - se enrolam assim para se proteger, perder menos água, manter o abdome úmido e poder respirar. Têm no máximo 3 cm. e, agora, depois que o Tatu-Bola foi promovido a símbolo da Copa, estão mais encolhidinhos ainda. É que não engoliram tanta discriminação só porque são escurinhos, tímidos e menores. Ah, como o tatuzinho de quintal gostaria que as cotas que os políticos brasileiros inventam fossem para todos os animais e não apenas para poucos (humanos ) privilegiados!

5. Escorpião. O escorpião é um bicho raivoso e perigoso. O nome já diz tudo já que, ao invés de ter um corpão, têm o que poderia perfeitamente se chamar corpião, ou seja, na parte de trás do abdome uma espécie de cauda com um ferrão que pode matar uma criança em poucas horas. Bote horroroso nisso!
Sem essa, porém, de que os escorpiões se matam quando estão rodeados de fogo. O que acontece é que eles perdem água  muito rápido,  o que os faz contorcerem-se. Portanto, essa é mais uma lenda  do mundo dos homens aplicada aos bichos.  Comprovadamente, o único animal que se mata – não com fogo, mas quando está de fogo – é o homem, pelas ruas e estradas da vida.

6.  A craca. Eis aí um  ser vivo muito esquisito. (Parece até o trânsito de São Luis, já que nunca sai do lugar). Desde que nasce se fixa numa rocha ou num pedaço de madeira e aí fica. O negócio dela  é não ser perturbada, tanto assim que , não satisfeita em se isolar totalmente, ainda enche de cimento em volta de si para evitar qualquer possibilidade de aproximação. Vai querer exclusividade assim...Não no raio que os parta, mas numa pedra – que um raio nunca vai partir.
Essa vocação, de não querer aproximação de ninguém, às vezes  faz lembrar o atendimento atual da Caixa Econômica, onde colocaram paredes de vidro opacas para não ofender seus caixas com a visão dos clientes. Como a Caixa Econômica Federal, que é de todos os brasileiros, resolveu patrocinar um único time de São Paulo, o  Corintians,  despejando milhões de reais suados de seus contribuinte nas mãos de um grupo privilegiado de jogadores de futebol, faz desconfiar que para os lados de sua gerência  estão  confundindo alhos com bugalhos. Ou melhor, cracas com craques.
                                                                                              ewerton.neto@hotmail.com
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sábado, 15 de dezembro de 2012

CAMPEÃO SIM, MELHOR NÃO


Artigo publicado, hoje, sábado,  na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal O estado do Maranhão



No futebol, esse esporte tão fascinante quanto imprevisível, em que o campeão nem sempre é o melhor (muita gente se esquece disso) o que é melhor: ser o campeão ou ser o melhor?
O bom, evidentemente, é ser, além de melhor, campeão. Isso, infelizmente,  não é para todo mundo. Em termos internacionais assim já foi o Santos de Pelé, o Barcelona, de Messi, a Seleção Brasileira de 58, 62, 70 e 98. Outros times ou seleções maravilhosas não conseguiram ser campeões: a Hungria de Puskas em 54, a Holanda de Cruyff em 74, a seleção brasileira de 82. Assim também grandes jogadores como Di Stefano, Zico, Platini etc. jamais conseguiram ser campeões do mundo, mas jamais serão esquecidos, muito pelo contrário. A história sempre se lembrará deles, bem mais até do que daqueles que foram simplesmente campeões.
De algum tempo para cá, desde quando se  implementou no futebol brasileiro a filosofia, hoje predominante, do futebol de resultados somou-se a essa visão futebolística um apêndice que ganha contornos cada vez mais epidêmicos: a exaltação da torcida como personagem. Na prática, times de grande torcida, incapazes de formar times de craques passam a ser fanatizados (com o suporte escancarado e oportunista da mídia – principalmente da rede Globo)  não pelo que seus jogadores executam dentro de campo, mas pelo que acontece fora dele. Assim, ao invés de um time ser idolatrado pelo seu plantel de craques, passa a ser exaltado por causa de sua  imensa torcida e, com isso, degenera-se  o que de melhor  deveria ser buscado no espetáculo esportivo, em favor da relevância a aspectos comezinhos e peculiares ao anti-futebol : a supervalorização da ‘raça’ de jogadores sem talento, o amor à camisa (?), torcida com poderes para levantar o time ( como se isso fosse possível ), paixão descomunal , etc. Ou seja , do bom futebol cada vez menos se fala. 
                                                     

De repente, por exemplo, a marcha atual do Coríntians, o time brasileiro de maior torcida no Sul do país, em busca de um título mundial é propagada insistentemente pela mídia como se estivéssemos diante das seleções brasileiras  dos bons tempos, capazes de arrebatar pelo entusiasmo uma nação inteira (igual cobertura televisiva, jamais foi concedida à trajetória de outros times, como São Paulo, Inter, e, mais recentemente, o Santos).  Tal ‘exagero’ seria concebível se permanecesse restrito ao interesse financeiro; imoral, mas compreensível se pensarmos no quanto uma empresa que monopoliza o destino do futebol no Brasil, como a rede Globo, investe nesses times para auferir a contrapartida do lucro.
O lastimável, porém, para o futebol como esporte, é que isso implica, necessariamente, um preconceito contra os times de menor torcida. Quando se propaga que “amar o Coríntians é um gostar diferenciado”, além de se forjar um embuste, falta-se com a verdade. É fácil raciocinar.  Que paixão de torcedor  é maior, a daquele que, Maria vai com as outras, prefere torcer por um time badalado  e rico, ou a daquele que, contra tudo e todos,  torce, por um time pequeno, sujeitando-se a se divertir ou sofrer com as potenciais agruras de um  time que não tem espaço na imprensa e é constantemente vilipendiado, em suas conquistas, pela arbitragem tendenciosa por este Brasil afora? Quem torce mais pelo seu time, o torcedor do Coríntians ou o da Portuguesa Desportos? Arrisco-me a dizer que, na pior hipótese ambos são torcedores do mesmo quilate e  deveriam ser respeitados igualmente pela mídia, proporcionalmente às suas paixões equivalentes.
(Antecipando-me ao risco de que possa haver da parte do leitor uma interpretação equivocada do que está sendo tratado,  apresso-me a enfatizar que o objetivo desta reflexão não é desprestigiar  o amor de um torcedor pelo seu time de imensa torcida – e, quiçá sua ‘obsessão’ em torno disso -  mas a de ser um humilde alerta para que essa anomalia não seja aproveitada como moeda de troca, por políticos e empresários oportunistas, em desfavor dos próprios torcedores. Como todos sabem isso aconteceu no recente episódio em que um estádio caríssimo foi doado pelo Estado ao Coríntians, às custas do dinheiro do contribuinte sob a alegação de que assim se estaria se satisfazendo a vontade popular.  Quando corrompe-se a verdade das relações torcida x time x sociedade com objetivos escusos,  nem mesmo os torcedores do próprio time beneficiado  saem ganhando. )
Lembrando  mais uma vez que o que diferencia um time do outro dentro de campo  não é fato de dispor de maior torcida,  mas o que é capaz de mostrar em cima do gramado, sobretudo em termos de qualidade futebolística , torçamos para que neste fim de semana, finalmente,  o Coríntians Paulista possa mostrar aos seus torcedores e a todo Mundo , um futebol digno das glórias que fizeram a admiração do futebol brasileiro. Como disse o jornalista Juca Kfoury – que, por sinal, é corintiano – domingo sairá obrigatoriamente  o campeão do mundo. Não necessariamente, o melhor.
                                                                              ewerton.neto@hotmail.com                                                                                                  http://www.joseewertonneto.blogspot.com

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

GENTE 80 X 20



artigo publicado na seção Hoje é dia de...Caderno Alternativo,
jornal o Estado do Maranhão, sábado


Gente 3 x 4. Esse é o título da seção de última página de uma revista dedicada a descrever características da personalidade de celebridades. Com mais freqüência  atores de tevê quando considerados, com bastante exagero, jovens, bonitos ou  talentosos.
Gente 80 x 20. Poderia ser o título de uma seção parecida, porém, dedicada a celebridades femininas, nem tão jovens, muito pelo contrário. Estas são com extraordinária freqüência: peruas, carcomidas, arrogantes, deslumbradas e pretensiosas. São elas: Suzana Vieira, Ana Maria Braga, Maitê Proença, Cristiana Oliveira, agora Arlete Sales... ETC.  Distinguem-se por andarem sempre com um “namorado” jovem, se é que podemos chamar assim, do lado.  São tão parecidas em personalidade que a de uma vale para todas. 80 é a idade de cada uma, 20  a do “namorado”.
                Idade: “Uma mulher capaz de dizer a própria idade é capaz de tudo”, Oscar Wilde
                Local de nascimento: Faz tanto tempo que já esqueceu.
                Altura: 1,65m ( sendo vinte, do salto do sapato)
                Peso: 54 kilos (sem contar os 15 de botox)
Maior qualidade: Força de vontade – para arranjar namorado novo.
A característica que acha mais importante para uma mulher na sua idade: ter um guarda-costas.

                                                                

Sua atividade favorita é: não pensar
Quem você gostaria de ser se não fosse você mesmo: Aquela que aparece nas suas fotos com a ajuda do photoshop
Qual a sua viagem preferida: qualquer uma que não seja a que fará muito em breve,  num caixão de defunto.
Qual a sua cor favorita. Depende da meia-luz e da cueca que o gigolô estiver usando.
Um  super-poder que gostaria de ter: Viajar no tempo.
Para onde: para a época em que podia se olhar no espelho sem sair correndo.
Momento preferido do dia: Aquele em que à custa de muita pintura e força- de - vontade conseguiu esconder os vestígios da noite passada.
No que pensa quando acorda: “Meu Deus, já são vinte horas”.
Uma flor: a do vestido do réveillon.

Um animal: o gigolô cachorro. (Não confundir com o cachorro do gigolô.)
Do que não gosta no próprio  corpo:  O esqueleto, porque não dá para fazer plástica.                                                
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sábado, 1 de dezembro de 2012

VÁ SE FODER!




Artigo publicado na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal O Estado do Maranhão



“ O pior palavrão vira pó e palha. Diante de um canalha.”

                Agora é científico. Estudo afirma que falar palavrões, ajuda resistir à dor física. Ou seja, um puta que o pariu!, um vá se f...!,ou um filho de uma égua!,  ao invés de serem obscenidades são, nada mais nada menos, que recursos postos pela evolução  à serviço do ser humano, para que este descarregue suas frustrações e sofra menos, inclusive fisicamente.
                Tal estudo foi desenvolvido pela Escola de Psicologia da Universidade de Keele, na Inglaterra e publicado pela revista especializada NeuroReport, ano passado concluindo que não há nada como um bom palavrão para amenizar a dor .
                Essa notícia é deveras alvissareira, principalmente por aqui, onde recentemente foi noticiado que nos hospitais falta remédio para socorrer os doentes.  Fico imaginando um sujeito,  morto de dor, chegando ao Socorrão e o médico de plantão,  já inteirado da nova descoberta, receitando.
                - Se não tem remédio, enfermeira, mande  ele xingar .
                - Xingar o quê?
                - Ora, mande  ele xingar qualquer coisa: Deus, o  mundo,  o juiz de futebol,  o mais alto que puder.
                O doente, claro, não se faz de rogado
                - Médico filho da puta! Enfermeira piranha! Hospital de merda!
                O  doutor,  impassível,  a tudo  fica escutando, calmamente.
                - Doutor, ele não para de xingar! – diz a auxiliar.
                - Deixe-o à vontade.  Quanto mais ele xingar, melhor.
                Finalmente, o doente cansa. O médico, com ar vitorioso, pergunta para a enfermeira. 
                - E agora, enfermeira, como está o nosso doente?
                - Ele diz que a dor aliviou.           
                - Eu não disse? Chame o próximo.


2. Os médicos terão de se especializar nisso cada vez mais. Aos poucos haverão de surgir  os  mais talentosos, ou seja,  aqueles capazes de receitar o palavrão mais apropriado para cada tipo de dor. Ao invés de Novalgina: sacana sem-vergonha!, ao invés de Buscopan:  cadela vagabunda!, ao invés de Atroveran: corno safado!.  O médico dos hospitais públicos, principalmente, terá de evoluir para ser um profissional  com  alta dose de psicologia para obter, sempre,  a melhor resposta para o sofrimento. Imagine a economia  que o Ministério de Saúde terá com isso! Imagine  a alegria dos corruptos com a sobra! 
 Um problema surgirá, no entanto. Como é fácil constatar, os xingamentos, com o tempo, tendem a se tornar inócuos, ou seja, com prazo de validade vencido.  Quem ainda se julga ofendido ao ser chamado de Sacana? Qual a mulher que reage negativamente, como antes, ao ser chamada de puta? (Esta semana, a idolatrada  Ivete Sangalo , proclamou, muito orgulhosa na revista Playboy  ,  que toda mulher tem que ser uma quenga). Qual o mandatário  que se ofende hoje ao ser chamado de corrupto canalha se, pouco tempo depois, o próprio povo o reelege? O problema com esse tipo de remédio é que, de repente, pode ser necessária  uma alta dosagem. Novos xingamentos precisariam ser inventados, mas, como?  
                                                       
                                                          
3.Pensando bem, acho que a solução poderá vir dos anti-palavrões.  Mas o que seria um anti-palavrão? Justamente, o que se convencionou se chamar – em tempos muito remotos - de virtudes. Deu para entender? O que ofende mais alguém hoje em dia: ser chamado de cafageste ou de humilde? De sacana ou de honesto? De corrupto ou de pobre? De santa ou de puta? (Basta entrar nas redes sociais virtuais para constatar a multidão  de meninas  de treze anos,  reclamando de bullyng nas escolas por terem  sido chamadas, pejorativamente,  de virgens). Ser um glorioso sacana, por sua vez,  é o auge da reputação que um homem respeitado pode desejar : seja ele um caminhoneiro ou um freqüentador das colunas sociais.   
Enfim, bastaria  atualizar a palavra ofensiva e  xingar à vontade: o que interessa é que a ofensa seja capaz de ofender  alguém  na medida certa. Para aliviar a própria dor.
                                                                              ewerton.neto@hotmail.com                                                                                                  http://www.joseewertonneto.blogspot.com

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

POVO/CURRÍCULO



artigo publicado na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal O estado do Maranhão, sábado



CURRICULUM VITAE DO POVO


Enfim, o currículo do povo. Essencial, nesta hora de troca de prefeitos em que corre o boato de que vão botar muita gente na rua. O povo, como todo mundo sabe, também é gente e - como nem todo mundo sabe -  também precisa de emprego. Portanto, é hora de colocar o currículo, mostrar o potencial e sair à caça. Para os que saem e os que  chegam, o importante é mostrar para os empregadores  o que é o povo, suas qualidades, suas aspirações  e a que veio. 
1.Nome: Povo
2. Apelido: (antes da eleição); Minha Gente, Brasileiros, Companheiros. (Depois da  eleição); Ignorantes, Raça de Malandros, Gente Imprestável.
3. Filiação: (pai)  Nunca soube quem foi. (mãe) Alguém que  nunca soube quem foi seu pai.
4. Data de Nascimento: Ainda não nasceu. Só vegetou.
5. Local: Debaixo de pontes, de viadutos, de papelão,  do céu etc.
6. Onde Reside: No próprio corpo, quando não está bêbado. Quando está doente é residência fixa, quando está se arrastando, é móvel.
                                                                 

7. Estado Civil. O único estado que a ele se aplica é o de calamidade pública.
8. Sinais Característicos. O dente que sobrou e uma infinidade de vermes.
9. Carteira de Identidade. Identifica-se pela falta de dinheiro, na carteira.
10. Carteira de Habilitação. É habilitado pelo Governo para andar a pé, desde que não seja em shopping  centers, faculdades, centros de convenções, camarotes , etc.
11. CPF. Não tem o CPF, mas tem o CDF, de tanto exercitar o traseiro nas calçadas das filas dos hospitais públicos.
12. Escolaridade. Sonha em ser acadêmico um dia ( de escola de samba)
13. Curso de Pós-Graduação. É especialista em pós: de estrada (nas caminhadas de sem-terra); de calçada, de crack etc.
14. Curso de extensão: Vive se aprimorando em estender a mão - para pedir dinheiro.
15. Um motivo de orgulho: Os nove filhos.
16. De tristeza: Dois terem sobrevivido.
17. Música preferida: De panela cheia de feijão, chiando no fogão.
18. Cantor preferido: A torcida do Flamengo gritando gol ( mas isso já faz tempo).
19. Uma dúvida: Dúvida não tem nenhuma, dívidas  tem muitas.
20. Frase histórica mais conhecida. “Se é para o bem do povo e felicidade geral da nação, diga ao povo que fico - com o dinheiro.”  De Dom Pedro I ou  de um político qualquer.
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sábado, 17 de novembro de 2012

RESOLUÇÃO DOS PROBLEMAS DE SÃO LUIS? SÓ NA FEIRA



artigo publicado na seção Hoje é dia de..
Caderno Alternativo, jornal o Estado do Maranhão


Solução para os problemas de São Luis? Só na feira.
Não, não pense que é piada e que a maliciosa pergunta induz à resposta “sexta-feira” , que é o dia para onde tendem, nas mesas de trabalho dos tecnocratas e burocratas,  todos os problemas  sem solução da nossa capital. Mas, pense numa feira, mesmo. Essa, que se intitulou  XI Feira de soluções e teve como tema “ A matemática aplicada aos problemas de São Luis” . Coitada da matemática!
Um amigo meu, repórter,  foi  lá para conferir. E, depois de enaltecer a iniciativa dos jovens alunos, sempre sonhadores,  transcrevo alguns tópicos, os mais populares,  que lá foram discutidos, com  suas soluções. Matemáticas?
1.O que será feito com  o V.L.T. ?  Eis aí um problema para dar uma bruta dor de cabeça a qualquer matemática que se preze.  Uma solução aparentemente lógica teria  de estar  numa equação a várias incógnitas – e bote incógnita nisso! Dito e feito.  Uma grande batalha foi travada entre alunos, computadores e programas de dar em doido no Excel, sem que nada de prático se concluísse.   A resposta jamais seria  encontrada se um estudioso  não tivesse a feliz idéia de atentar que a solução teria de vir  da resolução  complexa, não de uma equação, mas de uma matriz. Não, não de uma  matriz matemática, mas na matriz das idéias que passam pelas cabeças de nossos administradores.
Resumindo:  “ a matemática faz sua parte, saber o que se passa na matriz  das idéias de nossos tecnocratas ,  aí são outros quinhentos”.



2. Como resolver o problema de nossas  praias poluídas?  Depois de matarem a cabeça,  mais uma vez,  os estudantes  chegaram à conclusão de que a solução teria de estar numa permutação pura e simples, embora não necessariamente, matemática.  Deu para entender?
Essa  possível solução foi sugerida por um estudioso,  que,  por sinal,  é morador de um  luxuoso prédio na Ponta D`areia.  Ele diz que há muito tempo convive com o problema tanto é assim que toda vez que vai ao banheiro e dá a descarga costuma se despedir do cocô, dizendo “até-logo” porque sabe que vai encontrá-lo horas  depois nas águas da Ponta Areia, boiando nas águas onde costuma banhar-se.  Daí porque, com sua  vasta  experiência, ter chegado  à conclusão de que a solução não passa longe de uma permutação - que já foi feita, aliás. Enfim, para  bem de todos e felicidade geral da nação: basta permutar  o método de cálculo e o local das medições, que os cocôs  comportam-se direitinho.  Simples não é?  Se a matemática não vai a Roma, Roma vai à Matemática. Ou, para quem não gosta de adágios: se os cálculos dizem o que não se quer, mudam-se os cálculos.
3. Como   aumentar  seu  patrimônio  3 a 4 vezes  com o mesmo salário?  A notícia, escancarada pelos jornais da capital sobre o patrimônio de alguns vereadores e posta para resolução matemática caminhava para um desfecho sem solução quando alguém propôs a idéia de que os números dos salários, podem sofrer de um súbito “ Mal de Alzheimer  matemático”. Ou seja, números racionais, tornam-se irracionais de uma hora para outra,  dando uma canseira nos computadores que tentam controlá-los, em vão. Daí que podem descambar  para um crescimento em  progressão geométrica, tanto mais rápido quanto mais o sujeito não souber explicá-los.  Nem precisa dizer que a solução matemática sugerida foi exaustivamente  aplaudida pelos políticos presentes.
4.  Como aumentar de uma hora para outra  a quantidade de municípios do Estado e, principalmente, da ilhal?  Alunos e professores deram tratos à bola para responder a tão intrigante questão até chegarem  à conclusão de que esse  interesse político pelo “bem estar da população” pode ser expresso por uma equação traduzida pela seguinte relação:
 1 quebra-molas + 1sujeito (querendo ser prefeito) + amizades com deputados + um caminhão velho = Município.
Relação matemática essa que passou a se chamar, imediatamente,  Lei da Criação de Municípios no Brasil. De tão genial, este arranjo  matemático deverá ser propagado  para outros estados brasileiros onde sempre haverá   interesses  de mesma natureza.



5. Como aumentar a mobilidade do trânsito na capital? Eis uma tarefa hercúlea para qualquer matemático de vez que em São Luis, por falta de bons planejadores, todas as vias paralelas,  em número de mais de quinhentas, oriundas de mais mil subúrbios tendem para duas ou três avenidas principais onde circulam mais carros do que gente, mais guardas de trânsito do que carros e mais barreiras eletrônicas do que guardas .  A solução matemática encontrada, se é que podemos chamar assim - , foi questionar o  postulado antigo da Matemática  que diz que duas paralelas se encontram no infinito. Em São Luis, garantem  os matemáticos,  as  paralelas sempre se encontram, ao contrário de no infinito,  num monstruoso engarrafamento.
Encontrada  a “raiz” do problema, lamentou-se que esta nada tivesse a ver com  uma “raiz” quadrada. Desta, pelo menos, poderia se esperar uma solução.
                                               ewerton.neto@hotmail.com                                                                                                                  http://www.joseewertonneto.blogspot.com

sábado, 10 de novembro de 2012

OS HÍMENS ESTÃO À VENDA



artigo publicado na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal O Estado do Maranhão



Você tem menos de vinte e um anos e é bonitinha. Conseguiu – sabe-se lá como! - manter seu hímen  intacto  até agora. Tem uma vontade danada de ganhar dinheiro fácil, mas acha que fazer concurso para modelo é perda de tempo   porque não tem ossos à vista o suficiente.  Idem, já pensou em se inscrever para o BBBrasil, mas a concorrência por lá também é grande: a putaria é exagerada,  os machos são retardados  e um hímen intacto não ia fazer tanto sucesso. Que tal vender seu hímen?

                                             

Foi essa a idéia  que teve Catarina Migliorini, catarinense,  20 anos completos e hímen idem.  Inscreveu-se num  site australiano de seleção de virgens e foi escolhida para doá-lo, em leilão. O preço do dito cujo  já está por volta de duzentos mil dólares e, com isso, ela avança firme em sua pretensão não anunciada: fama e dinheiro. Diz, para despistar, que usará a grana para financiar seus estudos de medicina e para abrir uma ONG.  Antes que os grupos religiosos comecem  a lhe meter o pau (sem duplo sentido, já que, por enquanto ninguém venceu o leilão) ela reage dizendo que sua finalidade é puramente artístico-científica. Segundo o site, o propósito da empreitada é fazer a divulgação de como uma mulher se sente antes, durante e após perder a  virgindade. Será?
 O site só não explica porque não foram perguntar  isso para qualquer periguete num baile funk da periferia. Talvez porque acreditem, com razão, que isso faz tanto tempo que elas não se lembrariam.  Poderiam, por outro lado, indagar a qualquer  aluna de corte e costura, que esta responderia facilmente :  piranha antes, dorzinha durante, milionária depois. O certo é que enquanto o dia D não chega ( será dia 25 deste, num avião sobrevoando o Pacífico) Catarina curte férias em Bali – na Indonésia, sem descuidar de suas obrigações profissionais: estuda  seu ponto G, prevendo  que isso poderá ser  de muita serventia-  logo depois do dia D.
            2. Por outro lado, se você for do sexo masculino,  jovem, e tiver as mesmas aspirações  de grana fácil, não fique triste imaginando que as oportunidades  sexuais da rede sejam discriminatórias em relação aos homens . Saiba que o russo  Alexander Stepanov, de 23 anos, também resolveu leiloar a sua virgindade.  Tímido,  ele se justifica dizendo  que ficaria mais confiante com uma mulher que pagasse para transar consigo,  iniciando uma nova era: a do sujeito que precisa ser pago como prostituto para poder dar sua ‘arrancada’. Antigamente, como se sabe , a coisa era diferente:  o marmanjo é que  tinha de pagar uma prostituta para iniciar-se. Parodiando Machado de Assis: mudaram as prostitutas ou  mudou o tesão ?

                                          


O único problema  é que o rapaz esqueceu de perguntar às mulheres o que elas acham disso. O preço de sua  virgindade  chegou a apenas 13 mil dólares, mesmo assim atulhado de ofertas de homossexuais ativos e passivos. Parece que as mulheres continuam não dando tanto valor assim para esse negócio de “virgindade masculina” e,  se tivessem que escolher, prefeririam um na base do quanto mais “estuprado” melhor. A história de sucesso dos Casanovas e Don Juans da vida prova isso.
3.  Para os  coroas e desprovidos de virgindade, por sua vez, nem assim cessam as oportunidades sexuais milionárias da Internet. Notícias repetidas  pela imprensa internacional dão conta de que existe  um bilionário chinês de Hong-Kong oferecendo mais de cem milhões para o ‘homem de verdade’ que for capaz de conseguir  dissuadir sua filha de casar com uma lésbica. Como a tarefa não seria  nenhum sacrifício a julgar pelo retrato da chinesa divulgada nos jornais, resta encontrar a solução para  esse  “homem de verdade”,  que até as brasileiras reclamam de que não existe mais, seja do ponto de vista chinês,  finlandês ou extra-terrestre.
Resumindo, se você for jovem e quiser ganhar dinheiro fácil nem precisa ser filho de milionário ou ter um paisão político para herdar sua herança de votos. Basta diminuir a cota de seus escrúpulos sexuais e correr para a Internet. As chances são vastas.
                                                                                  José Ewerton Neto

sábado, 3 de novembro de 2012

OS MAIORES MONSTROS SÃO OS HOMENS



artigo publicado na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal O estado do Maranhão, hoje sábado,
com o título Sobre Monstros e Humanos


“ A maior arrogância do homem não é imaginar-se à imagem e semelhança de Deus, mas acreditar que o diabo pode se pior do que ele.” Do livro O infinito em minhas mãos

                Tenho a impressão de que nós, humanos, fingimos ter medos de monstros, que na maioria das vezes  inventamos, como forma de escaparmos da realidade de que nós somos nossos próprios monstros, mais ou menos como diz a epígrafe da novela acima referida, deste cronista.
                Daí que a maioria dos monstros com que costumamos nos aterrorizar desde os tempos de criança, não  passam de personagens simpáticos - embora bizarros, por vezes até ingênuos na sua incapacidade de nos causar real pavor.  Uma prova disso são os vampiros e sua transformação atual em objetos de desejo sexual,  almejados por  todas as nossas adolescentes. O que, pensando bem, soa plenamente justificável, pois, caso não tivessem sido inventados à sua época, por quem sonhariam nossas garotas, hoje, se a realidade é tão implacável para com elas? Fiuk, Luan Santana, Gusttavo Lima? Todos  são cantores e ídolos  medíocres, tão anódinos quanto bobalhões, a se prestarem, quando muito,  para consumo em histeria coletiva  comandada por qualquer bobo da corte televisiva. Mas, e para sonhar? Muito melhor um vampiro.
Por outra, quem deveria nos aterrorizar mais: uma assombração que nos espanta,  mas que é incapaz de nos causar dano maior, ou um político corrupto, desses que elegemos com freqüência,  a subtrair as verbas destinadas  às escolas e hospitais e condenando milhares, inclusive nossos parentes,  à morte?  Ora, isso apenas reforça a convicção de que o lobo do homem é o próprio homem e, perto dele, qualquer  lobisomem não passa de um cordeirinho.
                Quando me tornei amante, em criança, de histórias em quadrinhos não conseguia me aterrorizar com o que via nas revistas  de terror. Os zumbis, por exemplo,  apareciam como seres assustadores, mas o que me dava era uma imensa pena desses coitados. Que mal podia fazer um zumbi? Sendo  um morto-vivo, era alguém que tendo morrido, sequer tinha o direito de gozar de sua paz definitiva. Embora feios, não distinguia maldade em seus rostos, o que me expressavam era uma imensa tristeza,  bem parecida com aquela  do famoso quadro de Edvard Munch. Eram,  no meu entender, vítimas, não algozes. Igualmente, por mais que tentasse não conseguia entender – isso até hoje - porque pessoas adultas tinham (ou têm) medo de pessoas mortas, muitas vezes queridas, temendo que depois de mortas, estas lhes apareçam como fantasmas. Que poderia haver de melhor na vida do que a visita, pós-morte, de um ente querido, pelo menos para nos dar a certeza de que não se foi, definitiva e implacavelmente, sem retorno?
                Recente publicação da revista Superinteressante traz   uma lista de bestas e feras, desde as  mais conhecidas:  vampiros, zumbis e lobisomens acima referidos, passando pelos monstros poéticos como unicórnios, sereias e hidras até os quase reais como piranhas, tubarões , baleias monstruosas e água-vivas  mortais.  Todos são tão deliciosamente inofensivos quanto as histórias mirabolantes  que são contadas sobre eles, sem contar os simplesmente cômicos como o saci-pererê e a mula sem cabeça.

                                                                      

                A  revista, no entanto, parece ter esquecido da serpente encantada de São Luis – essa que um dia, quando seu rabo encontrar a cabeça vai esmagar a ilha. Ou seja, mais  um monstro que, originado  de uma lenda é igualmente  digno de pena em seu destino inglório de  ilusão descabida.  Pois, como disse a seus amigos que foram visitá-lo em seu  recente aniversário,  o poeta e cronista  José Chagas evocando, de uma de suas crônicas passadas, seu amor à São Luis :  “Esta cidade permanecerá para sempre imorredoura e bela porque resiste aos seres humanos que estando sobre ela fizeram  de tudo para destruí-la, administradores ou não”. Portanto, se a cidade  conseguiu resistir aos homens, que dirá à serpente!
                                                                                              ewerton.neto@hotmail.com                                                                                                   HTTP://www.joseewertonneto.blogspot.com



sábado, 27 de outubro de 2012

A BOLÍVIA QUERIDA NO A-B-C BEM HUMORADO DE SÃO LUIS (4)


Artigo publicado na seção Hoje é dia de...Caderno Alternativo, jornal
O Estado do Maranhão, hoje, sábado


Em sua quarta edição , segue o A-B-C  bem humorado de São Luis, um passeio com livre interpretação sobre as expressões idiomáticas, ditos e coisas típicas de nossa cidade. ( Mais uma vez  na carona dos imperdíveis livros de  J.R. Martins e José Neres sobre expressões populares maranhenses)
1. “A Valença é que”...A sorte é que. O sanluizense, esperto,  prefere  falar de valença do que de sorte acreditando, com razão, que falar de sorte pode dar azar.  
2. “Acender o morrão”. Iniciar a bebedeira. Embora seja usado por homens e mulheres  teria sido originado do dito universalmente conhecido: água de morro abaixo, fogo de morro acima e mulher quando quer dar ninguém segura. Daí o ‘acender o morrão’,  já que, ao iniciarem a bebedeira elas já estão acesas há muito tempo.
2. “Baixar a matraca” – Surrar, bater. Como ultimamente vem fazendo a Bolívia querida ( abaixo).
3. Bolívia Querida” Diz-se do time de futebol mais querido da cidade, o Sampaio Correia F.C. , o único, em todo o Brasil  a possuir, depois de domingo passado,  três títulos de campeão nacional : da segunda, terceira e quarta divisões, o que leva a concluir que o próximo será o da série A, não pela seqüência no tempo ( primeiro foi a segunda, depois a terceira e a quarta) mas porque não há mais divisões.  O Sampaio Correia é possuidor de algumas características que o diferenciam e  o tornam simpático até para os torcedores mais distantes . O nome não é uma homenagem a um grande personagem histórico como, por exemplo, o  Vasco da Gama, mas a um intrépido aviador quase desconhecido que pousou pela primeira vez em São Luis num avião vindo de outro país, no caso, a Bolívia. Daí as cores do time inspiradas na bandeira dessa nação. Aliás, muito impressiona que,  até hoje,  os mandatários bolivianos não tenham reconhecido esse imenso serviço prestado às cores de seu país pelo time maranhense e não tenham convidado a Bolívia Querida para jogar contra a sua seleção. Vai ver que devem ter medo do resultado, pois o Sampaio, a julgar pelo que vem mostrando, ganharia de goleada. 
Na última partida, aliás, que fui assistir no renovado Castelão lotado – está uma maravilha! - o segundo gol  boliviano foi uma obra-prima com impressionante semelhança com a marca de Diego Maradona ( que tive o privilégio de assistir no Maracanã, a primeira vez em que esteve no Brasil quando, jovem ainda,  era apenas uma promessa  genial) : o lançamento, preciso,  no espaço futuro que nos deixa atônitos por alguns segundos  até que aparece um companheiro livre diante do goleiro para concluir. Coisas de Arlindo Maracanã,  em seu dia de Maradona.
Quanto à simpatia que exerce na torcida - que o leva a ter preferência local até de torcedores flamenguistas, portanto rubro-negros, o que, a princípio, deveria ser uma incoerência porque seu rival Moto-Clube tem essas cores - deve estar nestas pequenas singularidades atraentes: a humildade de ter escolhido o nome de um modesto aviador e, como símbolo, as cores, também,  de um modesto  país: verde, vermelho e amarelo na camisa e calção cáqui.  ( Cadê o calção cáqui ? O calção verde que vi no domingo, a meu ver  tira a originalidade  do uniforme) . A Bolívia querida deve ter  a preferência e admiração de uns oitenta por cento dos torcedores desta ilha o que faz com que São Luis, além de Atenas Brasileira e Jamaica Brasileira seja também a Bolívia Brasileira.
4. “... e ele nem seu Souza”. E ele nem aí; não dar atenção a alguém ou coisa. Teria se originado quando um  comerciante chamado Sousa abriu um restaurante no centro de São Luis e, à semelhança do turco Nacib de Gabriela, não via – ou fingia não ver - o batalhão de marmanjos que davam em cima de sua  esposa que tomava conta do restaurante. Quando perguntada por que não tinha filhos ela respondia: “Nem eu nem Sousa gostamos de crianças”, embora, vez por outra, no cair da tarde fosse surpreendida  no colo de algum rapazote na mesa mais oculta do restaurante. Grande Sousa!
5.  “Paidegual”. Superlativo de pai d`´egua ; avantajado; muito grande. Ou seja, trata-se do aumentativo de um aumentativo já que o maranhense chama pai dégua algo avantajado ou monstruoso. Ex prático: “Nada existe de mais paidegual do que as mentiras que os políticos contam aos seus eleitores quando pedem voto. Donde se conclui que paideguinhas, no mínimo, é como os políticos tratam, em suas intimidades,  os mesmos eleitores depois de eleitos”.
                                                                              ewerton.neto@hotmail.com

sábado, 29 de setembro de 2012

VIDA E MORTE DO MARACUJÁ-PÊNIS



artigo publicado na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal o estado do Maranhão, hoje, sábaso


Morreu o maracujá-pênis. Sem pompa e circunstância, sem aplauso, sem choro e sem vela, sem discurso de vereador. Morreu onde nasceu, num pequeno sítio em São José de Ribamar, humilde como sempre foi, sem entender muito bem a razão de tanto interesse humano pelos seus dons, digamos assim, fálicos. Teve vida gloriosa e breve, embora modesta, e faleceu ao lado das folhas secas do pequeno pomar onde nasceu, sob o olhar vigilante de sua dona, Maria Rodrigues, de 56 anos que até agora não conseguiu conter o choro diante de sua partida irremediável.  
            Alguns pequenos detalhes de sua ‘curta’ biografia:
            Tudo começou quando num belo dia dona Maria resolveu comprar um maracujá comum, amarelo e redondo. (Até aí nada demais, pois quem não gosta de maracujá, principalmente amarelo?) Sua surpreendente trajetória só começou a se delinear quando Dona Maria resolveu plantar o fruto no quintal do seu sítio. Eis que, contrariamente a todas as previsões de falta de cuidados, o pé de maracujá, mesmo assim cresceu. Foi crescendo, crescendo, cada vez mais até que...
                                                                               
            Meses depois, noutro belo dia, o filho de dona Maria, que caminhava pelo pomar, não conseguiu conter um grito de pavor ao deparar com um gigantesco pênis, pendurado num galho de uma árvore. Muita coisa deve ter passado pela cabeça do pobre garoto (nenhuma delas, de desconfiança das mulheres de casa, diga-se de passagem) até constatar que, de fato, tratava-se mesmo de um maracujá. Nem precisa falar de sua corrida desabalada para avisar dona Maria, Deus e o mundo. Pronto! Estava descoberto o maior fenômeno natural jamais ocorrido na cidade: um pujante e sedutor maracujá-pênis, pendurado no galho de uma pequena árvore, mostrava potencial para seduzir todas as mulheres carentes e não-carentes deste planeta.
            A partir de então, divulgado o fato nas redes sociais e na imprensa, todo mundo sabe mais ou menos o que aconteceu no que se refere ao seu apogeu e glória. Dona Maria, de repente, viu seu modesto sítio transformado em atração turística internacional, a princípio freqüentado apenas por vizinhos e  curiosos, para logo depois ser invadido por turistas e jornalistas do Brasil e do mundo. Resolveu,  claro, cobrar pela exposição, como dizia: “Já perdi a conta de quantas pessoas passaram por aqui, de manhã, de tarde e de noite. Depois que o meu celular sumiu passei a cobrar 2 pela visita, 15 para tirar foto e 30 para filmar”. Ou seja, tabela de cobrança tão perfeita assim, nem mesmo a do leão do imposto de renda! A única falha na contabilidade de Dona Maria foi ter esquecido de cobrar o lucro pela fantasia sexual propiciada, de graça, às mulheres.
            Tão surpreendente quanto a vida do maracujá-pênis foi sua morte precoce. A hipótese, por ela levantada, da ação dos cupins para justificar o ocaso precoce do fruto tão sedutor e gostoso (em ambos os sentidos), é refutada pelas mulheres da cidade, compreensivelmente revoltadas. “E o maracujá-pênis, propriamente dito? Quem se preocupou com o seu próprio bem-estar e prazer? Não teria sido melhor ter nascido um maracujá comum e azedo do que ter sido transformado num prostituto fudido e mal-pago?”
                                                                       
            Tantas possíveis explicações psicológicas parecem tardias, agora, para compensar a perda de um personagem tão simpático e querido do povo da cidade. Sabe-se, no entanto, que as comunidades populares femininas da cidade balneária já estão se movimentando para exigir de seus administradores que seja erigida, de imediato, uma estátua do maracujá em praça pública, capaz de preservar para sempre sua saudosa e insubstituível memória.
            De preferência, dizem elas, em tamanho  cinco vezes maior que o original.
                                                                                                                                                                                                                               ewerton.neto@hotmail.com
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