Quando Deus resolveu fazer o homem à
sua imagem e semelhança sem utilidade prática futura para ele, deu margem a
que, muitos séculos depois, poucas dúvidas
restem de que fez isso apenas porque lhe faltava um puxa-saco.
Sim porque se a solidão tem suas
vantagens, tem também seu lado ruim como sentenciou Montagne:
“A solidão traz coisas boas. O problema é
que você precisa de alguém do lado para dizer isso”. Pois imagine a situação de
Deus, o todo poderoso, sem ter do lado um mísero alguém, para lhe enaltecer possuindo tanta grandeza.
Sim, porque as estrelas são
maravilhosas e poéticas, mas não falam. Mesmo podendo ler o pensamento de tudo,
isso não era tudo. Faltava a Deus a bajulação pura e simples, transmitida através da fala.
2.Foi então que Deus criou o homem,
ordenando a ele : “Amarás o senhor teu Deus acima de todas as coisas com todas
as forças de tua alma”.
Acontece que a coisa (o ser humano)
não se saiu tão bem quanto ele esperava. Ao invés de puxarem o saco de Deus,
Adão e sua mulher Eva, preferiram bajularem-se entre si, permitindo, inclusive,
o surgimento de outro elemento bajulador, no caso, uma serpente malévola. Esta insinuou
a Eva que puxar o saco de Adão (literalmente) lhe daria mais prazer do que
bajular a Deus, despertando-os para o sexo e o pecado.
Irritado, Deus os expulsou do
paraíso: “Vão puxar o saco de vocês mesmos no inferno, não aqui!” E, assim, o
inferno se instalou para os homens, inclusive na forma do puxa-saquismo,
prática na qual a humanidade veio a atingir a perfeição.
2. Isso aconteceu no antigo Egito.
Haja puxa-saquismo!, em uma civilização que
durou mais de 3 mil anos. A postura por lá era ‘Não existe defeito, então nada
carece consertar’. Conformismo? Não, puxa-saquismo, porque a cadeia de direitos
e deveres era baseada numa escada sem mobilidade social, onde a bajulação
assumia um aspecto tão formal e rígido quanto a hierarquia de onde se originava.
No topo estava o Rei-Deus, o Faraó, e
abaixo dele, o vizir, os dignitários reais e os governadores oriundos da nobreza,
e depois o resto. A bajulação era impessoal e monumental. As pirâmides, os mais
grandiosos túmulos que o mundo jamais viu são tributos à insaciabilidade da
satisfação humana. Os reis do Antigo Egito não eram servos dos deuses, mas deuses
eles próprios. Em 1500 a.c um servidor público egípcio escreveu a respeito do
rei. “Ele é um Deus por quem todos vivemos, o pai e a mãe de todos os homens,
único em sua condição sem igual”.
Tente superar essa bajulação!
3. Um elogio assim era tudo o que
Deus queria para si quando fez os homens. Atingido, no Egito, o clímax do
puxa-saquismo, de lá para cá foi só aperfeiçoamento. O que
são os livros de autoajuda, hoje, mais
do que uma exaltação da bajulação a si mesmo?
Isso traz a certeza de que, em breve,
quando a civilização humana virar pó, sobrará como característica mais
marcante do gênero humano o
puxa-saquismo. E nos confins do Universo, onde toda memória do Mundo estiver
concentrada, quando alguém clicar no verbete Terra surgirá a informação: “Existiu
nesse minúsculo planetinha uma espécie que, criada à imagem e semelhança de
Deus para o exaltarem, preferiram inventar a si mesmos como deuses, para
bajularem-se entre si”.
Não podia ter dado certo.
José Ewerton Neto é autor de O oficio de matar suicidas