sábado, 29 de dezembro de 2012

FELICIDADES DE FIM-DE-ANO



artigo publicado na seção Hoje é dia de...Caderno Alternativo,
jornal O estado do Maranhão, hoje, sábado



“A felicidade pode ser comprada. 93% dos brasileiros afirmaram para uma pesquisa de consultoria da Skandia  International, Revista Isto É, desta semana,  que com um salário de 23 mil teriam a felicidade”.


                Encontraram-se no réveillon do Copacabana Palace, no Rio. A princípio, Solinei não quis acreditar.
                - Você por aqui?
                É que Solinei, empresário bem-sucedido na ilha, não podia esperar que Vicente tivesse grana para estar ali, como ele, torrando-a num dia de Reveillon.  Foram colegas de escola no segundo grau de um colégio pobre. Na última vez em que o vira, coisa de cinco anos atrás Vicente lhe causou até constrangimento quando veio cumprimentá-lo: sabia-o um  funcionário público modesto, dirigindo um Fiesta  velho, comprado sabe-se lá como.
                - Sou eu mesmo, Solinei. Estou aqui com minha família.
                Solinei procurou em vão. Vicente apontou para um grupo adiante.
                - Estão lá. – Solinei engoliu em seco.  Eram mais de quinze pessoas.
                Conversaram. Solinei , a princípio, quis  se livrar da incômoda companhia de Vicente, mas morria de curiosidade em saber de onde Vicente tirara tanta grana. Na verdade, Solinei começou a  sentir-se frustrado.  (Uma de suas alegrias  era mandar publicar nas colunas sociais dos jornais  da província que podia pagar o réveillon do Copacabana Palace).  É como se a presença  de Vicente por ali desmentisse esse poder. Conversaram, trocaram idéias, as confidências iam e vinham embaladas pelo uísque que corria à solta. Lembraram dos velhos tempos de escola, mas  Solinei perdera a espontaneidade e, sem uma razão definida, não conseguia se alegrar.  Havia algo de doentio na presença de Vicente, mas  Solinei não conseguia abandoná-lo. Como se estivesse contaminado.

                                                              

                - Mas, você está feliz? – perguntou, de repente,  Solinei.
                Vicente hesitou
                - Bem...Tenho que estar não é? Eu paguei para isso.
                Solinei interpretou aquilo como uma indireta. Ficou triste. Lá fora os fogos de artifício começaram a ribombar no céu. Era fogo para todo lado, um espetáculo tão bonito quanto inútil, mas a droga, agora, é que Solinei , não conseguia se livrar da incômoda pergunta a si mesmo sobre  o que estava fazendo ali. “Merda, para que serve, ao final,  tanta palhaçada, tanto fogo de artifício por causa da passagem de uma  noite que, ao final de contas, é uma noite qualquer?” “ E por que eu tenho de estar eternamente  ao lado do mesmo bando de panacas: Peruas encarquilhadas e bestalhões buxudos e arrogantes?”. Solinei começou a se sentir mal.
                - Está mesmo gostando disso?
                - Bem..Vicente hesitou – Preciso estar não é? Eu paguei para isso.
                Solinei  percebeu  que aquela resposta já havia sido dada. De repente, tudo se tornara muito vago, estranho, vazio.  Queria  se livrar da presença definitivamente incômoda de Vicente que lhe fazia  sentir-se tão mal.  Procurou pela jovem esposa, ao longe, mas ela parecia indiferente , junto a um grupo carioca que ele não conhecia. Estranho!

                                                                   
                - Vicente, passei  a vir de São Luis para cá  desde que comecei a ter grana sobrando. Como você sabe ganho bem mais de vinte e três mil por mês – falou com orgulho,  fitando Vicente de cima para baixo.  No começo dessas festas achava tudo uma grande tolice, um bando de panacas enfeitados, mas acabei me acostumando. A gente se acostuma, não é?
                Vicente  teve um pressentimento.
                - Toma mais um gole, Solinei. Brindemos à felicidade!
                - A felicidade? Que felicidade, Vicente?
                - Aquela que se pode  comprar, Solinei.
                Solinei  julgou ter entendido :  “ Aquela que eu finjo que compro  todo fim de ano e , agora, ele também”.Levantou de um salto. Vicente se interpôs entre ele e sua intenção. Não foi suficiente: Solinei era mais forte e o empurrou. Vicente chamou os seguranças.  Vicente é que parecia agora nervoso, fora de si.
                - Segurem-no, não o deixem ficar só.
                Os seguranças demoravam a chegar, os  vizinhos acudiram e seguraram Solinei tentando demovê-lo de algo que não sabiam o que era. Vicente  explicou:
                - Ele pode fazer a besteira que quiser, pode até se matar, mas não hoje. Se hoje não conseguiu felicidade  tem dinheiro para comprá-la de novo amanhã, depois  ou o dia que quiser. A minha não, só vale para hoje, custou-me muito  caro e ai de quem me impedir de gozá-la até o fim.  
                                                                                              ewerton.neto@hotmail.com
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sábado, 22 de dezembro de 2012

INSETOS SABOROSOS




“Gosto de grilos, mas recomendo as larvas da mariposa, que são as minhas favoritas. Para insetos mais selvagens prefiro  saborear cupins formigas e gafanhotos”. David Gordon, biólogo

                Recente reportagem da revista Superinteressante oferece sete razões para comer insetos. Entre elas estão energia, economia, limpeza ( o nojo que você sente é relativo) etc.O cientista acima citado, escreveu, inclusive um livro com suas receitas de insetos mais apreciadas, que está fazendo muito sucesso em restaurantes chiques. 
                Se muita gente torce o nariz para tal preferência,  nada como conhecer alguns deles (e outros artrópodes) quando mais não seja para acrescentar mais uma oitava razão para gostar de comê-los: vingança.  A maioria deles  acha muito saborosa a carne humana.

1. Escaravelho. Muita gente o conhece como besouro, mas existem diferenças. A primeira é que estes são muito mais pesados e voam de maneira muito barulhenta e desengonçada.  (Imagine um trio elétrico querendo voar).  O mais forte deles, chamado de Hercules consegue levantar 850 vezes o próprio peso, o que é raro no reino animal. Se você é halterofilista e ficou empolgado com esse desempenho, hesite um pouco antes de seguir sua dieta de robustez, à base de fezes e porcarias. Não confunda: Escaravelho é escaravelho e não escarra-em-velho, como certos halterofilistas, bombados  e mal-educados.

2. Barata. Se você é daqueles que morre de medo de barata agradeça a Deus pela sua sorte. Das 4 mil espécies que existem no mundo apenas 1% vivem ao seu redor. Portanto, pode respirar aliviado, coisa que, aliás, a coitada tenta fazer quando, prestes a morrer,  fica de barriga para cima. Ao contrário do que você pensa  ela não está gozando de sua cara ridicularizando sua ‘imortal’ incompetência em matá-la, mas só está  tentando respirar melhor antes de morrer.  Isso é raro, mas, às vezes, acontece.

3. Viúva Negra. É a aranha mais famosa que existe (virou até atriz de cinema), mas tanta fama não provêm apenas  da sua cor, como também do fato de comer (literalmente ) o macho depois do ato sexual. Como todo mundo sabe entre as aranhas e as  mulheres existe muita coisa em comum, mas, quanto a esse talento é necessário diferenciar as fêmeas humanas:  estas, quando muito, depois que comem os machos, os deixam completamente lisos -  não chegam a devorá-los.

                                                                

4. O Tatuzinho de Quintal. Coitado do tatuzinho de quintal! Ninguém dá bola para ele , embora também seja... Um Tatu-Bola. Todo mundo que cuida de jardim já os percebeu, enroladinhos, como uma bola. Os coitadinhos – que fazer? - se enrolam assim para se proteger, perder menos água, manter o abdome úmido e poder respirar. Têm no máximo 3 cm. e, agora, depois que o Tatu-Bola foi promovido a símbolo da Copa, estão mais encolhidinhos ainda. É que não engoliram tanta discriminação só porque são escurinhos, tímidos e menores. Ah, como o tatuzinho de quintal gostaria que as cotas que os políticos brasileiros inventam fossem para todos os animais e não apenas para poucos (humanos ) privilegiados!

5. Escorpião. O escorpião é um bicho raivoso e perigoso. O nome já diz tudo já que, ao invés de ter um corpão, têm o que poderia perfeitamente se chamar corpião, ou seja, na parte de trás do abdome uma espécie de cauda com um ferrão que pode matar uma criança em poucas horas. Bote horroroso nisso!
Sem essa, porém, de que os escorpiões se matam quando estão rodeados de fogo. O que acontece é que eles perdem água  muito rápido,  o que os faz contorcerem-se. Portanto, essa é mais uma lenda  do mundo dos homens aplicada aos bichos.  Comprovadamente, o único animal que se mata – não com fogo, mas quando está de fogo – é o homem, pelas ruas e estradas da vida.

6.  A craca. Eis aí um  ser vivo muito esquisito. (Parece até o trânsito de São Luis, já que nunca sai do lugar). Desde que nasce se fixa numa rocha ou num pedaço de madeira e aí fica. O negócio dela  é não ser perturbada, tanto assim que , não satisfeita em se isolar totalmente, ainda enche de cimento em volta de si para evitar qualquer possibilidade de aproximação. Vai querer exclusividade assim...Não no raio que os parta, mas numa pedra – que um raio nunca vai partir.
Essa vocação, de não querer aproximação de ninguém, às vezes  faz lembrar o atendimento atual da Caixa Econômica, onde colocaram paredes de vidro opacas para não ofender seus caixas com a visão dos clientes. Como a Caixa Econômica Federal, que é de todos os brasileiros, resolveu patrocinar um único time de São Paulo, o  Corintians,  despejando milhões de reais suados de seus contribuinte nas mãos de um grupo privilegiado de jogadores de futebol, faz desconfiar que para os lados de sua gerência  estão  confundindo alhos com bugalhos. Ou melhor, cracas com craques.
                                                                                              ewerton.neto@hotmail.com
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sábado, 15 de dezembro de 2012

CAMPEÃO SIM, MELHOR NÃO


Artigo publicado, hoje, sábado,  na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal O estado do Maranhão



No futebol, esse esporte tão fascinante quanto imprevisível, em que o campeão nem sempre é o melhor (muita gente se esquece disso) o que é melhor: ser o campeão ou ser o melhor?
O bom, evidentemente, é ser, além de melhor, campeão. Isso, infelizmente,  não é para todo mundo. Em termos internacionais assim já foi o Santos de Pelé, o Barcelona, de Messi, a Seleção Brasileira de 58, 62, 70 e 98. Outros times ou seleções maravilhosas não conseguiram ser campeões: a Hungria de Puskas em 54, a Holanda de Cruyff em 74, a seleção brasileira de 82. Assim também grandes jogadores como Di Stefano, Zico, Platini etc. jamais conseguiram ser campeões do mundo, mas jamais serão esquecidos, muito pelo contrário. A história sempre se lembrará deles, bem mais até do que daqueles que foram simplesmente campeões.
De algum tempo para cá, desde quando se  implementou no futebol brasileiro a filosofia, hoje predominante, do futebol de resultados somou-se a essa visão futebolística um apêndice que ganha contornos cada vez mais epidêmicos: a exaltação da torcida como personagem. Na prática, times de grande torcida, incapazes de formar times de craques passam a ser fanatizados (com o suporte escancarado e oportunista da mídia – principalmente da rede Globo)  não pelo que seus jogadores executam dentro de campo, mas pelo que acontece fora dele. Assim, ao invés de um time ser idolatrado pelo seu plantel de craques, passa a ser exaltado por causa de sua  imensa torcida e, com isso, degenera-se  o que de melhor  deveria ser buscado no espetáculo esportivo, em favor da relevância a aspectos comezinhos e peculiares ao anti-futebol : a supervalorização da ‘raça’ de jogadores sem talento, o amor à camisa (?), torcida com poderes para levantar o time ( como se isso fosse possível ), paixão descomunal , etc. Ou seja , do bom futebol cada vez menos se fala. 
                                                     

De repente, por exemplo, a marcha atual do Coríntians, o time brasileiro de maior torcida no Sul do país, em busca de um título mundial é propagada insistentemente pela mídia como se estivéssemos diante das seleções brasileiras  dos bons tempos, capazes de arrebatar pelo entusiasmo uma nação inteira (igual cobertura televisiva, jamais foi concedida à trajetória de outros times, como São Paulo, Inter, e, mais recentemente, o Santos).  Tal ‘exagero’ seria concebível se permanecesse restrito ao interesse financeiro; imoral, mas compreensível se pensarmos no quanto uma empresa que monopoliza o destino do futebol no Brasil, como a rede Globo, investe nesses times para auferir a contrapartida do lucro.
O lastimável, porém, para o futebol como esporte, é que isso implica, necessariamente, um preconceito contra os times de menor torcida. Quando se propaga que “amar o Coríntians é um gostar diferenciado”, além de se forjar um embuste, falta-se com a verdade. É fácil raciocinar.  Que paixão de torcedor  é maior, a daquele que, Maria vai com as outras, prefere torcer por um time badalado  e rico, ou a daquele que, contra tudo e todos,  torce, por um time pequeno, sujeitando-se a se divertir ou sofrer com as potenciais agruras de um  time que não tem espaço na imprensa e é constantemente vilipendiado, em suas conquistas, pela arbitragem tendenciosa por este Brasil afora? Quem torce mais pelo seu time, o torcedor do Coríntians ou o da Portuguesa Desportos? Arrisco-me a dizer que, na pior hipótese ambos são torcedores do mesmo quilate e  deveriam ser respeitados igualmente pela mídia, proporcionalmente às suas paixões equivalentes.
(Antecipando-me ao risco de que possa haver da parte do leitor uma interpretação equivocada do que está sendo tratado,  apresso-me a enfatizar que o objetivo desta reflexão não é desprestigiar  o amor de um torcedor pelo seu time de imensa torcida – e, quiçá sua ‘obsessão’ em torno disso -  mas a de ser um humilde alerta para que essa anomalia não seja aproveitada como moeda de troca, por políticos e empresários oportunistas, em desfavor dos próprios torcedores. Como todos sabem isso aconteceu no recente episódio em que um estádio caríssimo foi doado pelo Estado ao Coríntians, às custas do dinheiro do contribuinte sob a alegação de que assim se estaria se satisfazendo a vontade popular.  Quando corrompe-se a verdade das relações torcida x time x sociedade com objetivos escusos,  nem mesmo os torcedores do próprio time beneficiado  saem ganhando. )
Lembrando  mais uma vez que o que diferencia um time do outro dentro de campo  não é fato de dispor de maior torcida,  mas o que é capaz de mostrar em cima do gramado, sobretudo em termos de qualidade futebolística , torçamos para que neste fim de semana, finalmente,  o Coríntians Paulista possa mostrar aos seus torcedores e a todo Mundo , um futebol digno das glórias que fizeram a admiração do futebol brasileiro. Como disse o jornalista Juca Kfoury – que, por sinal, é corintiano – domingo sairá obrigatoriamente  o campeão do mundo. Não necessariamente, o melhor.
                                                                              ewerton.neto@hotmail.com                                                                                                  http://www.joseewertonneto.blogspot.com

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

GENTE 80 X 20



artigo publicado na seção Hoje é dia de...Caderno Alternativo,
jornal o Estado do Maranhão, sábado


Gente 3 x 4. Esse é o título da seção de última página de uma revista dedicada a descrever características da personalidade de celebridades. Com mais freqüência  atores de tevê quando considerados, com bastante exagero, jovens, bonitos ou  talentosos.
Gente 80 x 20. Poderia ser o título de uma seção parecida, porém, dedicada a celebridades femininas, nem tão jovens, muito pelo contrário. Estas são com extraordinária freqüência: peruas, carcomidas, arrogantes, deslumbradas e pretensiosas. São elas: Suzana Vieira, Ana Maria Braga, Maitê Proença, Cristiana Oliveira, agora Arlete Sales... ETC.  Distinguem-se por andarem sempre com um “namorado” jovem, se é que podemos chamar assim, do lado.  São tão parecidas em personalidade que a de uma vale para todas. 80 é a idade de cada uma, 20  a do “namorado”.
                Idade: “Uma mulher capaz de dizer a própria idade é capaz de tudo”, Oscar Wilde
                Local de nascimento: Faz tanto tempo que já esqueceu.
                Altura: 1,65m ( sendo vinte, do salto do sapato)
                Peso: 54 kilos (sem contar os 15 de botox)
Maior qualidade: Força de vontade – para arranjar namorado novo.
A característica que acha mais importante para uma mulher na sua idade: ter um guarda-costas.

                                                                

Sua atividade favorita é: não pensar
Quem você gostaria de ser se não fosse você mesmo: Aquela que aparece nas suas fotos com a ajuda do photoshop
Qual a sua viagem preferida: qualquer uma que não seja a que fará muito em breve,  num caixão de defunto.
Qual a sua cor favorita. Depende da meia-luz e da cueca que o gigolô estiver usando.
Um  super-poder que gostaria de ter: Viajar no tempo.
Para onde: para a época em que podia se olhar no espelho sem sair correndo.
Momento preferido do dia: Aquele em que à custa de muita pintura e força- de - vontade conseguiu esconder os vestígios da noite passada.
No que pensa quando acorda: “Meu Deus, já são vinte horas”.
Uma flor: a do vestido do réveillon.

Um animal: o gigolô cachorro. (Não confundir com o cachorro do gigolô.)
Do que não gosta no próprio  corpo:  O esqueleto, porque não dá para fazer plástica.                                                
                                                                ewerton.neto@hotmail.com
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sábado, 1 de dezembro de 2012

VÁ SE FODER!




Artigo publicado na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal O Estado do Maranhão



“ O pior palavrão vira pó e palha. Diante de um canalha.”

                Agora é científico. Estudo afirma que falar palavrões, ajuda resistir à dor física. Ou seja, um puta que o pariu!, um vá se f...!,ou um filho de uma égua!,  ao invés de serem obscenidades são, nada mais nada menos, que recursos postos pela evolução  à serviço do ser humano, para que este descarregue suas frustrações e sofra menos, inclusive fisicamente.
                Tal estudo foi desenvolvido pela Escola de Psicologia da Universidade de Keele, na Inglaterra e publicado pela revista especializada NeuroReport, ano passado concluindo que não há nada como um bom palavrão para amenizar a dor .
                Essa notícia é deveras alvissareira, principalmente por aqui, onde recentemente foi noticiado que nos hospitais falta remédio para socorrer os doentes.  Fico imaginando um sujeito,  morto de dor, chegando ao Socorrão e o médico de plantão,  já inteirado da nova descoberta, receitando.
                - Se não tem remédio, enfermeira, mande  ele xingar .
                - Xingar o quê?
                - Ora, mande  ele xingar qualquer coisa: Deus, o  mundo,  o juiz de futebol,  o mais alto que puder.
                O doente, claro, não se faz de rogado
                - Médico filho da puta! Enfermeira piranha! Hospital de merda!
                O  doutor,  impassível,  a tudo  fica escutando, calmamente.
                - Doutor, ele não para de xingar! – diz a auxiliar.
                - Deixe-o à vontade.  Quanto mais ele xingar, melhor.
                Finalmente, o doente cansa. O médico, com ar vitorioso, pergunta para a enfermeira. 
                - E agora, enfermeira, como está o nosso doente?
                - Ele diz que a dor aliviou.           
                - Eu não disse? Chame o próximo.


2. Os médicos terão de se especializar nisso cada vez mais. Aos poucos haverão de surgir  os  mais talentosos, ou seja,  aqueles capazes de receitar o palavrão mais apropriado para cada tipo de dor. Ao invés de Novalgina: sacana sem-vergonha!, ao invés de Buscopan:  cadela vagabunda!, ao invés de Atroveran: corno safado!.  O médico dos hospitais públicos, principalmente, terá de evoluir para ser um profissional  com  alta dose de psicologia para obter, sempre,  a melhor resposta para o sofrimento. Imagine a economia  que o Ministério de Saúde terá com isso! Imagine  a alegria dos corruptos com a sobra! 
 Um problema surgirá, no entanto. Como é fácil constatar, os xingamentos, com o tempo, tendem a se tornar inócuos, ou seja, com prazo de validade vencido.  Quem ainda se julga ofendido ao ser chamado de Sacana? Qual a mulher que reage negativamente, como antes, ao ser chamada de puta? (Esta semana, a idolatrada  Ivete Sangalo , proclamou, muito orgulhosa na revista Playboy  ,  que toda mulher tem que ser uma quenga). Qual o mandatário  que se ofende hoje ao ser chamado de corrupto canalha se, pouco tempo depois, o próprio povo o reelege? O problema com esse tipo de remédio é que, de repente, pode ser necessária  uma alta dosagem. Novos xingamentos precisariam ser inventados, mas, como?  
                                                       
                                                          
3.Pensando bem, acho que a solução poderá vir dos anti-palavrões.  Mas o que seria um anti-palavrão? Justamente, o que se convencionou se chamar – em tempos muito remotos - de virtudes. Deu para entender? O que ofende mais alguém hoje em dia: ser chamado de cafageste ou de humilde? De sacana ou de honesto? De corrupto ou de pobre? De santa ou de puta? (Basta entrar nas redes sociais virtuais para constatar a multidão  de meninas  de treze anos,  reclamando de bullyng nas escolas por terem  sido chamadas, pejorativamente,  de virgens). Ser um glorioso sacana, por sua vez,  é o auge da reputação que um homem respeitado pode desejar : seja ele um caminhoneiro ou um freqüentador das colunas sociais.   
Enfim, bastaria  atualizar a palavra ofensiva e  xingar à vontade: o que interessa é que a ofensa seja capaz de ofender  alguém  na medida certa. Para aliviar a própria dor.
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