domingo, 12 de setembro de 2010

A ARTE FEMININA DE FAZER UNHAS

Artigo publicado no jornal O Estado do Maranhão,
seção Hoje é dia de...Caderno Alternativo

A ARTE FEMININA DE FAZER UNHAS


José Ewerton Neto, membro da AML

ewerton.neto@hotmail.com




O ser humano, se desenvolveu inteligência suficiente para criar invenções que facilitam sua vida, não as desenvolveu suficientemente a ponto de não deixa-las à mercê dos seus primitivos instintos de fera boçal, o que nos faz duvidar de que, afinal de contas, estas tenham lhe trazido tanto lucro assim.
Se inventou a televisão, inventou também o Faustão e o Big-Brother. Se inventou o carro, inventou também a barreira eletrônica e o maníaco do volante. Se inventou o avião, inventou a fila de espera da bagagem. Se inventou o som eletrônico, inventou também o som automotivo e o estúpido que o propaga. Enfim, será que valeu a pena?
De todas as invenções, contudo, uma existe que, de tão singular e rotineira, nem se sabe mesmo se foi invenção: a arte (se é que podemos chamar assim ) feminina de fazer unhas.
“Será arte, será arte?” pergunta-se o poeta Ferreira Gullar em um dos seus poemas. Não consigo responder precisamente, o que sei é que até agora não surgiu nenhum especialista para explicar a razão pela qual mulheres e mais mulheres se dedicam com tanto afinco, emoção, regozijo, fidelidade, paciência, perseverança etc a uma tarefa que para os homens não passaria – se a executassem com a mesma galhardia - de uma aporrinhação inútil e incompreensível.
E olha que, recentemente uma enxurrada de livros se dedicaram a explicar as diferenças, nem sempre contornáveis, entre o macho e a fêmea, desenvolvidas ao longo de milhares de anos de evolução. Através desses livros “Os homens são de Marte, As mulheres são de Vênus”, “Porque as mulheres fazem amor e os homens fazem Sexo”, etc. conseguimos descobrir que a imposição evolutiva explica porque as mulheres são interesseiras e os homens infiéis; porque as mulheres conseguem fazer duas ou três coisas ao mesmo tempo e o homem apenas uma (no mais das vezes, nenhuma); porque as mães são mais apegadas aos filhos do que os pais e por aí vai.
Só não explica é porque a mulher desenvolveu com tanto carinho e dedicação a esquizofrênica (pelo menos, para nós) arte de fazer unhas. Calma, não estou dizendo que não possa haver por trás uma razão bastante compreensível, se observada pelo ângulo da higiene e da estética, mas, sobretudo – e aí é que se inaugura a dificuldade em entender – o que não se explica é o porquê da necessidade de fazer desse ato um ritual quase religioso, uma obrigação tão primordial e imprescindível.
Sim, porque para a maioria das mulheres fazer unha é mais importante do que ler um livro, ir ao cinema ou à missa e levar o filho ao colégio. Muitas mulheres deixam de comer para fazer unhas, sendo capazes até de perder um bom programa com o parceiro por causa disso. Pode-se dizer que fazer unha está para uma mulher como discutir futebol está para um homem com a diferença que, de uns cinco anos para cá, muitas mulheres se imbuíram da mesma fascinação que os homens têm pelo futebol ao passo que, nenhum homem, apesar da velocidade do processo evolutivo que os unifica cada vez mais (infelizmente, diga-se de passagem) , passou a se extasiar com o ato de fazer unhas.
Podemos até nos dar ao direito de especular, recorrendo à imaginação, a uma potencial visão familiar nos tempos ancestrais: os machos ao longe, no meio da mata, atrás de caça, enquanto as fêmeas, famintas e prenhas, os aguardavam numa caverna, cansadas, estressadas, aporrinhadas e sem ter o que fazer... E as unhas, enormes, ali, em frente, à disposição. Se elas fossem machos poderiam coçar o saco, talvez, para se distraírem, mas...elas não tem saco. Heureca! Como ninguém antes havia pensado nisso? Será que essa não seria a grande explicação? Será que não foi daí que tudo começou? Milhares e milhares de anos coçando as unhas, esperando nervosas por comida e sexo, escutando apenas a música dos ganidos estridentes dos macaquitos, até que...
A sensibilidade feminina teria feito o resto. Lentamente, elas teriam aprimorado a primitiva e instintiva coçação até chegar a... Pouco a pouco, passando a toldar suas unhas proeminentes, acariciando-as, confinando-as e moldando-as. Bote o tempo disponível de uma infinidade de anos, bote uma religiosidade latente, quase sagrada, um conformismo atávico, um poder de concentração especial e a compunção peculiar do sexo feminino pelas coisas menores bem feitas e... Pronto! Estaríamos diante da grande explicação. A falta de saco para coçar, talvez...
Talvez? Que me perdoem as mulheres por esta especulação ingênua e sem base científica. O paralelo disso seria admitir que caso os machos fossem tão sensíveis quanto suas fêmeas, hoje eles estariam se dedicando à arte de “fazer sacos”, dourando-os, enfeitando-os, mostrando-os uns para os outros e dizendo : “Cara, já viu que enfeite cor-de-rosa com formato de lua coloquei no saco?” E ficariam ofendidos caso suas esposas e namoradas nada percebessem. Haveria revistas e mais revistas intituladas “Fazer Saco” para os homens (assim como as centenas que se vendem dedicadas às unhas femininas - e que a maioria dos homens sequer imagina que existem) e estes passariam suas duas mais preciosas horas de folga semanais enfeitando sacos, ao invés de ficarem discutindo futebol.
Dá para aceitar isso? Tem lógica? Antes que seja tarde, façamos urgentemente de conta que não. Nada de nada. Não resta dúvida, o apressado cronista, como um inconseqüente, invadiu um terreno que não é de sua competência. Ele que vá fazer crônica sobre assuntos de sua alçada como futebol, que vá especular sobre o humor de Dunga ou de Felipão, que vá caçar problemas e que deixe a mulher e sua arte de fazer unhas em paz.
Melhor recorrer, para solucionar de vez essa questão em má hora levantada, mais uma vez ao bardo inglês Shakespeare, e tomando sua frase como alegoria, aceitar que existem mais mistérios entre o a mulher e o que fazem do que sonha a vã inteligência humana. Incompreensíveis ao coitado do Darwin! Ininteligíveis a Deus.

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