O estado do Maranhão, hoje, sábado
Todo brasileiro, mais cedo ou mais tarde, dá uma de entendedor
de futebol ou de cinema. Por isso, peço que me perdoem a ousadia de tentar
selecionar a mais bela cena dos filmes
que já assisti sem ser crítico de arte ou especialista no assunto.
Já vi cenas antológicas em cinema,
algumas muito conhecidas e compartilhadas com o deslumbramento da maioria,
outras, nem tanto, por isso julgo que seja necessário explicar antes de tudo o
que, para mim, seria uma bela cena.
Uma bela cena, certamente, não seria
motivada pela paisagem ( porque aí seria fotografia); uma bela frase ( porque
aí seria poesia) uma bela mulher ( porque aí seria vida), nem mesmo a junção
dessas motivações, porque aí seria apenas o belo, simplesmente. Uma bela cena, sempre
difícil de definir, seria aquela que transcendesse a percepção de beleza
propriamente dita e que nos remetesse, através da emoção, à sensação de que
existe um intraduzível algo mais, um sentimento que extravasasse o
aprisionamento aos limites da condição humana para tanger algo de mais além e
sublime.
A meu ver nenhuma memorável cena de
filme, sempre mencionadas pelos críticos e admiradores (a corrida de bigas do
filme Bem-Hur, a despedida do E.T. no filme do mesmo nome, etc. etc.) supera em
tocante representatividade a cena
fundamental – para mim – passada no
excelente filme do diretor polonês Roman Polanski “ O Bebê de Rosemary” vivida
pela atriz Mia Farrow. Tento resumir:
“A mãe, grávida, tenta livrar seu filho
da terrível sina que reservaram para ele: tornar-se a reencarnação do próprio
Satanás. De início, a revelação surge como uma pequena suspeita que, aos
poucos, vai se avolumando numa seqüência aterrorizante. Ela se descobre vítima
de uma conspiração em que estão envolvidas justamente as pessoas em quem ela
mais confia e que poderiam ajudá-la. Seus vizinhos, seus amigos, seu médico e,
por fim, seu próprio marido e pai da criança. Aniquilada e enfraquecida pela
progressão da gravidez, ela se vê cada vez mais impotente para confrontar a
dolorosa confirmação da suspeita que a atordoa. Ao final, enfraquecida, tomba
no meio da rua e entra em trabalho de parto. Ao despertar, escuta o som do
grito de uma criança em meio à noite de trevas. Percebe que é a voz de seu
filho, seu primeiro filho. Trôpega e esperançosa caminha até o berço. Com
dificuldade dele se acerca até que, quando levanta o véu que o cobre , sofre um
impacto. Lá não está uma criança, mas uma horripilante figura: um monstro, uma
mistura de lobo e gato; o Satanás. Não pode evitar um gesto de horror enquanto
contempla a figura hedionda que se agita e chora no berço clamando pelo seu
aconchego de mãe. Apesar de tudo, é seu filho, então, inconsciente e débil, mas
seguindo seu impulso toma a decisão. Vence o sentimento de repulsa, segura o
pequeno monstro como a qualquer bebê frágil e o
embala. Canta uma canção de ninar que perdura por muito tempo depois em
nossos ouvidos como um emblema da vitória da mãe, do sentimento de mãe contra
todo o horror que possa existir no destino humano e nos mistérios entre o céu e
a terra.”
Nesta véspera do Dia das Mães, ao
recordar esta cena, recorro ao talento
do cineasta Roman Polanski para homenagear o amor materno: o único capaz de transcender
a tudo: desde o mal que existe dentro e fora de nós mesmos, até o silêncio
pungente - de ausência - que perdura no coração daqueles que já não as têm.
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