sábado, 5 de maio de 2012

ENTRE O PROVINCIANISMO E O CAOS


artigo publicado, hoje, sábado,
na seção Hoje é dia de...Caderno Alternativo, jornal O Estado do Maranhão


400 anos, mais de um milhão de habitantes. Com essa idade e essa população já era tempo de a cidade almejar ser incluída na categoria metrópole. O que lhe falta? Recursos  tem para isso: tamanho, beleza natural, recursos financeiros. Mas, ao que tudo indica, lhe custa desgarrar-se do espírito de província associado ao caos urbano, que reina em toda metrópole que não se cuida.
            Teria uma coisa a ver com outra: essa incapacidade de superar o caos anunciado pelo crescimento e que se manifesta na desordem do trânsito e na falta de segurança, cada vez maior? O dilema ser ou não ser metrópole, eis a questão, no caso sanluizense, parece esbarrar além da carência histórica de bons planejadores em sua administração, nas atitudes comezinhas de sua sociedade, transparentes até nos aspectos mais vulgares do cotidiano. Vejamos algumas dessas manifestações:

1.                 Existe algo mais provinciano do que a mania, tão corriqueira em nossa  sociedade dita “vip”,  de, depois de acomodarem seus traseiros em aviões de rota internacional – muitas vezes na classe econômica –, assim que chegam por aqui, correrem  para as colunas sociais dos jornais a fim de colocarem suas fotos em locais e praças manjadíssimas dos Estados Unidos e da Europa – América Latina também serve - como se tivessem aterrissado  num planeta distante,  de outra galáxia?
            O mais grotesco nessa história é o sorriso orgulhoso e embevecido dessas pessoas, crentes de que estão realizando um grande feito quando, em metrópoles de fato, isso há muito tempo deixou de ser notícia, de tão banal que é. (Como todos sabem, em tempos de globalização qualquer trabalhador de empresa multinacional  viaja cinco a dez vezes por ano ao exterior, sem que as páginas dos jornais se abarrotem de fotos de suas empreitadas).
            Houve tempo em que se  considerava chique, por aqui, viajar para o Rio de Janeiro.  Ridicularizava-se, então,  a maneira de falar puxando pelo s,  imitando os cariocas, que era empregada pelos nossos exibicionistas assim que  voltavam de lá. Tudo leva a crer que serão necessários mais 400 anos para que os daqui possam aprender que fariam  muito melhor se registrassem, para deleite de si mesmos e de sua futura memória,  as belezas naturais maranhenses: as dunas de Barreirinhas, as praias dos Lençóis e do Saçoitá etc.,  que, inclusive, fazem  o deslumbramento de estrangeiros, cuja finalidade turística principal é se divertir e não se exibir.  


                                                                         

2.                 Outra mania tacanha da terrinha é a badalação em torno de um grande local/acontecimento que, obrigatoriamente, tem de estar repleto de gente. Quando acontece de a mídia privilegiar um  local desses, para lá corre todo mundo, como uma horda que não tem o que fazer nem o que pensar. (Sobra até para inauguração de shopping-center!). Lá estarão por dias e dias  as mesmas pessoas, os mesmos rostos, a mesma disposição em torno de uma badalação cada vez mais insípida até que o falso prazer se esvaece por excesso e inanição. O evento é logo substituído por outro, depois outro, sempre um só. A medida de sucesso empregada, ao contrário da  performance de um eventual artista; do ambiente agradável ou da paisagem desfrutada é sempre a “o volume de gente que estava presente”. Tal coisa, típica de cidadezinha, jamais acontece numa verdadeira metrópole quando existe diversidade de opções e multiplicidade de critérios, personalidades e avaliações.

3.                   Outro vício incapaz de desgarrar-se de uma cidade em seus opulentos quatrocentos anos é a de se taxar, com extrema facilidade, personalidades variadas em diferentes atividades como “ Os melhores da cidade”. Assim é que fulano de tal é o melhor cantor de São Luis, Beltrano é o melhor fotógrafo, cicrana  tem o melhor salão de beleza, e outra o melhor vinho . No ramo de medicina então a coisa chega a ser tragicômica. Doutor X é o melhor cardiologista, doutor Y é o melhor ginecologista e a  Doutora Z a melhor “colocadora de botox” da ilha. O pior é que eles mesmos acabam acreditando nisso e haja preço exorbitante na fuça do paciente!
                        Outro dia fui estacionar  o carro no centro da cidade e um guardador de carro se apresentou: “Sou Boca de Chuveiro, o melhor guardador de carro da cidade, portanto...” e apresentou-me um simulacro de tíquete de estacionamento,  arrancado de um pedaço velho de caixa de papelão. Sem permitir que desconfiasse que eu duvidasse de si, por segurança, o cumprimentei: “Meus parabéns”, e puxei as três pilas que me exigia. De adiantamento. 

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