artigo publicado na seção Hoje é dia de...Caderno Alternativo
jornal o Estado do Maranhão, hoje , sábado
13,7
bilhões de anos atrás a temperatura desse troço aqui ( estamos falando do
Universo em que vivemos) era de lascar. Bote bilhões de graus nisso! O único
bebê capaz de nascer numa fornalha dessas
era mesmo o Universo, ainda assim porque
era filho único do seu pai que, por via das dúvidas, vamos chamar de Deus. E
que era mesmo um pai caloroso – e bote calor nisso!
Parece que o bebê – como
todo filho único – era cheio de manias. A primeira brincadeira que esse bebê
complicado teve foi um tal de big-bang. Como todos sabem tem bebê que
brinca de bola, outros brincam de boneca, outros de berrar para aporrinhar os
pais.. Pois Universo entendeu de brincar de big-bang tão logo deu seu primeiro
berro. E que ninguém ouviu - felizmente para os tímpanos.
Certo de que seu pai,
Deus, lhe faria todas as suas vontades
Universo cedo enjoou de brincar de big-bang (numa fração de segundos) e, irado
porque não tinha mais outro brinquedo à sua disposição, logo começou a estufar
de raiva. Voluntarioso e sem motivo algum - ou por isso mesmo - Universo continuou
a estufar e se expandir, a estufar e se
expandir. Quando nasceu era menos do que uma bolinha pequenina, mas no instante seguinte já tinha inchado mais
do que corintiano quando ganha uma taça internacional. Hoje Universo já tem
praticamente 13,7 bilhões de anos-luz, só de barriga.
2. Entender uma criança difícil
assim como Universo requer um pouco de paciência. Um bom psiquiatra logo diria
que o bebê nasceu estressado por ser único e sozinho. Além do mais, seu pai
parece que nunca se importou muito com ele e, desde o começo, deixou-o por
conta das forças do universo o que, convenhamos, é muita coisa para uma criança:
ficar por conta de si, desde o começo. Sem contar que Universo é órfão de mãe e
nunca teve um irmãozinho. Embora muita gente espalhe por aí que existem universos paralelos o coitado do Universo
nunca viu um mais gordo.
Ora, some-se a tudo isso
o fato de até hoje Universo não saber se é criança, jovem, coroa ou idoso,
embora tenha certeza de que nunca será
vovô. (Que bom seria se ele um dia fosse parar numa fila de anciões da loteria,
pelo menos teria certeza de alguma coisa!) O tempo nada significa para ele, assim
como a eternidade e a morte: ele sequer tem
a bendita (ou maldita?) certeza de que vai morrer um dia. A verdade é
que embora não seja um pai desnaturado Deus deixou esse filho abandonado por aí,
e Universo continua bufando e inchando nem ele mesmo sabe por que, como se
tivesse culpa por ter nascido, perdido na sua própria imensidão sem fim.
3. Essas considerações servem para explicar porque um belo dia, Universo,
farto de tanta grandiosidade, pediu a
seu pai, que o permitisse inventar um
minúsculo ser lá para os lados de um minúsculo planetinha de uma galáxia mais
vagabunda ainda. Deus o atendeu, meio a contragosto... E não é que a tal criaturinha começou a viver
e a pensar?
Pois bem, semana
passada, 13,7 bilhões de anos depois, Universo
acordou cutucado por uma dúvida. Andaram lhe dizendo que justamente naquele planetinha
haviam descoberto que a transformação da
energia inicial em matéria – dele, do
Universo - havia passado por um tal de
bóson de Higgs, a quem chamaram partícula de Deus.
“Já estão querendo mexer com minha biografia” pensou Universo e lá se foi se queixar a seu
pai.
- Pai, já estão falando de minha infância.
- Quem?
- Os seres humanos.
- Seres humanos? Quem
são?
- Aquelas criaturinhas que
você me deu para brincar e que vivem naquele
planetinha chamado Terra.
- Não lembro, meu filho.
- Aqueles que tiveram um
dia o desplante de dizer que eram à sua imagem e semelhança. Será verdade o que
eles estão dizendo agora?
- O que desta vez?
- Que descobriram sua
partícula e que agora sabem quase tudo a meu respeito. Pai, eu nunca soube de
onde vim o que eu sou nem para onde vou. Como é que eles...?
-
O que é isso agora, Universo meu?
- Pai, não quero ter a minha infância devassada por
seres assim. Queria que você me autorizasse a destruí-los.
- Ora, para que se
preocupar com criaturinhas tão pequenas? Não perca seu tempo Universo, deixe-os
para lá. Eles mesmos se matarão.
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