segunda-feira, 16 de agosto de 2021

O CHEIRO NOSSO DE CADA DIA


 

“O homem é o  único animal que não gosta do próprio cheiro”, dizia Millor Fernandes, assim resumindo  a solitária diferença que nos distingue dos demais animais. Sim, porque o cérebro maior e mais inteligente não nos distingue tanto assim, já que no resto somos quase iguais.  A ciência mostra que o nível genômico da espécie humana atinge a extraordinária semelhança de 95 a 99 % ao dos chimpanzés.

Resta especular se essa diferença não teria sido provocada pelos humanos apenas como forma de se destacarem dos outros animais. Mais ou menos como se, a partir de determinado momento de sua curta trajetória geológica, os homens resolvessem se perfumar como uma forma de dizer a si mesmos: “Tá vendo? Somos, de fato, superiores aos outros animais, tanto assim que não fedemos como eles.”

A história comprova essa tese, já que somente de pouco tempo para cá, os homens passaram a rejeitar o próprio cheiro. Basta ver como procediam nossos tataravôs em seus ambientes, mesmo os supostamente mais refinados.  

1.A higiene do palácio de Versalhes, por exemplo, no século 17 era de “lascar” para os padrões de hoje. O corpo inteiro das pessoas só era lavado uma vez por ano e para se limpar bastava lavar as mãos e o rosto.  Nessa ocasião a família inteira se banhava no mesmo barril e com a mesma água. A urina era despejada pelas janelas, a limpeza íntima era feita com sabugos de milho ou com as próprias mãos, as necessidades eram feitas em qualquer lugar indo parar nos corredores e jardins. Um decreto de 1715 dizia que as fezes deveriam ser retiradas dos corredores uma vez por semana.

Um pouco mais para longe, na  Roma Antiga,  os banheiros públicos eram frequentados sem distinção de sexo. Nesses espaços não havia preocupação em oferecer material para higiene íntima. As pessoas se viravam com o que estivesse à mão, como água, grama e até areia. E – pasmem! -  era nessas latrinas coletivas, instaladas em grandes barricadas de pedra,  que se promoviam debates, banquetes, e encontros cívicos.

Por aí se vê que o fedor não incomodava.  E que a porcaria que saia pela parte de baixo era mais inofensiva do que a que  hoje sai, pela boca,  dos que se reúnem em ambientes palacianos para tomar   grandes decisões administrativas, perfumados por fora e imundos por dentro, “os sepulcros caiados” de que falava Cristo.

2.Quanto aos outros animais, estes  continuam ‘cagando  e andando’ para o próprio cheiro, o que não significa dizer que sejam menos limpos. A barata, por exemplo, tida como um animal fétido e repulsivo tem o seu exterior extremamente limpo, mais higiênico que o rosto de muita coroa habituê de coluna social, entupido de creme, loção e botox.

A sujeira das baratas, é bom saber, restringe-se ao seu interior, mais exatamente ao seu sistema digestivo. É lá que ficam os vírus e as bactérias que são expelidos em seu cocô e podem causar infecções. Portanto, caro leitor(a),  aproveite a ideia e dê um afetuoso beijo na couraça de uma barata,  que isso não lhe trará problema algum.

Isso leva a acreditar que a tão anunciada substituição dos homens pelas máquinas, prevista para breve, apresentará pelo menos uma vantagem evolutiva. Estas jamais terão nojo do  próprio cheiro.

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