domingo, 31 de julho de 2022

A LOJA QUE VENDIA PAIXÕES


 

A LOJA QUE VENDIA PAIXÕES

José Ewerton Neto

 

Lojas Marisa. Rua Grande. Adentrando a loja poucos hão de perceber a emanação de algo diferente que evola através dos detalhes  arquitetônicos , escadas e plataformas.

É lá que, em meio a recordações o homem pergunta à vendedora: “ Você sabia que aqui houve um cinema?” “Sim, alguém me disse.” Ela responde.  Talvez ele esperasse uma resposta menos óbvia. Sem importar-se com isso e extasiado pela memória continua: “Quantas vezes aqui estive na  adolescência. Aqui vi grandes filmes e grandes artistas. Ben-Hur, Os brutos também amam, Burt Lancaster, Marlon Brando, Sofia Loren...Você conhece Sofia Loren, não?”  “ Com certeza  não, senhor. Quem é?...”

O homem decepciona-se, o deslumbramento que começara a sentir ameaça esvaecer ao entender ser compreensível que ela não sinta nenhum orgulho especial por trabalhar em um local onde viveram tantas belezas, paixões, histórias, sonhos e ilusões. Muito tempo passou, e é óbvio que ela não viveu tanta coisa, talvez seus pais, quem sabe... Súbito, entrando em empatia finalmente com suas recordações a moça  compartilha: “ Olhe ali estão algumas imagens dessa época “

De fato, em relevo junto à parede podem-se ver enormes fotos da época em que a loja era um cinema. O homem transporta-se novamente para o passado e percebe que jamais conseguiria transmitir à sua interlocutora  tantas emoções que ele e tanta gente sentiram. Quem sabe, se ele fosse bem mais jovem e  um bom contador de histórias...

 Então, talvez ele  pudesse convidá-la  para ir ao cinema e ambos adentrariam não nesta Loja Marisa , mas no monumental  Cine Éden do passado. E ambos assistiriam Amor, Sublime Amor, de mãos dadas.

Num gesto brusco o homem  se vira e, dizendo um até logo, que soa mais como um murmúrio,  se vai,  para que ela não perceba  uma lágrima que chega.   

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