domingo, 3 de agosto de 2025

A FELICIDADE ANDA MEIO INFELIZ

ENCONTRO COM A FELICIDADE

José Ewerton Neto  

“E agora? Tem mesmo certeza de que vale a pena ser feliz, caro leitor?...”

 

Felicidade ou morte, ao invés de Independência ou Morte, por exemplo, é o título de um livro de autoajuda de muito sucesso.

Portanto, caro leitor, “Seja feliz ou morra” parece até ordem de alguma autoridade constituída deste país, sob pena de acabar na cadeia ou pagar mais imposto de renda, o que, convenhamos, é ruim, mas ainda é preferível a morrer.

         E agora? Tem mesmo certeza de que vale a pena ser feliz, caro leitor?

 Para resolver essa parada fomos encontrar a Felicidade. Ela própria, em pessoa. Estava pronta para desabafar.

         - Não aguento mais.

         - O quê, precisamente, Dona Felicidade?

         - Tanta gente atrás de mim. Tanta procura, tanta adulação, pensei que isso fosse acabar depois da Pandemia. Essa gente acha que virei o único remédio para as mazelas do mundo. E o pior é que   sequer se dão ao trabalho de querer saber quem sou. 

         - E quem você é?

         - Isso é o que eu gostaria de saber. Todos tentaram explicar em vão: filósofos, religiosos, cientistas...  Se felicidade é isso que todo mundo pensa que eu acabei sendo, desconfio de que eu mesma nunca fui feliz e   jamais serei.

         - Se a Sra. me permite, essa melancolia abate   depressa   pessoas sensíveis como a senhora.

         - Se fosse apenas isso... A questão é que, mesmo sem saber quem sou, de repente, me julgam capaz de resolver todos os problemas do mundo.   Até das mortes. Ora, eu não sou Deus! Definitivamente, estou possessa com tudo isso!

         -Poxa, dona Felicidade! Não sei o que dizer.... Talvez...  Bem, só me resta sugerir...

         - O quê, pelo amor de Deus!

         - Que tal procurar   um analista, Dona Felicidade? Isso pode ser depressão.

         - Jamais! Conheço-os muito bem: eles me usam como se eu fosse vacina. Dizem: “Procurem dona Felicidade, ela resolverá seus problemas”. Ora, para que servem então?

         - Hei de convir que a Sra. tem razão. Só desejaríamos que, pelo menos, a Sra. continuasse feliz, para o bem da humanidade.  Senão...

         - E quem lhe disse que me incomoda ser infeliz? Acredite, com tanta gente falando asneira a meu respeito, até que gostaria de ser infeliz, só para que me deixassem em paz, compreende? Estou prestes até a adotar um lema para mim: Infelicidade ou morte!

 

 

quinta-feira, 31 de julho de 2025

SOBRE UM POETA


 

SOBRE FRUTO FARPADO, de Kyssian Castro

José Ewerton Neto

 

...”É esse tipo de sensação que Fruto Farpado, de Kissian Castro,  nos provoca”...

 

Comentar ou fazer a apresentação de uma obra de arte requer para o sucesso   pleno dessa tarefa que algumas peculiaridades intrínsecas a essa obra sejam apontadas o que nem sempre é possível dada a abrangência e a intensidade de tudo o que se   publicou e se publica. Como seria bom poder dizer diante de uma obra que “Sim, há algo de novo, jamais dantes visto   sob o sol!”

Sobre essa dificuldade Gilberto Mendonça Teles em Retórica do Silêncio esclarece a distinção entre a crítica e o prefácio: (...) Produzido a partir da obra prefaciada, o texto do prefácio não parece, à primeira vista, diferenciar-se do texto de crítica literária: ambos são formas de metalinguagem, fazendo da obra literária ou não a sua linguagem-objeto. Existem, no entanto, diferenças relevantes entre as duas formas. E o próprio lugar do prefácio tem muito a ver com isso: rigorosamente falando ele não é feito para ser publicado fora do livro,   como se dá com o texto crítico: o seu lugar é dentro,  guardando relações de contiguidade metonímica com o texto principal, a que remete, num contato bastante íntimo, principalmente de conteúdo, a ponto de o prefácio às vezes não passar de mera síntese e funcionar apenas como um aperitivo, isto é um beberete destinado a abrir, despertar o apetite do leitor. (...)  

Pois esse “beberete”, no caso de tantos livros (e especificamente deste   Fruto Farpado de Kissisan Castro)  é facilitado, no  meu modo de ver,  primeiro pelo deslumbramento diante daquilo que se lê, vindo somente a seguir, a percepção de haver descoberto o que há de original na obra, a ponto de se sentir desperto por sensações inusitadas “Fascina-me em particular a forma de crítica que tenta descobrir um segredo não praticado antes por nenhum outro observador”.  Charles Rouen, músico e crítico literário.

No caso de Fruto Farpado, a mim ofertado pelo poeta, poupo-me ao trabalho de expressar a sedução que surge diante de versos como esses a seguir.... Como não ser arrebatado por vozes que dizem!   

(...) procurar as palavras para lhes dar nomes... / palavras colhidas  na fúria  de palavras sem ideias ...Chegar antes das ideias.   Bouchetiana.

Ou em Gravata (...). Há um poema em volta de mim, na minha cola.  Afoito,  evito aquilo que depois se joga fora.

Ou em Peso

O apuro dos gritos mastiga meu sono/ e estou só.../ amparado por esse verso mínimo, quase palavra.

Essas vozes destacadas do conjunto é que distinguem a poesia de Kissian do que comumente se vê em tantos trabalhos. Quando certas vozes não soam tão vibrantes a ponto de brilharem como independentes de sua aparente missão de serem coerentes com o título e o   conjunto, surgem para o leitor, especialmente aquele menos afeito ao traquejo poético, como contradições que tendem ao hermetismo e ao incompreensível. Não se trata aqui apenas da ambiguidade que é própria do exercício poético, ou ao uso de metáforas peculiares ao gênero, são vozes que no caso dessas poetas buscam explicação porque caíram fora do silêncio que há entre a palavra e seu significado, enfim, porque, no caso, o poeta não conseguiu ser senhor desse silêncio que, durante a leitura, tanto pertence ao leitor como ao autor quando estão em sintonia.  

A literatura verdadeira é aquela que se sabe essencialmente linguagem, é aquela procura de um estado intermediário entre as coisas e a palavra, é aquela tensão de uma consciência que é ao mesmo tempo levada e limitada pelas palavras, que dispõem através delas de um poder ao mesmo tempo absoluto e improvável “ Roland Barthes.

O poema inicial que dá título ao livro, por exemplo, já anuncia esse traço da poética de Kissian. A ambiguidade necessária a todo poema não é explícita, mas sugerida, e não surge no todo monolítico ou através de um título capaz de explicar sua presença na arquitetura do poema. Tem significados intencionais ao pertencimento do autor, mas estão disponíveis ao leitor para serem capturados.

(...) o tempo me apalpa cavando fundo/ contudo ergo a cabeça e o  azul banha meus olhos.

Assim, Kyssian não é o poeta dos devaneios, das metáforas e dos sonhos, mas da realidade nua, crua e plural que se nutre de uma ambiguidade, como sabemos, própria do sentido de vida humano e de suas perguntas e repostas não equacionáveis -  que se interpenetram nos edifícios da realidade. Como se fosse Kyssian Castro um poeta dotado de lâminas-vivas em forma de versos para duelar nessa proximidade, que não é a arena da realidade e sequer dos devaneios. Kyssian foge desses extremos para brandir poemas que pairam em torno da verossimilhança de quem não busca a beleza escancarada e fotográfica, mas a beleza que há no silêncio das coisas.

Poeta não é o que fala em verso sobre as flores, os animais da terra, as aves do ar, os peixes, as águas, os capacetes dourados das nuvens ao por do sol. Poeta é o que expressa, através da palavra as imagens do mundo, exterior e objetivo, alteradas quando se internalizam no mundo interior e subjetivo de cada homem, dando-nos uma terceira visão dessas imagens: a visão mágica da realidade. ”  César Leal

Que alegria então em haurir a palavra do poeta, em sonhar com ele, em acreditar naquilo que ele diz, em viver no mundo que nos oferece, ao colocar o mundo sob o signo do objeto, de uma fruta do mundo, de uma flor do mundo! Gaston Bachelard .

É esse tipo de sensação que Fruto Farpado, de Kissian Castro,  nos provoca.

 

                                                                                   José Ewerton Neto é romancista, poeta e membro da Academia Maranhense de Letras.

segunda-feira, 30 de junho de 2025

segunda-feira, 23 de junho de 2025

MOÇA COM BRINCO DE PÉROLA


“ Um dia uma folha me bateu nos cílios. Achei Deus de uma grande delicadeza. ”  Clarice Lispector.

 

MOÇA COM BRINCO DE PÉROLA é o retrato de uma camponesa pintada por Vermeer e se considera um dos seus mais célebres quadros. A pintura nos comove por vários motivos, mas nenhum deles   avança   em direção ao reino das impressões indescritíveis (que todos temos) em velocidade maior do que a delicadeza que emana de todo o quadro.

A mulher não tem um rosto de beleza extraordinária, talvez nem possa ser chamada de bela. O rosto, pequeno, carece de intensidade para chamar a atenção de um olhar desatento. Seus cabelos, cobertos por uma touca, parecem cumprir a obrigação de humildade, coerente com seu destino de moça pobre. No entanto, cabeça virada para trás em direção àquele que a contempla, ela fita demoradamente e continua fitando sem parar como se quisesse contar uma história, a sua história, a história de sua – agora sim extraordinária – delicadeza.

Como contar essa história partindo apenas do seu silêncio e de seu olhar que fita? Como fazer a sua delicadeza mover-se?

A escritora Tracy Chevalier se propôs à primeira parte dessa trajetória quando romanceou Moça com brinco de pérola. São delas as palavras “Quando contemplei o retrato, tentei imaginar o que Vermeer fez a ela para ficar assim, alegre e triste ao mesmo tempo. Um belo dia tive a compulsão de escrever a sua história. Fiz o romance em três dias. O diretor Peter Weber se propôs à segunda.

Os atores principais escalados para o filme foram Scarlet Johansen com Griet (a moça do brinco) e Colin Firth como Vermeer. Não li o livro ainda. No filme a história é de uma serviçal   escolhida pelo pintor para servir-lhe de modelo. A carga de empatia erótico-artística que se estabelece entre ambos provoca a ebulição de sentimentos de ciúme e inveja na esposa e filhos.

Quem nunca leu o livro ou tinha conhecimento do quadro de Vermeer pode ter a sensação de que a história é anterior ao quadro ou posterior, ou independente dele, até mesmo de que é uma ficção, como foi a intenção da escritora. No entanto, para quem conhecia o quadro, a partir da arquitetura montada pelo diretor vê-se que não há independência entre eles. Perdura no filme o mesmo tom de cores esmaecidas, os diálogos silenciosos, onde as expressões dizem mais do que as falas, o sufocante dos sentimentos ocultos e contidos e, predominante a todo instante, a delicadeza em ação através da formidável atuação de Scarlet Johansen como uma espécie de obra de arte ambulante, que sai do quadro e se movimenta ao longo de duas horas de fita.

Quando se diz que não há ficção, isso seria apenas uma força    de expressão, não tivesse o diretor alcançado o objetivo a que se propôs acima, de traduzir para o cinema uma obra de arte anteriormente já traduzida – para o livro. De fato, muitos experts da arte contemporânea hoje falam como se a história romanceada pela escritora tivesse existido realmente. E por que não teria? Que é a sina humana mais que a busca incessante de sufocar a inexorabilidade da morte com a ilusão da eternidade até que isso se torna realidade?

Traduzir o sentimento não dito eis o maior mérito do contador de histórias. Em entrevista o escritor moçambicano Mia Couto disse que o ser humano que não sabe narrar uma história é pobre de alguma maneira. No final do filme de Peter Weber a pintura de Vermeer substitui a atriz em cena e toma conta da tela substituindo a ação. O espectador, extasiado, não fica sem entender. A moça do brinco de pérola finalmente viveu a sua história. Agora já pode retornar ao quadro. 


 

domingo, 1 de junho de 2025

TUDO É VIROSE

 



A entrada do novo século simplificou tudo de forma avassaladora:  Tudo é VIROSE. ”

 

Bons tempos aqueles em que quando você sentia febre, dor de cabeça, resfriado ou diarreia o médico lhe examinava e identificava a origem da doença, cujas causas mais comuns popularmente eram: infecção, má digestão, pulmão afetado, contusão, causas psíquicas, etc etc

A entrada do novo século simplificou tudo de forma avassaladora:  Tudo é VIROSE.

O médico, concentrado no celular, nem mais lhe fita direito. Antes mesmo que você comece sua fala ele já interrompe a ladainha de seus males dizendo: Deve ser Virose. Vou lhe passar alguns exames só para confirmar.

Desconsolado, você esboça alguma reação

- Doutor, que remédio então devo tomar?

- Viroses não são curáveis com remédios, mas fique tranquilo. Você vai ficar bom mais dia menos dia.

Como seu mal-estar continua, você trata de obter   o resultado dos seus exames o mais breve possível. Novamente diante do médico, este, depois de contemplar as imagens por brevíssimos dois segundos, conclui:

- Não lhe falei? Sabia que era virose.   Está liberado.

- Mas...  Que tipo de virose? Como se chama? Que posso fazer para combate-la?

- Não existe ainda vacina específica para ela. Só posso lhe garantir   que você não é o único e que essa danada está atacando na cidade toda. Procure relaxar e dar tempo ao tempo.

Sem remédio você sai do consultório mais frustrado do que ao chegar, isso porque acabou de saber que essa tal   virose que lhe acompanha em todos os   seus instantes  de agonia não tem sequer um nome para chamar de seu.  É Virose e ponto final.  

 

2. Tenho um amigo que depois de tanto ser diagnosticado com virose (sua família, seus amigos e até o cachorro de sua casa), adquiriu tanta experiência em medicina que automaticamente   diagnostica como Virose a tudo que acomete os múltiplos clientes que lhe procuram à cata de orientação na farmácia onde trabalha, como enfermeiro

De uns dias para cá anda pensando em abrir um consultório e exercer legalmente (pelo conhecimento de causa) o ofício da Medicina. Sabe que quando receber os doentes terá prontas   95% das respostas possíveis.

Pensa, inclusive, em   apor diante de seu consultório   uma placa com os dizeres: Diagnóstico em poucos segundos, sabendo que estará possibilitado a identificar até as doenças de origem sentimental, como dores de cotovelo ou de corno. 

Neste caso a experiência lhe facilitará o diagnóstico.

“ É um vírus muito comum hoje em dia que, em épocas festivas como Carnaval e são João, se propaga que é uma beleza! O remédio é relaxar. “


segunda-feira, 26 de maio de 2025

UMA ENTREVISTA


 


ENTREVISTA  CONCEDIDA  À REVISTA LITERÁRIA VIRTUAL SACADA LITERÁRIA.

ENTREVISTADOR: POETA PAULO RODRIGUES  


1 Paulo Rodrigues – José Ewerton Neto, o Fernando Pessoa afirmou: “A literatura, como toda arte, é uma confissão de que a vida não basta”. Você pensa a literatura da mesma forma que o Pessoa?

 

José Ewerton Neto – Não. Inclusive não sei porque as pessoas têm tanta admiração por essa frase que originou outra, de Ferreira Gullar, muito repetida. Ora, penso que a vida não basta para todo mundo já que ninguém quer morrer. Não basta para o artista, como também não basta para o médico, para qualquer camelô, para o mais humilde carroceiro e, nem por isso, todo mundo é artista. Acho que a literatura existe -  ou a arte em geral - como expressão da necessidade que  algumas pessoas têm de transmitir algo pensado e que lhe foi revelado como um dom, graças à sua capacidade imaginativa. Como todo trabalho na vida e todo exercício profissional alguns fazem isso com talento, a maioria não. Simples assim. Não acredito nessa interpretação de que alguém só porque escreveu uma poesia (que ninguém sabe ainda se é boa) ou tentou escrever uma história (idem) só por isso possa de antemão inferir que foi dotado de um destino especial, transcendente e distinto de todos os demais   seres humanos que não são artistas.     

 

 

 

2 Paulo Rodrigues – Você é um grande romancista, contista, cronista e também um poeta potente. Há proximidade entre a prosa e a poesia? Como observa essa questão?

 

José Ewerton Neto – O ‘grande’ fica por conta de sua delicadeza, mas, sem dúvida, diria que há muita proximidade e até que ambas sejam gêmeas, oriundas da mesma mãe, a Literatura. Acontece que,  muitas vezes, alguns leigos ou até mesmo escritores incautos tendem a achar que se trata da mesma coisa ou que quem exerce uma, pode  exercer a outra. Nem todo grande poeta ou grande escritor exerceu,  a todas as luzes, como Edgar Allan Poe, Jorge Luis Borges e Machado de Assis incursões vitoriosas em ambos os gêneros. O poema que mais gosto em língua portuguesa é A Mosca Azul, de Machado de Assis, mas   tem gente do mundo literário que nem sabe que Machado foi um grande poeta. Voltando à sua pergunta a principal distinção que vejo entre os dois gêneros está na sua execução e prática que,  no caso da poesia, pode ser menor em tamanho (tornando-se, a princípio, mais breve). Assim não demanda, quase sempre,  a mesma carga de dedicação, disciplina e tempo, o que faz com que a proliferação do exercício poético redunde, pela disseminação e fragmentação, em mais erros que acertos. Lembro uma frase de um grande violonista que dizia que o Violão era o instrumento mais fácil para se tocar mal e o mais difícil para se tocar bem. Julgo que o mesmo se pode dizer da poesia e a grande profusão de poetas na Internet comprova isso. Há muita quantidade, qualidade nem tanto, infelizmente. (Embora eu considere salutar essa proliferação e fragmentação, sempre  preferível à falta de adesão ou à indiferença) .

 

 

 

 

3 Paulo Rodrigues – Ewerton, o romance O prazer de matar foi premiado no Concurso Cidade de São Luís e publicado pelo SIOGE. Fale um pouco sobre ele.

 

José Ewerton Neto – Este romance marcou minha estreia na cena literária maranhense numa época em que minhas obrigações profissionais como engenheiro metalurgista, trabalhando na Alumar, mal me davam tempo de  escrever crônicas publicadas nos jornais. Acontece que, por essa época,  tive de fazer uma cirurgia e aproveitei a convalescença para colocar nas páginas uma ideia que tivera: de um personagem inusitado, matador simplório e, ao mesmo tempo trágico,  que se oferecia para matar suicidas por falta de outra opção para sobreviver. Por sugestão do saudoso amigo e escritor Jomar Moraes enviei os originais para José Louzeiro, que, para surpresa minha, recomendou o livro com palavras que vieram a compor a contracapa da primeira edição premiada. Isso me estimulou a que dois anos depois tirasse férias de 20 dias para poder escrever outro romance com uma nova ideia e nascia assim A Ânsia do prazer, também laureada. O curioso é que entre a primeira edição do romance, em São Luís,  até uma terceira edição nacional pela editora Arte Pau Brasil, SP,  com o título O oficio de matar suicidas, aconteceram dois casos, na vida real, semelhantes aos relatados no livro, o que comprova o dito de Oscar Wilde de que a vida é que  imita a ficção,  muito mais que o vice-versa.  

 

 

 

 

4 Paulo Rodrigues – Na poesia, o livro Cidade Aritmética obteve, em 1995, o prêmio Sousândrade, no Concurso Literário e Artístico Cidade de São Luís. Fale um pouco sobre a experiência com a poesia.

 

José Ewerton Neto – Eu já havia tido uma experiência anterior no gênero com o livro Estátua da Noite, de poemas, este sim, o meu primeiro livro, editado pelo SIOGE e cuja orelha foi feita por Erasmo Dias, de quem me tornara amigo. Nessa época eu já morava no Rio de Janeiro, trabalhava na Cia. Siderúrgica Nacional e as demandas profissionais me afastavam das atividades literárias. Não fiz lançamento, nem sabia direito como era isso rsrs e o sonho da literatura parecia longínquo. Somente quando retornei a São Luís e escrevi O Prazer de matar e o livro teve excelente repercussão da crítica maranhense voltei a pensar em publicar os poemas que eu produzira anos atrás e dos quais Erasmo Dias apreciara até mais  que os de Estátua da Noite. Da composição originou-se esse livro de poemas com construções formatadas como uma Engenharia na segunda parte e com alusões à Matemática na primeira. Tenho a pretensão de acreditar que esse é um dos poucos livros de poesia, escritos no Brasil, somente com temas matemáticos.

 

 

 

5 Paulo Rodrigues – Ewerton, quando você se tornou um leitor de literatura? Qual é o lugar dos livros na sua vida?

 

José Ewerton Neto – Comecei a gostar de ler desde criança primeiro através de revistas   em quadrinhos, inclusive fotonovelas, até romances que comecei a gostar quando deparei, por acaso, nas prateleiras da estante da minha saudosa tia professora Rosa Ewerton com o livro A Marca do Zorro de Jonhston Mc Culley (um deslumbramento!). Posso dizer que a leitura foi uma das maiores dádivas recebidas durante a minha vida e pela qual serei eternamente agradecido a Deus. A leitura, com todas as possibilidades que traz é uma felicidade! e, confesso, não entendo que nas Escolas  se obrigue um estudante ainda em formação à leitura obrigatória de livros antes de lhe dar condições, primeiro,  de ler aquilo que lhe traga prazer. Claro que um mestre tem por obrigação sugerir a leitura de determinados livros, mas sugerir é uma coisa, obrigar outra e a leitura só se tornará a felicidade (que tive e tenho) se vier junto ao “prazer” de estar lendo o livro que se tem nas mãos.  

 

 

 

 6 Paulo Rodrigues – Como você enxerga o romance contemporâneo brasileiro e maranhense?

 

José Ewerton Neto – O romance maranhense praticado em São Luis, não tem a mesma vitalidade da produção poética. As condições de subsistência, como se sabe, são precárias para um escritor local que pretenda extrair seu ganha-pão da prática de narrativas longas já que estas demandam muito mais tempo e dedicação. Essa pode ser uma das explicações para isso. Bons romancistas maranhenses de envergadura nacional são Ronaldo Costa Fernandes e José Sarney e ambos não residem aqui. Nosso país tem ótimos autores mas sinto que o romancista brasileiro, diante da concorrência internacional (que é muito boa, até porque os livros que vêm de fora traduzidos, já foram referenciados) permanece no dilema entre   agradar o público ou a crítica, e acaba muitas vezes não se estabelecendo em nenhuma dessas vertentes. Dos romances brasileiros muito comentados recentemente Li Torto Arado que não me agradou. Ganhei de presente e pensei que não fosse gostar de Bambino a Roma, de Chico Buarque ( por causa da leitura que fizera de seus primeiros romances)  mas esse livro me surpreendeu agradavelmente.

 

7 Paulo Rodrigues – Fale para os leitores sobre o livro A Última Viagem de Gonçalves Dias e Outros Contos. É um livro de ficção? Ou é mais um trabalho de pesquisa?

 

Admiro os pesquisadores, mas além de não saber praticar acho extenuante o trabalho de pesquisa. O surgimento da ideia, apareceu justamente em uma conversa com o escritor e pesquisador Agenor Gomes (que fez um trabalho marcante no gênero sobre a vida de Maria Firmina dos Reis). Eu sugeri a ele: “Agenor, já que a última viagem do poeta dá margem a tantas contradições e mistérios, sendo , portanto, um tema fascinante, você faz um trabalho de pesquisa sobre a mesma e eu fico com a ficção, que é a parte mais fácil.”  Rs Rs.  Enfim, como tenho dito nas entrevistas, A última viagem de Gonçalves Dias tenta suprir as lacunas de uma viagem nunca suficientemente esclarecida, com forte dose de conteúdo poético, como forma, também,  de homenagear esse escritor tão querido de todos nós.

 

 

 

8 Paulo Rodrigues – Quais são os novos projetos literários do José Ewerton Neto?

 

José Ewerton Neto – Você acredita, o livro vencedor do último prêmio Odylo Costa, filho, do Concurso Literário e Artístico Cidade de São Luís, (tão tradicional e tão desprezado, pelas autoridades) foi um título deste autor chamado O que dizem os olhos. Ficaria muito grato se alguma instituição, empresa, secretaria, ou universidade, se dispusesse a publicá-lo até mesmo como forma de servir de recado às autoridades, pois, embora o regulamento contemplasse a publicação do livro, esta não foi realizada, o que constitui uma grosseira transgressão da Lei que impõe o Concurso, criado com o propósito de estimular a produção cultural maranhense. Independentemente disso, sempre tenho títulos prontos em diversos gêneros (na crônica até por obrigação) pois sou colaborador assíduo do site do Imirante, para onde migrou o jornal O estado do Maranhão.

 

 

9 Paulo Rodrigues - Deixe uma mensagem para os nossos leitores.

 

José Ewerton Neto – Escrevam. Como disse José Saramago, para escrever um romance é muito simples: “Comece com uma letra maiúscula e no final você coloca um ponto. E, no meio, você põe a ideia”   

Porém, antes disso, há algo que considero fundamental: Leiam, leiam muito, leiam bastante, não parem de ler. Jamais.


segunda-feira, 5 de maio de 2025

OS MISTÉRIOS DO SEXO


 


MISTERIOS DO SEXO

José Ewerton Neto

.... Fumar pode encurtar o pênis quase um centímetro.

O que será que torna o sexo tão especial a ponto de em pleno encerramento do primeiro quarto de século da   pós modernidade, ainda persistir tanto desconhecimento a respeito?

Garanto, caro leitor (a) que mesmo se julgando especialista você não sabia que:

1.Fumar pode encurtar o pênis quase um centímetro.

Ou seja, leitora, se você tem como   parceiro um fumante inveterado, pretende prolongar o seu relacionamento, e anda desconfiada do tamanho PP do rapaz, recomenda-se, por prevenção, medir com uma régua o dito cujo para evitar que ele atinja em breve o limite mínimo suportável

2. No Líbano um homem pode ter relações sexuais com animais desde que sejam fêmeas. Relações sexuais com machos podem ser punidas com a morte.

Quanta descriminação contra os pobrezinhos! E o pior é que ainda não está ao alcance dos animais, participarem de passeatas LGBT contra práticas discriminatórias.

3.Devido a liberação de endorfinas o orgasmo feminino é um poderoso analgésico.

Portanto, alegar dor de cabeça não é um motivo muito justo para esposas e namoradas se negarem à prática sexual. Deve ser por isso também que lojas de artigo pornô proliferam nas grandes cidades como se fossem farmácias com seus vibradores e consolos. Tornando-se muito comum que quando as mulheres procurem seus médicos, se queixando de dores incontornáveis de cabeça, este lhes sugira: “Se seu parceiro não está ajudando Já tentou buscar remédio numa loja pornô? ”

4. A palavra clitóris vem do grego e significa chavinha.

É por isso que, para o homem, a menor distância para conquistar o paraíso é descobrir o segredo da chavinha. OU, pelo menos, o código.

5. As primeiras ereções masculinas ocorrem no último trimestre de gestação quando ainda são fetos.

Isso significa que, caso estas não ocorram, haja homem que antes mesmo de nascer já foi broxa. Isso significa também, que certas mães ao sentirem algumas pontadas mais profundas dentro da barriga tenham um sinal que o seu rebento terá um prodigioso futuro como bem-dotado.

6. Durante a ejaculação o sêmen atinge a velocidade de 45 km por hora.

Embora ainda não tenha sido registrada multa por causa disso é bom evitar fazer essas coisas dentro do carro. Tem barreira eletrônica que multa a partir de 40 km/ hora e elas não costumam estar bem aferidas.


quarta-feira, 30 de abril de 2025

A MAIOR DE TODAS AS ILUSÕES


 

A MAIOR DE TODAS AS ILUSÕES

 

José Ewerton Neto

 

 

 

 

A maior de todas as ilusões é você mesmo, caro leitor.

O neurocientista Daniel Dennet atesta, como outros especialistas, que a mente humana é apenas uma constante sucessão de ideias, lembranças, sucessões, projetos, sentimentos, disputa por atenção etc. que passa por nossa consciência, de forma não linear. Para ele a forma de dar sentido a esse turbilhão é dizer que há um Eu no comando de seus pensamentos. Mas esse eu unificado é apenas um conceito, portanto, um impostor.  

A IA respondeu exemplificando com um diálogo entre o ser humano e sua imagem no espelho quando indaguei se era verdade que o ser humano não passava de uma ilusão, depois de ter confirmado que, de fato, não passamos de ilusões.   

 

- Quem é você?

- Eu sou você.

- Nada disso. Você é apenas a minha imagem. Eu sou eu.

- Não se iluda. Eu sou você.

- Idiota! Se você for eu, quem, afinal, eu sou?

- Uma ilusão. Somente isso e mais nada.

- Ah, quer dizer então que eu como, bebo, respiro, transo, posso te mandar à puta que pariu agora mesmo e, mesmo assim, eu não sou eu. Enquanto que você, sem corpo e sem vida, por trás da lente de um espelho é a minha pessoa...

- Eu pelo menos sou sua imagem. Você nem isso, simplesmente é uma fantasia criada por você mesmo.

- Essa é boa! Vejo que você pretende me tirar do sério. Quer dizer que sequer uma imagem eu consigo ser, ou ter?

- Claro! Basta pensar. Daqui a um segundo você já terá outra imagem. Eu poderei ser sempre sua imagem atualizada, basta vir ao espelho. Já você, ao sair daqui, pensará que sua imagem ainda será a mesma de agora, esquecido de que esta já foi envelhecida pela passagem de mais um segundo.  E, assim por diante, uma sucessão de rostos se deteriorando até morrer.

- Peraí. E meu pensamento?

- Seu pensamento é uma soma de sensações que você teve, imitou dos outros ou lhe impuseram, portanto, nada exclusivo seu.

- E meu relógio? Meus pais? Meus genes? Minha carteira de identidade?

- Não são seus. Você os tem apenas provisoriamente.

- Nada existe então de meu? De minha pessoa?

- Nada, você é pó, e ao pó retornarás, lembra? Já eu não. Hoje sou você, amanhã posso ser outro, mais outro. Pelo menos sou uma imagem. Valho mais que você.

- Miserável! Vou te matar criatura, seja lá quem você for.

- Vamos lá, pegue uma pedra atire em minha direção e me quebre. E assim perderá a oportunidade de continuar olhando a ilusão que você é. O resto é memória. Quando fica.

sábado, 26 de abril de 2025

BEN HUR A PERDER DE VISTA


 


“Qual filme você assistiu mais de dez vezes e tem vontade de assistir novamente? ”

Essa pergunta, em uma postagem do   Facebook, despertou-me a curiosidade a ponto de conferir as respostas.

Acompanhei vários comentários, para mais de 70, que destacaram, para surpresa minha, alguns filmes antigos de minha preferência como Ben-Hur e A noviça Rebelde etc, entre vários outros de produção mais recente

            Tivesse eu que apontar 3 filmes marcantes escolheria um para cada diferente fase da minha vida: Ben-Hur na infância, Dr.Jivago na adolescência e A Primeira noite de tranquilidade, na maturidade.

Ben-Hur e Dr.Jivago foram filmes premiados com vários Oscars.   A primeira noite de tranquilidade sequer pertence aos cânones dos críticos de cinema. As razões dessa minha escolha fogem à objetividade dos entendidos em cinema e prende-se às sensações que os cristalizaram em minha memória por diferentes motivos.

Ben-Hur não representou para minha infância apenas um filme assistido e admirado, mas uma descoberta. O glorioso impacto aconteceu quando descortinei, à vista da tela, cenas memoráveis quase ao alcance da mão: o sofrimento e o combate nas galés; a famosa corrida de bigas, o reencontro do personagem principal com mãe e irmã despedaçadas pela lepra, o milagre e a redenção.

Ao constatar, porém a ausência de qualquer citação na referida lista a Dr.Jivago, fiquei motivado a fazer o seguinte comentário:

“Jamais assistiria a um filme dez vezes, a ponto de repeti-lo mais tarde, mesmo sendo Ben-Hur, mas sinto falta, entre os citados, de Dr.Jivago. Para mim, há várias razões para assisti-lo mais de uma vez além da concepção estrutural e cinematográfica intrínseca ao filme: os sedutores olhos verdes da heroína Lara (Julie Christie), a cena antológica de sua incursão em uma festa de ricaços em que ela, plebeia e vestida com andrajos, invade o luxuoso salão para dar um tiro no homem que a prostituía seguida de sua saída triunfal e impactante. A fotografia gélida e sombria, coerente com a opressão dos anos pós- revolução comunista russa. Tudo isso tendo ao fundo a música tema do filme:  o tema de Lara.  Belíssima!


terça-feira, 1 de abril de 2025




DE PERDIDOS A PERDEDORES

José Ewerton Neto

À primeira vista isso parece simples como constituinte do fatídico humano...

 

Perdido. Sem saber quem é, nem de onde veio, nem para onde vai. E cercado de perdas por todos os lados.

É esse o homem?

Sob um ângulo científico, sim. Caso não se socorra de sua fé religiosa para responder à primeira parte das questões fundamentais de sua existência, para as quais a Ciência jamais encontrou resposta.

Mas o pior é que, queira ou não queira, também é um perdedor nato e é disso que se ocupa Kathrin Shuls em artigo intitulado Permanência publicado na revista Época, tempos atrás. E, embora as Perdas sejam fatos corriqueiros em nossas vidas, fingimos não nos dar conta disso.

Estatisticamente dados de uma pesquisa mostram que um cidadão comum perde cerca de nove objetos por dia, o que significa que quando completarmos 60 anos teremos perdidos cerca de 2 mil coisas. Durante toda sua vida você passa cerca de seis meses procurando por objetos perdidos. Somente em celulares perdidos nos USA uma década atrás foram gastos 30 bilhões de dólares, imagine hoje!

À primeira vista isso parece simples como constituinte do fatídico humano, mas essas pequenas perdas não passam de presságios de perdas ainda maiores - da autonomia, da capacidade intelectual e, finalmente, da própria vida. Por isso quando perdemos coisas, mesmo triviais, ficamos tão chateados. Independentemente do que desaparece a perda nos coloca em nosso lugar, nos faz confrontar a desordem, a perda de controle e a natureza efêmera da existência, diz a autora.

Até chegarmos a maior das perdas, a dos entes queridos. Tantas vezes, inconscientemente, saímos à procura daqueles que perdemos e que jamais encontraremos, porque, diferentemente de outras perdas, a morte é a perda sem possibilidade de encontro.

Nossa sina prosseguirá, irreversível, até que em determinado dia deixaremos, afinal, de sermos perdedores. É quando passaremos de perdedores a perdas para os que continuam vivos, a quem só restará para reflexão a frase latina Consummatum Est (Está consumado!) pronunciada  por Jesus Cristo quando estava na cruz e sabia que a sua missão redentora havia sido cumprida -  referindo-nos não mais ao que se foi mas ao que restar de  nossa própria existência.