“A sua cabeça, de tanto carregar um
capacete, tomou a forma deste. ”
Mimi, o metalúrgico é um rapaz muito
esquisito. Sem cor definida (terá entrado fumaça em sua pele?), passa nas ruas,
indo ou vindo do trabalho, como um objeto –muito – identificado: é MIMI, o
metalúrgico.
A sua cabeça, de tanto carregar um
capacete, tomou a forma deste. Onde se viam olhos, boca, nariz, etc hoje se vê
— com mais perfeição — as letras CSN.
Os seus membros, tão desconjuntados, parece que só se mantêm aderidos ao tronco
graças a uma inevitável soldagem e
seu tronco terá sofrido uma trefilação, posto
que está tão
magro que dá pena. Enfim, quem olha MIMI diz logo que precisa de urgente
tratamento.
MIMI já havia pensado nisso e
preferiu o tratamento térmico ao tratamento de minérios. Consta que o
médico à vista de seu estado ponderou: MIMI, o que está havendo, rapaz? A tua dureza está muito baixa. Você não é
mais, nem de longe, um homem de têmpera.
Quem é metalúrgico sabe que no
tratamento dos aços o remédio para aumentar a dureza é um aquecimento a alta temperatura seguido de um
resfriamento brusco. Mas MIMI, coitado, não é aço e, se bem que sujeito a
sintomas típicos do aço como envelhecimento
e corrosão há uma diferença: no seu caso a corrosão se dá de
dentro para fora, devido a ação contínua e insaciável dos vermes. Donde a
suspeita: teria MIMI entendido mal a receita?
O certo é que MIMI enchia-se de
cachaça no bar da esquina — era o
aquecimento, e depois se esquecia nas calçadas em pleno frio do inverno de Volta
Redonda — era o resfriamento brusco. O que levou ao diagnóstico: Está
desenganado. Já ultrapassou o limite
elástico, sua inteligência está em fase de escoamento e em pouco tempo seu corpo entrará em fase de ruptura.
Causa dó lembrar que um dia MIMI
sonhou ser rico; um deputado ou senador, como todo jovem. O destino, como se
sabe, faz muitas curvas só que, no seu
caso, foram curvas erradas: curvas de Boudouard,
curvas TTT, curvas de equilíbrio. Era inevitável que terminasse assim,
encurvado.
Pensando hoje friamente, é forçoso
reconhecer que MIMI foi cúmplice desse destino para chegar a essa desastrosa
situação. Casou cedo, teve muitos filhos. Não teve planejamento nem controle da produção. Seus filhos se saíram todos
ingratos e perdulários — faltou claramente Controle
de Qualidade.
A ligação com a esposa, a princípio
católica e fiel, degenerou, se tornando o que poderia se chamar de uma ligação co-valente — isto é, com valentia mútua. Poderia ter se convertido num grande
personagem, mas passou fora do Conversor
Thomas ou do Conversor Bessemer.
Hoje chora lágrimas tão sólidas que
parecem lingotes. Seu coração se funde em copiosas mágoas e, de tanta
febre seu peito mais parece um Alto-Forno
ou Auto-Forno, como queiram. Pelo visto vai continuar até o fim refratário ao sucesso e ao bem-estar
financeiro. Poderia ter reagido a tempo, mas onde está a sua energia livre de Gibbs? Foi gasta com
mulheres na rua.
Mas a vida de um metalúrgico é assim
mesmo. E quando chegar a hora de sua morte e, para adaptá-lo ao caixão, for
preciso tosar seus cabelos e re-barbas —
como se fosse uma usinagem — ninguém
lembre um torno.
Para não confundir com o que foi em
vida.
PS. Essa brincadeira com o profissional da Metalurgia foi
publicada no jornalzinho denominado A CAREPA na Universidade Federal
Fluminense de Volta Redonda, quando me formei.
Realçando termos do jargão metalúrgico (em negrito) circulou
imediatamente em várias escolas e universidades do sul do país, com seu
bom-humor e irreverência, típica dos universitários da
época e dos jovens de todos os tempos.

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