quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A IRA DOS CONTRA-DEUS

artigo publicado sábado na Seção Hoje é dia de..
Jornal O estado do Maranhão, 31.10.09


A IRA DOS CONTRA DEUS

“Deus é o único ser que para reinar nem precisaria existir”
Charles Baudelaire

José Ewerton Neto
Membro da AML

ewerton.neto@hotmail.com


Eles estão com raiva de Deus. Primeiro foram os cientistas, capitaneados por Richard Dawkins. Escreveram livros execrando a figura divina e faturando muita grana com isso. Agora é a vez de José Saramago, o escritor português prêmio Nobel (o único da língua portuguesa). Qual a razão de tanta raiva? Procuramos entrevistar Deus para saber o que ele acha disso:

- Salve senhor Deus!
- Pode falar meu filho. Mas, prefiro que me chame de você. Sou simples, como o universo, embora a humanidade insista em tentar complicá-lo.
- O senhor, isto é, você, está a par do que vem acontecendo?
- Sim, sem precisar que me digam, porque, como você sabe, eu tudo ouço e tudo vejo. Primeiro soube do cientista que escreveu Deus, um delírio, depois soube de outro, mais outro... Agora o português, Saramago. Um diz que eu não existo; que não passo de um delírio, outro escreveu um romance para falar mal de mim. Ora, se eu sou um delírio, sou matéria de sonho, portanto tenho alguma serventia, não? E depois, esse escritor português, Saramago... Parece piada de português.
- Você leu seu romance Caim?
- Com toda essa eternidade pela frente, mesmo assim não vou perder meu tempo, embora tenha de sobra.
- Por quê? Você sofreria com as acusações?
- Não, não pelas acusações, que me são indiferentes. Nem pela argumentação, muito pobre, mas, justamente pela falta de talento e originalidade. O autor sequer é inteligente ao tomar imagens bíblicas, sabidamente simbólicas, para suportar suas acusações. Muito pouco para um intelectual desse porte. Isso me leva a acreditar no que foi dito por algum de vocês: que certos intelectuais gostam mesmo é de miséria.
- Você podia nos explicar melhor?
- Claro que sim. Existe miséria maior do que a daquele que atira contra a fé alheia? Que pode haver de mais sublime no universo do que a esperança e a fé? De que vale a vida sem estas? Nunca pedi a ninguém que tivesse fé em mim, sempre deixei a quem quer que fosse a liberdade de acreditar ou desacreditar. Aliás, nunca fiz questão da crença de ninguém. Se sou a verdade, não é preciso que o diga. Não foi assim que Cristo respondeu a Pilatos?
- Como você classificaria essa ira? Afinal de contas, pelo que sabemos, você nunca fez algum mal a eles, muito pelo contrário.
- Pois essa deve ser a razão do ódio. Eles não tem raiva de ditadores ou de terroristas, muito menos de bandidos ou estupradores, tampouco das ideologias ou das políticas desumanas, eles não vociferam contra os que fazem mal à humanidade, é mais cômodo para eles ostentarem raiva de mim.
- E justificam a raiva propagando a sua inexistência.
- Pois é, ficam irados justamente contra quem dizem não existir. Dá para entender? E se dizem sábios... O que mostra que o que existe mesmo nas suas mentes além de muita soberba, é um grande paradoxo.
- Que grande decepção, não é?
- De fato, essa humanidade me cansa. Dei inteligência à matéria inanimada para que muitos pudessem pensar e refletir sobre a beleza do universo e, daí, entenderem o exercício da vida como uma construção da fé, mas vejo que justamente os que estudaram um pouco mais, são os primeiros a esbravejar. Mostram apenas arrogância, pois tendo sido gratificados com a ventura de terem aprendido um pouco mais, não têm humildade suficiente para reconhecer o quanto todo conhecimento humano é ínfimo diante da criação, da grandeza e do fim do universo. Esquecem que alguém, muito mais sábio que eles, no passado dizia: quanto mais sei mas sei que nada sei.
- E agora, o que pretende fazer?
- Você quer dizer, para colocá-los no devido lugar? A palavra represália nunca existiu para mim. Jamais interferi nas coisas dos homens e vou continuar fazendo da mesma forma, contemplando-os de longe, como sempre. Talvez tire um breve cochilo de alguns milhões de anos até que essa civilização se extinga. Então, quem sabe, possibilite o aparecimento de outra raça mais generosa, que me traga mais satisfação. Como você sabe, planeta para isso é o que não falta, tempo e espaço também.
- Muito agradecido, pela entrevista, senhor Deus e queira perdoar-nos. Alguma recomendação final?
- Não fique bravo comigo e procure entender: cochilar dá muita preguiça e nada é mais cansativo do que não fazer nada, mas, creia, é muito melhor do que ler livros como esse, de José Saramago. Jamais faça essa besteira.



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