artigo publicado hoje, sábado, na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal o Estado do Maranhão
Virou moda
discutir no Brasil ao invés de qual o melhor time de futebol, qual é o que tem
a maior torcida. O que surge como uma das manifestações mais evidentes da crise por que passa o
outrora pujante futebol brasileiro.
Bons
tempos aqueles , na década de sessenta,
em que o melhor time de futebol era o Santos de Pelé, e acabou. Ninguém queria saber, então, se esse Santos era dono de pequena torcida,
todos o admiravam e por admirá-lo acabavam torcendo por ele. Dizia-se que todo
brasileiro torcia pelo Santos, e isso era verdade. Torcia-se pelo bom futebol e
não pela quantidade de gente que ia assisti-lo, enfim, o espetáculo era o que se
passava dentro de campo e não nas
arquibancadas.
De algum
tempo para cá, as estatísticas sobre os times preferidos são feitas com
irritante freqüência como se estivessem promovendo uma pesquisa eleitoral, e a
preferência de um torcedor fosse algo tão descartável como a preferência atual por
determinado político. A lógica ,
perversa para um futebol com o passado do futebol brasileiro é bem simples. Já
que não há mesmo bom futebol discute-se o
volume de torcedores e, por tabela, qual é o time que vai ganhar mais dinheiro da Rede Globo. O
torcedor atual, longe de agir como o do
passado que enchia o peito e dizia: “ Meu time tem Zico e Leandro” ou “ O meu já
teve Pelé e Coutinho” simplesmente estufa
sua camisa e diz : “ O meu time mais torcida que o teu, tanto é assim que a Rede Globo
‘enche ele’ de dinheiro.”
Pobre futebol
brasileiro! A partir de quando teria começado essa aberração? Uma resposta evidente
para aquele que não é bobo, acompanha futebol e
sabe sumarizar o que se depreende
dos fatos e das entrelinhas é de que tudo teria começado quando a Rede Globo,
na ânsia de dar as cartas no futebol brasileiro
enfiou um pontapé na união que havia entre o Clube dos Treze e passou a
privilegiar, de maneira ostensiva, apenas dois clubes, pretensamente os de
maior torcida. E, foi assim, que um clube tradicional como o Botafogo, que já
nos deu Garrincha, Didi, Jairzinho etc. com um histórico invejável de vitórias ( até
cinco anos atrás o time que mais jogadores havia cedido à seleção brasileira)
passou a receber da televisão uma cota ‘mesquinha’
que mal chega à quarta parte do que é pago ao Coríntians. Dá-se assim, a bem do
oportunismo comercial, a adulteração do princípio bíblico segundo o qual “ao que tem mais será dado e ao que não
tem , até o que tem lhe será tirado”. Que futuro estará reservado às futuras glórias
do Botafogo - competitivamente aos privilegiados - se para ele estará reservado
eternamente uma fatia menor do bolo (sabendo-se que a maior fonte de renda dos
clubes brasileiros vem da televisão?) Ora, isso pouco interessa ao monopólio que se
apossou do futebol, mas sim que privilegiando financeiramente a apenas dois
times, investe menos e fatura mais tornando mais fácil perdurar a manipulação
do futebol como um todo.
Fica fácil
entender, portanto, porque as pesquisas se repetem a todo instante - como
a querer comprovar que há respaldo popular na ação açambarcadora da Rede-, mesmo
às custas de uma imposição de falsa
realidade que ofende a inteligência, como as divulgadas recentemente dando conta de
que o Coríntians Paulista teria hoje praticamente a mesma torcida nacional que
o Flamengo e de que ,no Nordeste –
pasmem! – essa torcida já chega a ser três vezes maior do que a do Vasco da Gama, terceiro
colocado.
Menos,
diria um ser minimamente racional em meio a esse tiroteio de mentiras. Afinal
de contas, a qual torcedor a pesquisa está se referindo: ao torcedor de
verdade, que vai ao estádio, e que sabe o nome dos jogadores do seu time ou àquele que se diz torcedor de
uma agremiação apenas porque dela ouviu alguém falar repetidamente na tela - típico
Maria vai com as Outras? Pois se esse tiver
sido o ‘torcedor de ocasião’ pesquisado é possível que o Coríntians possa ter
hoje, sim, a torcida nacional igual ou superior à do
Flamengo , porque diante do bombardeio sonoro e visual perpetrado pela mídia no
final do ano, noticiando as vitórias do time, caso se perguntasse a qualquer
cachorro de rua ele responderia, latindo ou não, que é corintiano. (Nem carece falar das tristes
conseqüências desse bombardeio midiático a se refletirem, meses depois, na morte de um
jovem, na Bolívia, e numa crise jurídica
internacional).
Pois a
estatística, já dizia um grande cientista, é uma matemática ao gosto do freguês.
Como também são - por que não? - as
torcidas flutuantes que vão e vem ao sabor do que determinam as redes de
televisão, que manipulam como querem a preferência popular e que já conseguiram
eleger para presidente da república até um aventureiro como Fernando Collor de Melo. E
que se dane o bom futebol!
Nenhum comentário:
Postar um comentário