Artigo publicado no jornal O estado do Maranhão
Onde andará Belchior?
7 anos atrás escrevi uma crônica
neste jornal com esse título. Era a pergunta do momento, dado o sumiço do
cantor que, em fase de ostracismo, desaparecera
misteriosamente.
(José Ewerton Neto é autor de O oficio de matar suicidas )
Parecia algo
meio bizarro, (o sumiço), mas, de alguma forma, uma atitude não desgarrada do estilo do cantor e de suas
composições peculiares: melodias com letras filosófico-existenciais, num ritmo
indefinido que ficava a meio caminho entre balada rock e MPB, sob a batuta de uma voz anasalada e melancólica.
A estranheza
do contexto policial (já que alguém
famoso desaparecera), fazia girar, novamente, como num disco antigo em 78
rotações sempre as mesmas questões que desde
suas primeiras canções mais conhecidas pareciam dançar em torno de um eixo que
eram as questões existenciais irresolvíveis de todo mundo: “O que fez Belchior
de si mesmo? Por onde andará sua música? E a juventude? E os sonhos da juventude? (Os seus e os
nossos?)”
A solução detetivesca foi até fácil,
sobrepondo-se às especulações que a
mídia carreava para valorizar o mistério: estava quebrado financeiramente? Envolvera-se
com uma mulher possessiva que o mantinha
afastado da sociedade? Ou simplesmente estava cagando e andando para tudo (esse
tudo que, para facilitar, mais uma vez, estava cheio de nadas)? .
E foi assim: apenas um rapaz (coroa) latino americano sem dinheiro no bolso, prosaicamente
instalado em uma fazenda de interior, que a reportagem da televisão encontrou no
interior do Uruguai onde deu sua última entrevista conhecida. O mesmo Belchior,
o mesmo bigodão que, como o sorriso da Mona Lisa, parecia estar ali apenas para
garantir um mistério. Talvez porque, a essas alturas, isso fosse a única coisa que agora
lhe restava. Foi então que ele, como se
desculpasse, disse que estava recolhido para traduzir a Divina Comédia, de
Dante.
Semana passada, após o anúncio de
sua morte, em um grupo de whats app um de seus fãs, comentou: “Mais um que não soube lidar com o
sucesso, mergulhou-se em dívidas e se desestruturou”. Será que isso é verdade?
Sabe-se que lidar com o sucesso não
é próprio de artistas muitos talentosos. Estão aí, só para citar o rock, vários: Amy Winehouse, Renato Russo, Janis
Joplin, Jimmy Hendrix etc. (O bom livro A vida louca da MPB tem uma fortuna, só
com os brasileiros). Na contramão disso, lidar com o sucesso à custa da própria
mediocridade ostensiva é muito mais fácil e faz a festa de uma penca, da qual
são exemplos caricaturas musicais (e de personalidade) do tipo Luan Santana e
Wesley Safadão.
Por essa abordagem Belchior estaria
no altar dos talentosos, pois ligava tão
pouco para a grana que recusou uma
oferta milionária, de uma marca de carro muito famosa para reaparecer fazendo
propaganda do veículo. Não se pode garantir, porém, que essa condição seja necessária,
ou suficiente, para a “grande memória”. E Então, haverá um lugar para ele
reservado no panteão dos grandes artistas da MPB?
Sei não. Imagino que desprovido do mistério
que lhe serviu de veste, Belchior agora caminha
errante, entre outras boas almas da música brasileira, em algum lugar dessa nova
vida espiritual, (como talvez tenha
desejado), carregando seu alforje; bigodão bizarro, nome comprido, versos filosófico- existenciais, canções sinceras
e muito bonitas, para muitos!
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