sábado, 26 de maio de 2018

ENTRE NÚMEROS E PÁSSAROS!


(Do livro Cidade Aritmética, prêmio Souzândrade´, poesia,
de 1996,  São Luís, edições FUNC)




TANGENTE














O mar era ainda mais o mar
e o palpitar de tudo o que era vida
batia no muro do céu e se refletia
em sua amplidão e superfície

Um pássaro que sobrevoava
a longa calma em azul sobre a marinha
                                                               tombou
e do céu caiu oblíquo, projétil carnal de luz,
ponte pênsil entre as amarras de espuma
e nuvem, pedra dura em rota marítima
                                               pouca de destino

mas, a medida que afundava
as ondas se infestavam dos fantasmas
dos seus ossos, aquosos, cintilando
entre as espumas como vagas ou centelhas

Um músculo do mar moveu-se então
como um murmúrio da história
arrancado de entre as águas, ponto de ardor
pleno de morte, partícula de sal tocada
                                                               pela dor

e o pássaro continuou então sua trajetória
de onde há pouco pousara por descuido
por um instante tangente
                                               à superfície do mar.

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