VOCÊ NÃO PASSA DE UMA ILUSÃO
José Ewerton Neto, publicações aos sábados no site imirante.com
Sim, caro leitor, você é uma
ilusão. Nosso eu é uma ilusão, não passamos de ilusões. E nem estou me
referindo à vida humana, essa de quem, com muito maior razão, já se desconfiava
“A vida de alguém é a soma de suas ilusões” já dizia Henry James.
Estou me referindo a esse Eu,
que todo mundo pensa que é e que, agora, a ciência desmente como apenas um
conceito, dissociado da realidade. Como diz o neurocientista Daniel Dennet em
seu livro “A perigosa ideia de Darwin”. Ele atesta, assim como
outros especialistas, que a mente humana é apenas uma constante sucessão de
ideias, lembranças, sentimentos, disputa por atenção etc. que passa por nossa
consciência, de forma não linear. Para ele a forma de dar sentido a esse
turbilhão é dizer que há um Eu que está experimentando, ou no comando de seus
pensamentos. Mas esse eu unificado é apenas um conceito, portanto, um
impostor.
Para ilustrar essa realidade pode-se
imaginar o seguinte diálogo entre um homem e seu espelho,
ao perceber que, dentro da moldura, a imagem o encara fixamente,
como se estivesse viva e fosse outro ser. O homem, intrigado, pergunta àquele
que julgava ser apenas a réplica de si mesmo.
- Quem é você?
- Eu sou você.
- Nada disso. Você é apenas a minha
imagem. Eu sou eu.
- Não se iluda. Eu sou você.
- Idiota! Se você for eu, quem, afinal,
eu sou?
- Uma ilusão. Somente isso e mais nada
, meu caro.
- Ah, quer dizer então que eu como,
bebo, respiro, transo, posso te mandar à puta que pariu agora mesmo
e, mesmo assim, eu não sou eu. Enquanto que você, sem
corpo e sem vida, por trás da lente de um espelho é a minha pessoa...
- Eu pelo menos sou sua imagem.
Você nem isso, simplesmente é uma fantasia criada por você mesmo.
- Essa é boa! Vejo que você pretende me
tirar do sério. Quer dizer que sequer uma imagem eu consigo ser, ou ter?
- Claro! Basta pensar. Daqui a um
segundo você já terá outra imagem. Eu poderei ser sempre sua imagem atualizada,
basta vir até a mim. Já você, ao sair daqui, pensará que sua imagem
ainda será a mesma de agora, esquecido de que esta já se tornou outra, envelhecida
pela passagem de mais um segundo. E, assim por diante, uma sucessão
de rostos se deteriorando até morrer.
- Peraí. E meu pensamento?
- Seu pensamento é uma soma de
sensações que você teve, imitou dos outros ou lhe impuseram,
portanto, nada exclusivo seu.
- E meu relógio? Meus pais? Meus genes?
Minha carteira de identidade?
- Não são seus. Você os tem apenas
provisoriamente.
- Nada existe então de meu? De minha pessoa?
- Nada, você é pó, e ao pó retornarás,
lembra? Já eu não. Hoje sou você, amanhã posso ser outro, mais outro. Pelo
menos sou uma imagem. Valho mais que você.
- Miserável! Vou te matar criatura,
seja lá quem você for.
- Vamos lá, pegue uma pedra atire em
minha direção e me quebre. E assim perderá a oportunidade de continuar
vendo a ilusão que você é. O resto é memória. Quando fica.
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