domingo, 18 de julho de 2010

O VAMPIRO DE CADA UM

Artido publicado na seção Hoje é dia de...

O Estado do Maranhão, sábado


O VAMPIRO DE CADA UM


José Ewerton Neto

ewerton.neto@hotmail.com



Durante muito tempo as pessoas, não só adolescentes, foram fascinadas por anjos. Daí o termo – já um tanto em desuso - de chamar o parceiro(a) querido de “meu anjo”. As coisas evoluíram, de forma que o que está na moda hoje, ao invés, é ser fascinado por vampiro. Eles estão em todo lugar: nos livros mais vendidos, no cinema e nas artes em geral. E é com muita ternura e carinho que toda adolescente moderna sonha com a chegada de um, com dentes suficientemente afiados em sua garganta, para que possa, finalmente, excitada como se estivesse flutuando, sair gritando a dizer: Mãe, descobri a felicidade , encontrei o meu vampiro!
Mas, o que é mesmo um vampiro? Bem, por tudo que dele se conhece de uma coisa podemos ficar certos: anjo ele não é. Portanto, nada de bondade, nada de proteção platônica, nada de heroísmo, enfim, essas qualidades que as mulheres buscavam antigamente num homem. Um vampiro, quer queiram quer não, tem, necessariamente, que possuir algo de malévolo.
Tentemos entender:

1. Embora os vampiros atuais disfarcem muito bem, mitos sobre entidades que se alimentam do sangue dos vivos, ou seja, vampiros, existiram em todos os continentes e em todas as épocas, desde a China de 6000 anos atrás. É fácil concluir que um ser que se dava ao trabalho de abandonar sua ociosidade eterna para vir chupar o sangue de um vivo, não era, exatamente, o que se poderia chamar de coisa boa. No século XVIII, por exemplo, sabe-se que depois de dois casos de vampirismo no Leste Europeu, famílias desenterravam seus mortos para decapita-los, queimá-los ou neles cravar estacas.
2. Foi só no século XIX que a literatura se encarregou de colocar um tempero, digamos assim , romântico, na trajetória dos vampiros, o que não lhes diminuíu, em absoluto, o impulso maléfico. Proliferaram então vampiros para todos os gostos , inclusive lésbicas ( não deixem de ler o belo romance Carmila) , cuja paixão homossexual não a evitava de fazer uma vítima atrás da outra. De Drácula, da literatura, até o Nosferatu, do cinema de 1922, um vampiro que se preze tinha de carregar consigo, para sempre, a pestilência do mal. Se os vampiros foram sendo cada vez mais aceitos, até chegarem a década de setenta “estraçalhando” em Entrevista com o Vampiro, da escritora Anne Rice, seus aspectos macabros, no entanto, continuaram disponíveis à serventia de quem quisesse.

A partir do final do século passado, como era de se esperar, deu-se que já havia muito pouco vampiro para todo o mal que a população mundial desejava. Mais maldade? Sim, a humanidade parecia ansiar por maldade, desde que disfarçada. Teria a crueldade camuflada, passado a ser a patologia de uma nova época?
O certo é que, para torná-los palatáveis, seus autores passaram a enfatizar a melancolia e a solidão do vampirismo, provavelmente, para ocultar a crueldade latente, sob uma aura de mistério e melancolia. Daí que Fome de Viver sugestivo título do filme sobre vampiros com a bela Catherine Deneuve e David Bowie, na década de 90, estaria bem melhor traduzido se fosse chamado, ao invés, Sede de Vampiros, que logo se tornou a realidade do novo século.


E eles vieram aos borbotões: desde os da série Buffy a Caça-vampiros, até os da série Crepúsculo: bonitinhos, perfumados, elegantes e sempre escondendo muito bem os afiados dentes.
Mais ou menos como gigolôs? Se pensarmos bem, sim. No fundo, todo vampiro não passa de um gigolô, no sentido de ser, na essência, alguém que disfarça muito bem a maldade em troca de sedução, amor e sexo. Cuja presença aparenta ser, justamente, a maior expectativa da mulher atual a julgar pelo que se vê nas revistas. Pelo que anunciam e exibem Suzana Vieira e mais uma penca, muitas mulheres maduras apreciam gigolôs, como as adolescentes atuais gostam de vampiros. Mas, se tal atitude soa compreensível no caso de mulheres envelhecidas como justificar, para uma adolescente, equivalente fascínio?
Uma jovem em reportagem recente, da revista Veja, dá uma dica para esse entendimento quando diz : “Desde pequena gosto de vampiros. Sempre achei interessante isso de uma criatura sem alma, que precisa de sangue para se alimentar e que vive na escuridão. Por trás da maldição pode existir um romance.”
Tal como os casos de psicopatia recentes. No mais falado deles, o do goleiro do Flamengo, a morte de uma bela garota de programa executada cruelmente por um atleta admirado, esboça a simbiose dos tantos ingredientes que, forjados pela mídia, tanto fascinam o público: sexo, sedução, beleza e dinheiro. A maldade chega a ser o tempero que adoça a mistura. Psicopatas ou cafajestes, vampiros ou gigolôs, os homens que mais fascinam a mente das mulheres inseguras de hoje parecem ser os idealizados por elas por serem capazes de sugarem-nas com perfeição, não importando que a morte esteja de tocaia, desde que se apresentem associados a uma suposição de beleza, sexo e poder.
Coitados dos anjos!


Nenhum comentário:

Postar um comentário