domingo, 24 de outubro de 2010

POR QUE ESCREVO?

Texto publicado no caderno Alternativo, seção
Hoje é dia de...o Estado do Maranhão, sábado



Jose Ewerton Neto

Membro da AML

ewerton.neto@hotmail.com



1. Frequentemente, nos cafés literários, ou palestras, dos quais participo, surge a pergunta: por que vocês escrevem, como surgiu essa vocação de escritor?
Confesso que ainda não tenho (tampouco escutei) uma resposta convincente a essa questão aparentemente simples, que, embora, deixa sempre a sensação de que subtende uma certa incredulidade, misto de admiração, curiosidade e estupefação, quase sempre.
O fato é que ninguém pergunta, por exemplo, a um médico porque ele medica, a um comerciante porque ele negocia, a um consultor porque ele não faz absolutamente nada, a um ator de filme pornô porque ele transa profissionalmente ou a um político porque ele faz politicagem. Talvez porque as respostas sejam demasiado óbvias (no caso do político, quando a resposta não está na cara, na maioria das vezes, está no bolso). O que, no caso de um escritor, está a léguas de acontecer,

2. Sim, porque, neste caso, a resposta jamais estará do lado do senso comum, já que, por dinheiro ou por subsistência, com certeza, não é. Como todos sabem escritor não ganha dinheiro com venda de livros. Por que então, meu Deus? E a pergunta, começa a fazer sentido em sua repetição, afinal de contas, as pessoas sempre estão atrás de sanar algum mistério. Lembro, a propósito, da frase de um escritor norte-americano que dizia que “a única vantagem de um sujeito ser escritor é que ninguém o chama de burro por ganhar tão pouco.” Essa, talvez seja uma vantagem. Mas consegui descobrir outra:
A de permanecer sozinho, num bar, por exemplo - e sentir prazer com isso. Sei que muita gente vai pensar que isso não traz prazer algum, mas se pensarem bem hão de concordar que é uma vantagem e tanto, pela “economia de felicidade”: não só de entrar sozinho, como a de sair sozinho, sem esperar alguém e sem desejar coisa melhor na vida. Um escritor deve ser o único tipo no mundo que encontra prazer em ficar sozinho em algum lugar, público ou não, por mais de duas horas com seus livros, jornais e suas anotações. O que lembra a frase do escritor Fernando Sabino, uma pérola de definição do que seja um chato: “Chato é aquele que te rouba a solidão sem te fazer companhia.” Em suma, numa época em que a chatice não tem limites ( carreatas de políticos, gente que fala merda, gente que escuta merda, ) não deixa de ser salutar possuir as características de alguém que usa como remédio contra a chatice da vida afora, a própria solidão.

3. Na dificuldade de responder a tão inquietante questão meti-me a analisar as respostas do livro “ Por que escrevo” que adquiri coisa de dois anos atrás, e do qual já havia olvidado.
Eis algumas:
João Ubaldo; “A essas alturas, eu escrevo porque não tem outro jeito”
Alain Robe Grillet: “Eu escrevo romances há 35 anos e nunca soube por quê.”
Roa Bastos: Por que escrevo? Escrevo por atavismo. Sei que não é uma boa resposta, mas há uma resposta para um sujeito tão impreciso?”
Autran Dourado: “A gente começa porque tem jeito para escrever e depois não termina, porque não tem jeito de parar.”
Blaise Cendrars: “ Porque”
Pouco, estimulantes para uma solução, certo?

4. Quanto a mim, essa dificuldade talvez esteja em que eu não seja, de fato, um escritor (sou engenheiro de formação), certamente a anos-luz do talento dos acima citados. Sou apenas um escrevinhador que adquiriu esse hábito por gostar muito de ler, desde a primeira vez , na infância, quando surrupiei da estante da minha tia o livro A Marca do Zorro. Escritores com bem mais condições de resolver a essa questão devem ser o mago Paulo Coelho ou o cantor Chico Buarque (que ganha prêmios literários quase todo mês) e que recentemente disse que escrever é uma chatice, descobrindo talvez, num rasgo de genialidade, a incógnita dessa equação tão complicada. Vá lá: todo escritor deve escrever para que um dia se torne tão chato quanto ele.
Já ia encerrando esta crônica, com a preciosa ajuda de Chico, quando li por acaso, na Internet, que pouco tempo atrás se celebrou os quarenta anos da morte de Guimarães Rosa . Eis então que uma nova idéia, um tanto subversiva, me ocorreu: como um escritor é um sujeito que não celebra aniversários e festas em vida ( não tem dinheiro para tanto) escreve para que um dia se celebrem seus aniversários de morte.
Nesse caso, suas esperanças, (independente de que tenha sucesso ou não) têm o dom de sobre passar a vida e ele, consciente mais que qualquer outro, de que esse negócio de imortalidade não existe, escreve para que suas esperanças, pelo menos elas, sejam imortais, não é mesmo?

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