segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

HIDRAMIX FOI AOS USA

Artigo publicado na seção Hoje é dia de...,
Caderno Alternativo, jornal O estado do Maranhão, sábado

HIDRAMIX FOI AOS USA

José Ewerton Neto

ewerton.neto@hotmail.com





1. Sol-Hidramix Riosraios Paraíso Diforças Almeixeixas Hinfinito é de Chapadinha e mora em São Mateus onde é dono de uma borracharia. Passou para a literatura através de Nelin Vieira, publicitário e escritor que, num furo de jornalismo literário, identificou o tragicômico por trás do seu extravagante nome e o transformou em personagem de um conto do seu livro “O centésimo emprego de Seu Lelé Bristol”. Mereceu também uma crônica do escritor José Sarney, uma incursão no recente livro de Bruno Azevedo “ O Monstro Souza” e foi objeto de uma artigo de pós-graduação deste cronista, no curso de jornalismo cultural da UFMA, intitulado “ A invenção de nomes próprios : algo mais do que um costume. Será Arte?”
O que talvez seja pouco para sua intenção de, através do nome inventado, desraigar-se da sua sina de borracheiro associada às amarras do seu nome de batismo, (tão comum) de João de Deus.
Mas, quem é mesmo Hidramix, um nome ou um personagem? Ou, indo mais longe: um nome, qualquer nome, é apenas uma palavra ou muito mais que isso: quase um personagem? O que existe entre um nome e uma pessoa?
Certamente, não apenas uma palavra ou um mero símbolo de identificação. Não há como duvidar que o destino de muitas pessoas, consagradas ou não, foi influenciado pelo nome adotado. Quem discorda de que Pelé jamais teria sido o maior de todos se houvesse conservado o seu nome de batismo, Edson? E que dizer de Hitler, cujo nome original era Schicklgruber? E Ferreira Gullar, e tantos outros?

2. Na verdade, ninguém até agora foi capaz de dimensionar o poder exercido por um nome na montagem do destino de alguém. Alguns livros de numerologia chegam a fórmulas nem sempre convincentes, mas psicanalistas e filósofos em artigos recentes sugerem que o poder da linguagem vai muito além, influenciando até a conduta generalizada de um povo. Como se daria isso? Antecipando-se no inconsciente das pessoas, a partir de condicionamentos trazido pela linguagem, a resoluções de natureza psíquica.
O teor de meu artigo, acima citado, ( http://www.cambiassu.ufma.br) chama a atenção para a possibilidade artística da invenção de nomes próprios, insurgindo-se também contra a forma depreciativa com que os especialistas da literatura e da linguajem se referem à prática popular de inventar nomes próprios, associando-a sempre ao ridículo e ao grotesco. Provavelmente, por ser uma prática mais comum nas classes desvalidas O preconceito torna-se evidente quando, em contraponto, a criação de neologismos, na literatura, é alçada à condição de supra-sumo da arte. Esquecem que nos estratos sociais mais carentes – como no caso de Hidramix - a tentativa de invenção do próprio nome, extrapola todo o drama de um indivíduo, em seu afã de sobrepor-se, através da originalidade, à sua própria condição humana. O que, em última análise, é objeto implícito de toda arte.

3. Recente artigo da revista Veja faz um apanhado dos nomes que estão em voga para meninas a partir de 2010 no Brasil : Julia, Sofhia, Isabella, Maria Eduarda e Giovanna onde esboça-se, claramente, a intenção de diferenciação. (Atenção aos l, n, h, a mais, no nome). Diz a revista: As celebridades escolhem sempre para seus filhos nomes que não sejam “populares”. Quando Maria, João e etc. eram nomes de “pobres” elas os rechaçavam e preferiam nomes “americanizados” como Jenniffer e Jéssica. Quando estes grassaram na população voltaram aos nomes bíblicos. Esse comportamento, tão idiota e sub-intelectual, quanto o do “falso-rico” da província que faz uma viagem ao exterior e, na volta, corre para as colunas sociais dos jornais com suas fotografias - realça , contudo, o quanto de esperança de destino se transfere para um filho através do nome, independente da classe social.
Na mesma reportagem a revista cita que agora se tornou moda para as celebridades norte-americanas a escolha de nomes únicos para os filhos - portanto, inventados - atitudes que o psicólogo Jean Twenge chama de “epidemia de narcisismo”. Como todos começaram a imitá-los pode-se dizer que, por lá, o costume se generaliza num caminho inverso ao nosso.
Sendo padrão de nossa sempre subdesenvolvida vaidade imitar tudo o que vem de fora, de repente, não mais que de repente, a “loucura” de Hidramix será promovida a “narcisismo” também aqui no Brasil e passaremos a ter milhares de Hidramix nos nomes de batismo dos nossos filhos. E João de Deus, borracheiro de São Mateus - aquele que queria ter um nome - terá, finalmente, pelo menos durante algum tempo, a glória que sempre sonhou.

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