sábado, 23 de maio de 2015

SUA GRANDE VERDADE




artigo publicado na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal o Estado do Maranhão, hoje, sábado

A verdade de uma pessoa não está naquilo que ela te revela, mas naquilo que não pode  revelar-te. Portanto, se quiseres compreendê-la, não escute o que ela diz, mas antes, o que ela não diz.” Khalil Gilbran

Um homem de verdade, morre em busca de sua verdade

            Quem, de verdade, encara a sua própria verdade? Isso é muito difícil, essa é a verdade.
            E nem mesmo isso acontece porque o conceito de verdade seja complicado, mas porque, muitas vezes é preferível não dizê-la... Ou encará-la.... Ou sabê-la. Taí Jesus Cristo, na Bíblia, diante de Pilatos. O imperador romano lhe perguntou: “És tu o rei dos judeus?” Cristo silenciou, até que,  diante da insistência do romano, acabou respondendo: “Eu sou a verdade”. E Pilatos retrucou: “O que é a verdade?” Jesus Cristo  silenciou, desta vez para sempre.
            Ora, se o próprio filho de Deus não quis responder, vai ver que com esse negócio de verdade é melhor não mexer, nem insistir, nem esclarecer. Como se Jesus Cristo, com seu silêncio, quisesse dizer nas entrelinhas.: “Não sou eu quem vai te ensinar o que é a verdade. Procura e acha, se fores capaz!”




                                                





            Existem, como todos sabem, verdades genéricas que são aquelas que dizem respeito a um grupo de pessoas ou fatos e que, um dia, vão ser conhecidas através da ciência, mais cedo ou mais tarde. Já as verdades individuais, estas são íntimas de cada um, a respeito das quais  ninguém pode saber mais que o próprio indivíduo. Como raros seres humanos se atrevem a conhecê-la é fácil deduzir que cada um deva ter a sua  verdade oculta - e assim esta permaneça até o fim.
            Mas, o que seria mesmo essa verdade oculta? Não se trata de um fato escondido, de algo que aconteceu e que se evita contar, mas de uma verdade que nenhuma outra pessoa sabe ou imagina. Muitas vezes está tão recôndita nos desvãos do cérebro de cada um que nem mesmo o seu dono sabe que ela existe. Mas que existe, existe...Prova disso é que nenhuma pergunta assusta tanto o ser humano quanto esta, pronunciada geralmente quando o sujeito está desprevenido:
            - Você quer mesmo que eu diga a verdade sobre você?




                                               






            Pronto, de repente, toda a segurança desmorona, a alegria desaparece, a tranquilidade some. O primeiro impulso do questionado é o de fugir para bem longe: “Merda, será que esse filho da puta descobriu, finalmente, o que nem Deus sabia?” Essa única reação possível surge com um gesto afetado de pretensiosa  segurança para esconder o quase grito de clemência, com a voz trêmula: “Se tem o que falar fale logo. Todos sabem que nada tenho a esconder  ou a revelar”.
            O pior é que sempre tem.


            Alguns milhares de anos atrás, o filósofo Sócrates se preocupava com isso,  e emitiu o primeiro sinal de alerta: “Conhece-te a ti mesmo”. Mas, claro, isso só fazia parte das preocupações dele e de mais uns poucos. Alguns séculos se passaram, e se atentou que o vinho facilitava esse dom: de reabrir os horizontes da cabeça dos homens em busca dessa verdade, tanto assim que isso deu origem à sentença latina: “In vino veritas” (No vinho está a verdade). 




                                                    






Depois, também a cerveja, o uísque, o livro, a poesia, o desenvolvimento da ciência, Darwin e Freud, que passou a vida mexendo com estudos nessa direção. Infelizmente, porém, a coisa só chegou até os psicanalistas, que se especializaram em descobrir a verdade do outro, mas nunca chegam perto. Ora, como vai achar a verdade de alguém um sujeito que não sabe sequer qual é a sua? E assim, de verdade em verdade, e de mentira em mentira, as verdades pessoais se tornaram supérfluas no mundo de hoje, parecendo que ninguém em sã consciência quer saber da verdade; nem a sua, nem a de ninguém e, principalmente, sequer se existe verdade.
            Porque o que grassa na vida atual, é justamente o que está ligado à capacidade de tanta gente confundir mentira com ilusão e verdade com realidade. A vida se tornou supérflua e sem substância porque se é mais tolerante com a inverdade dos outros do que com a sua própria verdade. Em nome da convivência com mundo é mais fácil consumir seja lá o que for, a qualquer custo,  do que evitar ser consumido por tudo isso. Todo mundo sabe a ‘verdade’ dos políticos (a maioria estás aí para tirar proveito), mas é preferível justifica-los de uma ou outra forma, votando sempre no último, cuja mentira for mais aprazível. Todo mundo sabe a verdade dos programas de tevê tipo BBBrasil (a de que alguém o está fazendo de besta) mas prefere acreditar que isso o está satisfazendo. Todo mundo sabe a verdade sobre a porcariada musical que lhes empurram, de Luan Santana e duplas sertanejas, mas prefere aceita-los porque a verdade de idolatrar alguém, sabidamente idiota, é menos dolorosa do que a de ser reconhecido como um. 



                                               






Quem se lembra,  no seu cotidiano, da verdade das verdades: a de que vai morrer um dia? Ninguém, claro, e é por isso que cada dia mais os hospitais estão cheios de doentes terminais, entregues aos aparelhos cirúrgicos, ao estoicismo dos médicos e ao distanciamento das famílias.
            Para que serve a verdade? Vivemos muito melhor sem ela, e quanto mais profunda e vasta, a ponto de desnudar alguém diante de si, mais abominável será considerada pela covardia do homem. Que os sábios procurem as suas verdades e sofram ou se regozijem com elas. Verdades não foram feitas para seres humanos.
                                                                       ewerton.neto@hotmail.com

                                                           http://www.joseewertonneto.blogspot.com

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