artigo publicado no jornal O Estado do Maranhão
1.CEMITERIOFOBIA
Semana passada, dia de Finados, conversava
com um amigo, dizendo-lhe que já havia ido, na véspera, prestar minha
reverência aos meus antepassados para evitar as aglomerações quando ele
retrucou: “Não gosto de cemitério. Sempre
detestei , desde criança”.
Refleti
então que esse seu expediente, muito cômodo, é usado por muita gente, nessas e
outras ocasiões, para se eximir de enfrentar realidades dolorosas e outras
obrigações de solidariedade e respeito humano, ou até mesmo, para, simplesmente,
se livrar do trânsito e das aporrinhações de locomoção. (Afinal de contas, é
muito mais prazeroso ir à praia ou ficar assistindo as sensaborias da tevê.) Resolvi
contemporizar: “Compreendo você, também não morro de amores por cemitérios, mas
ninguém gosta de hospital, mas acaba indo por lá, não é mesmo?”
Ele, não se
dando por achado, continuou vociferando sua declaração de ódio ao ambiente
fúnebre: “Não vou a velório nem em missa de sétimo dia, detesto tudo que cheira
morte”. Quase insinuei que, sendo assim, ele deveria também não gostar de
churrasco, pois a carne é proveniente da morte do de um boi, mas preferi ir direto a essa descoberta que se apresentava
no reino das alergias: a Cemiteriofobia.
-Rapaz,
acho que você tem alergia a cemitério,
confere?
- Sem
dúvida, acho que sim.
- Aceita um
conselho já que você tem mais de 60 anos?
- Vá lá.
- Se você
não se livrar dessa sua obsessão raivosa corre o risco de morrer duas vezes. A primeira,
por causa do que vai leva-lo pra lá, a segunda, por causa dessa sua alergia.
Afinal de contas, terá que aguentar o cemitério por toda a eternidade.
2.Outra
fobia que ainda não foi catalogada como tal é a
alergia à música sertaneja.
Seria SERTANEJOFOBIA? Não tenho certeza, mas o
leitor já deve ter entendido que se trata Essa mesma, que infesta os canais de
televisão com a pobreza de suas melodias e letras, cuja ruindade é tão pesada que
não dá para ser carregada por um só, daí
que proliferam as duplas.
Acabei
manifestando meu pavor a isso num consultório médico, quando o médico, extenuado
depois de um árduo trabalho de pesquisa, me inquiriu, tentando desesperadamente encontrar a causa de
um começo de depressão.
- Você está é
com alergia, rapaz!
- Como?
- Alergia à
música sertaneja. Você tem SERTANEJOFOBIA. É de difícil solução no Brasil.
- Tem
certeza, doutor? Como identificou?
- Eu também sinto
isso. Infelizmente.
- E tem
solução? Que podemos fazer?
- Bem, você
não pode sair por aí exterminando essas duplas todas, empunhando armas, mesmo agora
com o aval do Bolsonaro. Portanto...
- Pode
concluir!
- Só se
suicidando! A não ser que você queira ir embora deste país.
Lembrei
nesse instante de uma frase muito sábia de Gramsci que dizia que qualquer sujeito
racional é pessimista por inteligência e otimista por necessidade. Acostumei-me,
portanto, a pensar positivamente Já pensou se além de SERTANEJOFOBIA eu tivesse
também CEMITERIOFOBIA?
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