"Existe uma casca de banana por trás de toda grande tragédia.”
A frase
acima, do escritor inglês Graham Greene, usei-a algumas vezes nas reuniões
preventivas sobre segurança de trabalho, antes das jornadas diárias no ambiente
de produção metalúrgica, quando me cabia, como engenheiro, ser o palestrante.
Era repetida
aqui e acolá, porque além de seu fácil entendimento continha, em poucas
palavras, o apelo à necessária e permanente vigilância de qualquer funcionário
diante de desleixos ocasionais que podem ter consequências acumulativas e
avassaladoras.
Uma casca de
banana, disposta de forma ocasional e aparentemente inofensiva: um laudo ignorado;
uma decisão que se adia; um equipamento sem manutenção; um jeitinho brasileiro;
uma barreira de contenção que não se avalia e... Pronto, eis a tragédia!
As tragédias
de Brumadinho e do Ninho do Urubu são exemplos recentes de como, especialmente
em nosso país, os nossos administradores (seja de uma cidade, de uma empresa, ou de um time de futebol) fazem
questão de jamais enxergarem as cascas de banana por considerarem, que são imunes
às suas consequências porque jamais pisam no chão de fábrica, num campo de
futebol ou no trajeto de um fluxo de
lama. No popular, é como se pensassem “Se alguém tiver de morrer serão os
outros, portanto melhor deixar como está !.”
No caso do
Ninho do Urubu, foi necessária a morte de 10 rapazes para se enxergar o que
acontecia nos arredores do luxo obsceno dos salários e das contratações milionárias
de jogadores tidos como ídolos. Enquanto isso se dava, numa farra de gastos incompatível com a privação
em paralelo de Jogadores humildes e ainda sem nome, estes eram jogados em
contêineres, em condições precárias.
À semelhança do descaso criminoso de outras tragédias:
Mariana, Brumadinho, Boate Kiss etc cujo número de mortos excede a mil, esse último episódio mostra que isso ficou corriqueiro num país onde tudo
se vê, mas se faz de conta que não , onde as cascas de banana não são
afastadas, mas, são deixadas no mesmo lugar para que sobre elas pouse o tempo
que fará esquecê-las.
Enquanto o ídolo Zico, egresso das
divisões de base, em depoimento pungente exigia a apuração rigorosa dos fatos o
presidente em exercício general Mourão
Filho, dando uma de torcedor tardio e deslocado, preferia atribuir a morte dos rapazes a uma
fatalidade. Ou seja, ao responsabilizar o imprevisto da natureza para acobertar
crimes de descaso o general cometeu o mesmo crime de leniência que as
autoridades cometeram em relação aos culpados de Mariana, cuja punição exemplar
teria evitado o segundo massacre.
A omissão no
enquadramento desses dirigentes (de times de futebol a executivos de empresa e administradores públicos ) por conduta leviana
e indiferente transforma-se assim na
casca de banana mais perigosa, a que se perpetua trazendo outra e mais outra,
enfim, uma sucessão de grandes tragédias que, pelo visto, tão cedo não serão
estancadas.
José Ewerton Neto é autor de O ABC bem humorado de São Luis
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