segunda-feira, 31 de outubro de 2011

DO SABIÁ À BEIJA-FLOR

artigo publicado na seção Hoje é dia de...,
sábado Caderno Alternativo, jornal O estado do Maranhão



Tirando a batida do próprio coração, tudo o que é repetitivo, enjoa, certo? Em termos musicais até mesmo o Bolero de Ravel ou o Tico-tico no fubá. Por isso é que é tão difícil se achar, hoje em dia, um samba enredo bonito de verdade com os do passado, entre estes pelo menos uns dois, que Clara Nunes cantava e consagrou. Quanto à letra, estamos falando de letra casada com a música, e vice-versa, já que ninguém tem ouvido de penico para  ficar mais meia hora só na base do Bum-Bum-Prá-ti-cumbum- burungundu.
         Será que isso explica porque o próximo samba-enredo da escola que vai homenagear o Maranhão, a Beija-Flor, tenha tido 14 compositores?  14? Será que estou ficando doido? ( E olha que no meio desse batalhão não colocaram nem meio compositor daqui, se não estou enganado.)
         Vá lá , minha vista sofre os efeitos deletérios da idade, mas pelo menos, foi isso o que conferi depois de cinco leituras sucessivas para confirmar. O que significa que, provavelmente, cada um escreveu três palavras, ou , sendo otimista, um verso. Pela quantidade de autores,  a obra não se trata mais de uma composição conjunta, mas de uma espécie de ONG  de doação de palavras - deve ter tido gente que contribuiu com um grito, talvez, como esse tal de Rômulo Presidente. Quanto ao  resultado, tentemos entender:


         Tem magia em cada palmeira que brota em seu chão
         (Que palmeiras? Será que estão se referindo às buraqueiras? Estas, de fato, parecem mágicas, pois nunca acabam).

         O homem nativo da terra resiste em bravura a dor da invasão
         ( Nada de resistência. Invasão é com a gente mesmo, do Coroadinho à Vila Palmeira)

         Do mar vem três coroas
         ( Só três? No dia em que só vierem três coroas entre os marinheiros que chegam no Itaqui as periguetes se suicidam nas águas do porto)  
        
         Irmão seu olhar mareja no balanço da maré
         ( Hoje em dia, nem espigão quer saber mais de balanço de maré. O único balanço que o povo quer saber é o do forró, já que nesta ilha não se ouve outra coisa)

         A maldade não tem fé sangrando os mares
         ( E desde quando maldade precisa de fé? Os dirigentes das mais importantes instituições desta cidade não precisaram de fé para anunciarem o abandono do Centro da cidade, como se este fosse uma velha caquética e condenada. )

         Mensageiro da dor, liberdade roubou dos meus lugares
         ( Liberdade por aqui, ao que se saiba, só o bairro.  Ainda assim só restou o nome)

         Rompendo grilhões em busca da paz
         ( Romper grilhões nada mais garante.  Quem estiver em busca de paz que não saia para o trânsito, senão ou  volta morto por um motoqueiro ou matará um)
                 
         ...Chegou de Daomé, chegou de Abeokutá toda magia do vodun e do orixá
         ( Sem dúvida, é mais fácil mesmo vir de Daomé e de Abeokutá do que de avião,  com um aeroporto...desses )

         É rainha o bumba-meu boi vem de lá
         ( O grande problema dos homens de São Luis é que o bumba-boi vem de lá, mas os chifres nunca se sabe de onde vêm)

         No radio o reggae é do bom marrom é o tom da canção na terra da encantaria e da arte do gênio João
         ( Esse João é o João do Vale ou o do Trinta?)

         Meu São Luis do Maranhão Poema encantado do amor     Onde canta o sabiá
Hoje canta o beija-flor
         ( A Teoria da Evolução explica muito bem isso, Gonçalves Dias! Melhor um beija-flor na mão que dois sabiás voando)

         P.S. Se a explicação não tiver sido convincente, o leitor não deve esquentar com isso. Confira a melodia do samba-enredo, que, segundo soube, terá uma introdução triunfal com  Ilha Magnética,  do César Nascimento. O que não é pouca coisa!

                                                                  ewerton.neto@hotmail.com
        


         

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