sábado, 30 de junho de 2012

COLA JESUS, PARA PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL

artigo publicado hoje, sábado, na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal O estado do Maranhão



A Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro acaba de aprovar projeto de lei do deputado Luis Martins (PDT) que confere à cachaça o status de Patrimônio Histórico e Cultural do Estado do Rio de Janeiro. O projeto foi aprovado sem discussão.

                        Pois é, quem diria... a cachaça agora vai virar Patrimônio Histórico e Cultural (PHC) do estado do Rio e ao que tudo indica será, em breve, nacional. Pensando bem, nada mais justo já que somos todos cachaceiros, não é mesmo, senhores deputados? Os ilustres parlamentares cariocas só esqueceram de lembrar também da ‘Bala Perdida’, esse patrimônio carioca, não tão perdido assim, que , para os lados das favelas do Rio e dos apartamentos luxuosos ao redor, sempre encontra um no caminho.
                        Por aqui o Tambor de Crioula já foi considerado PHC nacional. Parece-me que o Bumba-Boi está tentando, ou já conseguiu, e o Bloco Carnavalesco também. Neste Brasil em que tudo é festa e tudo é cultura e vice-versa, nada mais justo que o PHC entre como a cobertura do bolo da eterna festa da cultura. Nada como inserir novas sugestões:

1.            O Guaraná Jesus. Como falta imaginação para os nossos deputados! Enquanto os do Rio já elegeram a cachaça, como se esta fosse deles, por que será que, por aqui,  ninguém se lembrou da Jesus? Ninguém sabe até hoje se seu sabor é de canela, de álcool, de sorvete, de açúcar, ou se simplesmente tem sabor. Mas sabe-se perfeitamente que o Guaraná Jesus é um fenômeno genuinamente maranhense que nos causa mais orgulho do que, por exemplo, sermos  do Estado onde se falava o melhor português do Brasil ( alguém ainda se lembra disso?), tanto é assim que os aeroportos de ida dos turistas maranhenses são repletos de caixas e mais caixas de Jesus, como se esta fosse a nossa principal marca. Mas, nunca se viu alguém com um livro de um autor maranhense. Mandem brasa, senhores deputados!



2.              A corrupção. Não sejamos tão pretensiosos assim, esta é nacional. Onde encontrar fenômeno cultural brasileiro mais enraizado do que este, num país em que tudo nasce corrompido: da água ( que vinda do poço e é vendida como mineral) à cachoeira que jorra no Congresso? Até os bebês já nascem corrompidos, porque são adquiridos pelas mães no vizinho, sem que o marido saiba. Certo, alguém há de dizer que a corrupção não pode ser escolhida como brasileira porque existe em todo lugar, já que é intrínseca à natureza humana.
                        Vá lá, mas nunca em outro país do mundo a corrupção é tão aceita, tão desejada e tão festejada. Em nenhum lugar do mundo os acusados de corrupção são tão idolatrados como no Brasil (recentemente, os abraços de Lula, nosso venerado ex-presidente, em Paulo Maluf são provas eloqüentes disso etc.etc.etc.). Que se torne logo, portanto, um PHC nacional reconhecido universalmente, nem que para isso se torne necessário corromper algum jurado. O que, aliás, para nós, seria tão fácil.

                        3. O grito de Gol de Galvão Bueno. Existe som mais cultural e tipicamente nacional do que o grito de gol de Galvão Bueno? Em tudo esse som estridente revela, como nenhum outro, a alma brasileira. A cafagestada, o patriotismo de araque, o jogar para a torcida, o oportunismo - de um farsante em favor de uma grana milionária. Responda depressa, caro leitor. O que lhe arrepia mais em termos de simbolismo patriótico: o Hino Nacional ou o grito de gol de Galvão Bueno? Ora, claro que é o grito do locutor da Globo: interminável, agourento, insuportável, mas capaz de aliviar todas as mágoas nacionais. Que se eternize, então, esse som como símbolo de até onde pode chegar a riqueza da diversidade cultural brasileira.

4.                      O horror à literatura. Seria esse título o mais indicado para introduzir esse fenômeno cultural tipicamente maranhense dos dias atuais, como nosso patrimônio histórico cultural?  Nossa terra já foi o lugar onde outrora se falou o melhor  português do Brasil e foi também o lugar  considerado Atenas Brasileira. Hoje é um lugar onde seus universitários lêem menos de um livro por ano e em que Feiras de Livro apresentam cantores como principais atrações, porque senão ninguém vai. ( Vide Chico César, Imperatriz, Feira do Livro). Em que se dilaceram concursos literários tradicionais  e em que os autores premiados têm de ir à Justiça para receber os prêmios que lhes foram outorgados.
                        “Toda mutação  cultural generalizada deveria merecer tornar-se também Patrimônio Histórico e Cultural”, principalmente numa festa em que todo mundo pensa que deve caber todo mundo. Avante, senhores deputados!

                                                           ewerton.neto@hotmail.com                                                                      http://www.joseewertonneto@blogspot.com

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