Artigo publicado na seção Hoje é dia de...Caderno Alternativo,
jornal o Estado do Maranhão, hoje, sábado.
Deus existe ou não? Segundo li, numa revista, menos de 20%
da comunidade científica acredita em Deus. Igualmente, é grande o número
de pessoas que se consideram ateus, justamente nos países onde é mais
elevado o conhecimento técnico e científico ( em algumas nações chega a mais de
50%). De fato, temos que admitir que o exercício da fé se torne mais
árduo quando confrontado às bases científicas que traduzam algo do que já
se sabe sobre o universo: sua grandiosidade, as leis físicas que o geraram, a
infinita pequenez da raça humana, sua fragilidade diante da natureza e,
principalmente, da natureza diante de um espaço-tempo avassalador.
Diante dessa questão, sabidamente complexa, as pessoas se manifestam, em
resumo, de três formas: uma, a de crença absoluta, que pode ser por ignorância;
a segunda, de descrença ou ateísmo que se pretende fundamentado na
ausência de provas captáveis pela ciência; e uma outra, a de indiferença, na
qual se incluem os agnósticos. Na prática, o “não sei” dos
agnósticos resume uma cômoda permanência em cima do muro
sobre a questão que é como se dissessem como o mineiro que não quer se
envolver: “Sua ausência veio preencher uma lacuna” ou “Sou ateu, graças a
Deus!”. Curiosamente, existe uma passagem do Novo Testamento que parece
adequar-se àqueles que se confessam indiferentes. Na frase de Jesus Cristo:
“Prefiro os muito quentes ou muito frios, porque os mornos, eu os vomitarei.”
Penso que qualquer ser humano cuja compreensão e orgulho do sentido da própria
existência tenha alguma validade para si um pouco além do ato banal de
sobreviver, não pode se furtar a esta questão, apenas porque esta seja complexa
ou insolúvel. Essa busca, certamente mais grandiosa do que a descoberta em si,
perpassa uma tentativa de transcender a uma questão puramente metafísica para
que ela se imponha como suporte de suas relações com os demais seres humanos e
com seus valores existenciais. “A finalidade da existência humana não consiste
apenas em viver, mas em encontrar um motivo para viver”, dizia Dostoiévski.
Evidentemente, a tentativa de alcançar a solução do grande mistério “o que
somos; de onde viemos, para onde vamos” está na raiz do significado maior de
qualquer vida, que se pretenda digna disso.
Na minha adolescência li um livro que considero fundamental para o meu singelo
entendimento e que se chama “A
arquitetura do universo” do físico norte-americano Robert Jastrow.
As páginas do livro não tratam de um possível embate teológico ou mesmo
filosófico, tão costumeiros entre os cientistas modernos, mas da doação, para
mim repentina, dos mistérios do universo já conhecidos pela ciência em
linguagem accessível para leigos, como eu. Nem precisaria, então, gostar
tanto de Física, minha matéria curricular preferida, ou de Poesia (nos
meus impulsos extra-escolares) para concluir que nenhuma ficção desenvolvida
pelos melhores autores do mundo (Cervantes, Proust ou Dostoiévski ) seria
comparável à criação desse personagem chamado aventura humana, ali
descrita de forma espetacular: tão improvável, tão frágil e, ao mesmo tempo, tão misteriosa e – por que não? –
divina. Retiro do autor em questão esta última frase
de um de seus livros:
“Neste momento parece que a ciência nunca será capaz de erguer a cortina acerca
do mistério da criação... O cientista escalou as montanhas da ignorância; vê-se
prestes a conquistar o pico mais alto; à medida que se puxa para a rocha final
é saudado por um bando de teólogos que estiveram sentados ali durante séculos.”
A partir da leitura desse livro, sempre que posso leio outros que tratam do
tema da origem do Universo e que, virtualmente, descambam para uma possível
explicação (não-explicação) da existência de Deus. Desde livros com
argumentação científica como o do cientista Richard Dawkins, Deus
um delírio que vocifera contra a a fé e a crença, até os
livros que preferem debater o assunto com uma boa carga de bom-humor como o
delicioso e pragmático “ Explicando Deus numa corrida de
táxi” de Paul
Arden. Com mínimo rigor científico Arden chega à conclusão de que todos os que
ardorosamente debatem o assunto, religiosos x ateus, no fundo acreditam na
mesma coisa, e o embate é apenas uma questão formal . O que os céticos chamam
de força superior , os religiosos chamam de Deus. Ou seja, se
alguns preferem dar um rosto a Deus, isso é uma mera questão lingüística.
Antes que alguém pense que pretendo, no breve espaço desta crônica colocar remotas luzes sobre o debate , adianto
que o fim desta é menos pretensioso: apenas sugerir a leitura do livro de
Francis Collins, A Linguagem de Deus,
como perfeito complemento da curiosidade que qualquer um possa ter sobre a vida
e seus mistérios. Cientista, como Dawkins, diretor do Projeto Genoma que
trabalha com o que há de mais moderno no estudo do DNA, o código da vida, e um
dos mais respeitados cientistas da Terra, Francis Collins se coloca a favor da
crença em Deus, assumindo os riscos peculiares a quem, dentro de uma comunidade
que despreza qualquer argumento desprovido de provas concretas, argumenta
a favor da fé sem perder de vista o conhecimento científico. Sem receio de se
situar no limite da dúvida compara uma a uma as soluções trazidas pela ciência,
contrapondo-as à possibilidade de um ser superior, deixando um rastro de fé e
esperança que parte da dúvida, inclusive a notável improbabilidade da matéria
ter se formado, baseando-se apenas nos princípios de física conhecidos.
Ao fim de sua leitura, independente de
qualquer crença, ouso dizer, que haverá um notável adendo ao cabedal de
qualquer um, em termos de discernimento e argumentação científica
sobre o tema. No meu caso, além disso, a consolidação da solidificação de uma
verdade já cristalizada há muito tempo: há muito maior grandeza humana em se
acreditar em Deus que em não acreditar. cristalizou-se
a verdade que já desconfiava. dúvida é essencial quando nem todos os
caminhos levam a Deus, muito pelo contrário. A satisfação com a leitura de um
livro que vai agradar tanto aos ateus quanto aos religiosos, no meu caso
particular talvez tenha sido porque me trouxe uma confiança que já tinha e que
independe de se acreditar ou não. A convicção não mais divina ou laica de que
Quanto menos evidências houver, sempre haverá maior Há mais grandeza humana em
se acreditar em Deus.
http://www.joseewertonneto.blogspot.comA linguagem de Deus
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