sábado, 1 de novembro de 2014

O PESO DAS PALAVRAS




Artigo publicado na seção Hoje é dia de...
Caderno Alternativo, jornal o Estado do Maranhão, hoje, sábado


O PESO (NUNCA LEVIANO) DAS PALAVRAS


As palavras que, como se sabe, são seres vivos (no dizer do escritor Vítor Hugo ), talvez por causa disso, têm peso. Algumas são muito  densas, outras nem tanto e isso varia, nem sempre dependendo do seu significado, mas conforme a circunstância e o local. O que, aliás, está de acordo com o capítulo de  Física que trata disso.
             Qual, por exemplo,  o peso da palavra Leviana? Seguramente, não é tão leve quanto a sua própria sonoridade e origem etimológica sugere. A julgar pelas últimas eleições deve pesar muito mais do que obras realizadas, argumentos estatísticos, explicações econômicas, ou acusações de corrupção, a partir da conclusão a que chegaram especialistas políticos quando concluíram que a palavra Leviana saída da boca de Aécio Neves, no local errado e em hora errada, lhe custou milhões de votos  do eleitorado feminino provocando uma nova onda pró-Dilma num momento em que seu vigor eleitoral se  encontrava arrefecido. Explicação: depois desse  xingamento, intencional ou não, milhares de mulheres mudaram de intenção de voto por se sentirem ofendidas,  em solidariedade à condição feminina da presidente do Brasil.




                                                        





            Será? Dá para dimensionar seu alcance? Evidente que não e foge do  propósito desta crônica avaliar em que medida isso influenciou ou não. Antes,  o propósito aqui é o de  lembrar o que sempre anda muito esquecido - especialmente nas redes sociais onde as palavras são atropeladas pelos urros : ou seja, que  os pensamentos, hoje em dia,  não estão tratando bem as palavras, talvez por estarem, quase sempre, num nível inferior a elas.   As  palavras têm peso sim, sempre tiveram  e é preciso muito cuidado com isso  porque se maltratadas ou usadas fora de hora e a reboque de pensamentos que as tratam como cavalos puxados por cabrestos, elas se vingam, se impõem  e... pesam.

            Senão,  voltemos à  palavra Leviana. Do dicionário Larousse: 1. Que procede ou julga precipitadamente sem refletir, imprudente 2. Sem seriedade, que procede repreensivelmente 3. Leve.

            Portanto, eliminando-se a terceira conotação, hoje totalmente em desuso, vê-se que existe claramente entre os dois primeiros significados uma diferença de peso, quanto se trata de pender mais para a ofensa ou não. A segunda hipótese é mais densa nesse sentido:  ao acusar  uma mulher de leviana alguém a estará acusando de não ser séria, ou de uma mulher que age de forma repreensível. Ora, se alguém a classifica de algo assim poderia estar chamando-a de puta, ou quase puta, de vagabunda ou quase isso, não?

            Torna-se bastante sintomática, então, a questão do peso relativo se  lembrarmos que a palavra Leviano,  aplicada ao sexo masculino, parece não ter uma conotação tão arrasadora. Talvez porque acusar uma mulher de agir de forma repreensível a aproxime perigosamente do pior insulto que pode desqualificar uma pessoa do sexo feminino, que é o de ser chamada de puta. Todas as mulheres com quem comentei tal assunto, inclusive as que não haviam se dado conta, acharam profundamente lamentável a pronunciação de Aécio Neves, ao qual se aderiu, perigosamente, sua fama de conquistador de atrizes da  Globo, aliadas a especulações perfidamente alimentadas pelas redes sociais em torno de uma possível conduta amoral




                                                  




.
            Guardo a impressão de que Aécio não se deu conta do alcance do erro que estava cometendo, ao adotar o deslize muito comum, hoje em dia, de não atentar, para o peso que têm as palavras. Ele simplesmente não se deu conta, por não ter vivência popular, com outra implicação que se refere aos fatores  que podem influenciar esse peso,  como foi sugerido acima: a ambiência, o local e as circunstâncias.  Ora, no meio social frequentado por ele,  chamar alguém de  leviano talvez não ofenda tanto, porque as pessoas desse ambiente, de poder aquisitivo mais elevado,  interpretam a palavra  em questão aproximando-se de sua primeira interpretação, porém  quando se vai em direção às classes menos favorecidas o Leviana soa progressivamente mais ofensivo . Ao perigo de não se saber o peso das palavras soma-se mais um; o de não conhecer o poder de sua relatividade.
            Complicado? Nem tanto, se as pessoas lessem mais, cada vez mais e procurassem intuir melhor as palavras, para poder,  em contrapartida,  seduzi-las com empatia. 





                                                   






            Se as tratássemos bem não se vingariam jamais de nós, não é mesmo Aécio? Antes de chamar a uma mulher de Leviana da próxima vez (seja ela presidente ou não, presidenta ou não ) é mister que, na pressa do pensamento, você não olvide jamais as palavras. Incapazes de correrem como os pensamentos, elas não têm tanta pressa assim, mas têm peso. Ainda que, curiosamente, flutuem.

                                                                                              ewerton.neto@hotmail.com                                                                    http://www.joseewertonneto.blogspot.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário