Artigo publicado hoje, quinta, no jornal
o Estado do Maranhão
Tudo começou quando o pequeno Abel, o filho de Adão e Eva,
aproximou-se dos pais para ver aquilo que os dois estavam fazendo. Claro, os
dois estavam tão concentrados (ou enlevados, ou seduzidos, ou distraídos) que
não atentaram para a curiosidade do menino e, pronto, estava formada a primeira
fila humana da qual se tem notícia.
De lá para
cá as filas tomaram conta de tudo – e de todos. Uma revista científica, este
mês, lamenta que em pleno século XXI os homens não tenham inventado para
organizarem-se algo melhor do que filas, o que não é de estranhar. Até hoje os humanos
ainda não inventaram um equipamento de proteção contra a chuva melhor do que o
guarda-chuva ou algo para puxar saco de alguém melhor do que reuniões que, no
final das contas, não passam de filas de babacas, em torno de uma mesa e um chefe. O certo é que, por costume ou sei
lá o quê, de tanto conviverem com as filas, os homens adotaram cada vez mais as
mesmas. Brasileiros, em especial.
Brasileiro
adora uma fila! Vive reclamando , mas
adora. Senão, como explicar que se sujeitem a permanecer horas e horas numa
fila de loteria, sabendo de antemão que suas chances de ganhar são tão
intensamente miseráveis quanto grandiosas são suas chances de estar fazendo
papel de idiota para um Governo que lhe explora? Brasileiro gosta tanto de
fila, que de algum tempo para cá passou a responder a quem lhe pergunta como
vai usando a expressão “A fila anda!”, querendo dar a entender que as coisas estão
mudando para melhor.
Vai gostar
de fila assim, na fila do inferno!,
disse-me um dia um matemático amigo meu , que , a essas
alturas , deve estar enfileirado numa fila de psicopatas. Foi ele que, outro
dia, para confirmar a sua teoria da predileção do brasileiro por filas,
postou-se em pleno sol de meio dia, no meio da praça Deodoro, olhando fixamente
para o sol, com os óculos escuros. Imediatamente, acercou-se alguém para
perguntar o que ele estava observando. “Uma fila de sombras querendo entrar no
sol”, respondeu, adiantando que aquele seu lugar era o único propício para observar
isso. Quando seus olhos se cansaram, afinal,
olhando desta vez para trás, o que viu lhe confirmou a pesquisa: havia mais de
cem pessoas querendo desfrutar da mesma informação. Quando se afastou,
desnecessário dizer da expressão de agradecimento e vitória daquele que ocupou
o seu lugar.
“O
brasileiro só se sente bem se estiver numa fila”, completa. E estas bem que proliferam
ao gosto do freguês: fila para deixar criança em colégio; fila de guardador de
carro para guardar seu carro; fila de jogo de futebol, fila de bolsa família e
fila do ENEM. Evoluíram, aprimoraram-se e tornaram-se pós-modernas. Entre as
mais recentes; de filas de motos nos
estacionamentos a filas de motoqueiros estendidos no asfalto; De filas de bois despachados do Porto do
Itaqui a filas de chifrudos que permaneceram na ilha, etc. etc
Finalizando
a sua robusta pesquisa o estudioso amigo meu conseguiu destacar as 3 leis
fundamentais da ‘sua’ Teoria das Filas:
1.A única
fila em que pobre chega na frente é de espermatozoide. (Mas ao chegar, já entra
na fila dos arrependidos.)
2.O direito
das filas geralmente obedece a lei domais forte. Ou do mais rico, ou da mais boazuda.
3.Nenhum ser
humano se livrará da fila. Nem que seja a do seu enterro.
Até mesmo
porque, aí mesmo é que a fila anda.
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