sábado, 9 de janeiro de 2016

O MELHOR LIVRO QUE NÃO LI ( MAS GOSTEI)



NO CORAÇÃO DO MAR 

artigo publicado quinta-feira, no jornal
o Estado do Maranhão

Não li e não gostei. Assim dizia o saudoso Erasmo Dias a respeito de algum  livro que não havia lido, e que antecipadamente desprezava,  expondo sua desaprovação em relação a algo que essa obra lhe incutia: antipatia ao autor, ao tema da obra, enfim a algo capaz de desapontá-lo à simples menção,  e que não admitia sequer uma revisão redentora.
            Essa postura pode ter também o seu inverso no mundo da literatura. Foi o que descobri  assim que enveredei no mundo lúdico e assombrado da leitura: neste caso, o livro que ainda não se leu, mas do qual já se gosta, independentemente da leitura que um dia deste se fará, ou não. Refiro-me, ao romance Moby Dick, de Hermann Melville que se tornou,  para mim, depois que adquiri um exemplar de uma bela edição do mesmo, o melhor livro “que ainda não li, mas gostei”.

                                          






             “Mas, como se pode ter a audácia de classificar um livro como melhor  sem sequer tê-lo lido?”,  pode perguntar alguém.
            Sem outra  solução como resposta  só me restaria arguir   que a literatura  têm dessas coisas. Insinuo,  depois de haver lido uma boa penca deles, que um romance não é somente o que está escrito, mas o que sugere ou simboliza; ou ainda, o que  está antes mesmo da construção do enredo, palavra após palavra. “Desgraçado do escritor que não consegue fazer o seu leitor participar da montagem do sonho que idealizou!”, disse alguém. E essa montagem do sonho, começa a ser  edificada pela mente do  leitor antes e além da própria leitura.
            Faz algum tempo, pois,  que, tendo adquirido o livro, nunca me decidira  a lê-lo por uma razão oculta,  até para mim. Teria sido por reverência ou por receio de que a leitura não comprovasse o êxtase idealizado? Acredito que não. Um escritor da estirpe de Herman Melville não decepcionaria a ninguém, principalmente tendo sido a epopeia descrita por sua caneta extraída de fatos reais, vivenciados por uma gigantesca baleia e seus perseguidores humanos o que faz disparar todos os processos coletivos e inconscientes de defesa diante do ambiente inóspito, o que se constitui na quintessência de uma aventura de sedução imediata. 


                                                 






Melville personificou essa tensão, porém, personificou também a eterna luta do gênero humano contra o seu destino fatal, através da transfiguração, em poesia, da batalha de intrépidos baleeiros não contra um monstro representando as forças do mal, como querem alguns, mas contra um deus da natureza, tentando cravar-lhe um arpão não para sangrá-lo e simplesmente liquidá-lo, mas para dizer eu sou homem, eu estou aqui, eu quero saber.
            Por isso fui assistir o filme No coração do mar que é a versão cinematográfica  do livro de Nathaniel Philbrick e que esmiúça a verdadeira história de Moby Dick e sua saga. Iniciei assim, finalmente,  a leitura pelo caminho inverso, primeiro o filme, depois os dois livros.  

                                       



            Nem precisa dizer que estou me extasiando, e consagrando uma interessante forma de ver uma obra de arte de três modos, quase que simultaneamente. Assistido o filme,  leio  um trecho da verdadeira história e depois vejo o que um notável ficcionista  é capaz de fazer com um fato real.             Sugiro, pois, que, na impossibilidade de usufruir das três, o leitor se compraza com pelo menos uma, que já será grande coisa. Comprovando que minha intuição estava certa, agora posso confirmar que o Moby Dick é realmente um dos  melhores livros que alguém poderia não ler, mas gostar.
                                                                                  ewerton.neto@hotmail.com  

                                                           http://www.joseewertonneto.blogspot.com

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