terça-feira, 26 de janeiro de 2016

SUICIDAS ( À PROCURA DE )




https://www.youtube.com/watch?v=ZNlO01ob9is


‘ UM VERDADEIR ROMANCE POLICIAL. DENSO.
DE SUSPENSE.
COMO SE FOSSE UM BOM ROTEIRO
DE CINEMA.
COM A IRÔNICA NARRATIVA DO MATADOR
DE SUICIDAS INDECISOS, APROVEITA O AUTOR PARA  MOSTRAR
EM PROFUNDIDADE, A FRAGILIDADE DAS PESSOAS E A  SOCIEDADE
COMO UM ORGANISMO
CONTAMINADO,  DOENTE”
Jose Louzeiro


à procura de suicidas











Em 1992 Ferreira Junior e João de Paula Aragão  publicaram no caderno Alternativo, do jornal O Estado do Maranhão, esta resenha que se tornaria um clássico da crítica maranhense,  sobre o recém publicado livro O Prazer de Matar que vinte anos após seria relançado em São Paulo
O livro que ganhou um concurso literário do SIOGE ( Serviço de Imprensa e Obras Gráficas , mais tarde extinto) seria transformado, após revisão e adaptação do autor,  na terceira edição agora publicada pela Arte Pau Brasil SP.


            O oficio de matar suicidas é um policial. Ponto. Mas que policial surpreendente revelou-se. Primeiro  porque é um policial às avessas, que parte de um pobre-diabo, pondo seus serviços à disposição da sociedade: esse é o primeiro clichê seguido por nove entre dez policiais. Nos policiais clássicos também o detetive é um ser desenraizado, que tenta achar a sua identidade na proporção mesma em que busca a de outro.
            O oficio de matar suicidas parte dessas premissas, mas seus fins são outros. Não há na novela  um homem tentando achar assassinos. Há um homem atrás das vítimas, Não há um homem que busca sua identidade na do  outro, mas um homem que busca identificar-se na aniquilação do outro. Não se trata de uma tragédia.




                                         






            A novela segue uma consolidada e maravilhosa transição da literatura ocidental e, principalmente, ibérica; é uma novela picaresca, e essa novela picaresca da tradição ibérica põe em cena justamente um pobre diabo  à caça de expedientes para se dar bem na vida, sabendo de antemão que aquilo não vai dar certo. Pícaro é o bufão, o canalha, mas o canalha de bom coração, o sujeito atrapalhado que mesmo quando as coisas dão certo para si, é melhor que não tivessem dado. A tradição ibérica desse tipo de novela remonta aos séculos dezesseis e dezenbove. Um exemplo clássico são as cheias de trapalhadas novelas exemplares de Miguel de Cervantes. O oficio de matar suicidas tem um narrador que quer ser exemplar. Quer dar exemplos. Quer dar conselhos. A novela termina com uma espécie de prelação, de sermão desvalido, dado pelo narrador.
            Já dissemos que Jose Ewerton Neto segue uma linhagem ibérica. Podemos ir mais longe e mostrar que essa coisa do herói sem nenhum caráter vai mais longe. É verdade que essa tipologia at´[e pouco tempo era considerada desclassificada. Na Grécia e em Roma, as comédias eram consideradas um gênero inferior. De certo modo, isso acontece até hoje, Comédia é gênero para divertir-se , gênero baixo, para as camadas inferiores da sociedade. Quantas comédias de Shakespeare tu conheces, leitor? Bem, isso, enfim, não vem ao caso. O certo é que o gênero aclimatou-se perfeitamente no país, Jose Ewerton está em companhia de Manuel Antonio de Almeida, de Lima Barreto, não tanto de Machado de Assis que usa um tom maior, afinal trata sempre das elites, não se vê desclassificados estrelando os romances de Machado. O tom de O oficio de matar suicidas é galhofeiro. As situações criadas são pontuadas pelo escárnio. Logo no começo vê-se ideia genial do autor coberta de moa – não confundir com mofo. A ideia genial que mudaria a vida do narrador tinha surgido de uma mosca na sopa. Por ai a novela segue.
            Ao ler o trabalho de Ewerton Neto, é quase impossível escapar a tentação de compará-lo  a outros escritores. O narrador da novela  O oficio de matar suicidas é um desclassificado. Já dissemos isso antes. Mas desclassificado também é o personagem do conto “O Cobrador” de Rubem Fonseca. Desesperançados também são os protagonistas da peça de Plinio Marcos, Dois perdidos numa noite suja. Esses escritores, como tantos outros, colocam em cena uma camada da sociedade que só vira notícia nas páginas policiais dos jornais ou quando tem arrastão. Trata-se do lúmpen- proletário, repudiado até pelo marxismo. Só Marcuse encontrou algum potencial revolucionário no lúmpen. Criativo, Ewerton Neto tratou do lúmpen com elegância e humor, bastante raro entre os famosos escritores do gênero policial.




                                            






            De resto, ousamos discordar de Jose Louzeiro. O peso do narrador é sempre contraponteado pela leveza da narrativa. Logo, a novela não é densa, é leve. Leve por ter sempre em mente tirar o peso da estrutura da narrativa e da linguagem. Leve como é leve Machado, Lima, Almeida. Leve como não é Guimarães Rosa, Euclides, Clarice. Éóbvio que a beleza é uma qualidade. Uma das qualidades que deve nortear a literatura – e porque não a vida, que já é deveras pesada, tornando insustentável a leveza do ser – do próximo milênio, segundo o grande escritor italiano Italo Calvino. Ler coisas como O Oficio de matar suicidas torna a vida mais leve. 

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