Artigo publicado no jornal O Estado do Maranhão.
http://www.blogsoestado.com/ewertonneto/
Felicidade ou morte é o título de um dos livros da lista brasileira
de best-sellers de autoajuda. Portanto, caro leitor, seja feliz ou morra, mas,
se preferir, compre depressa o livro e
saia por aí dizendo que é feliz. Caso se sinta longe disso, minta que é feliz,
grite que é feliz, jure que é feliz. Ou isso ou a morte. Qual dos dois você
prefere? Claro que não é a morte, não?
Mas, pera aí. Pense, por alguns segundos, que Suzana Vieira
se diz feliz, Galvão Bueno também, e Renan Calheiros, e Nicolás Maduro, e Donald
Trump. Hum...E aí? Tem mesmo certeza de
que vale a pena ser feliz? Enquanto isso:
Fomos encontrar a Felicidade. Ela
própria. Soubemos que está depressiva e fomos saber o que ela pensa a respeito
de mais um livro sobre si. Estava pronta para desabafar.
-
Não aguento mais.
-
O quê, precisamente, Dona Felicidade?
-
Tanta gente obsessiva atrás de mim. Tanta procura, tanta adulação, tanta loucura. Tanta gente
que diz que me possui. E, pior, sequer sabem o que sou e quem eu sou.
-
E quem você é?
-
Isso é o que eu gostaria de saber. Todos tentam me explicar: filósofos,
médicos, escritores, psicólogos, cientistas... Séculos e séculos dedicados a
isso, em vão. Só palavreados pra lá e pra cá. Se felicidade é isso que todo
mundo pensa que eu sou, desconfio de que nunca fui feliz e nunca vou ser.
-
Se a sra. me permite, estamos diante de mais um problema de identidade. Isso
costuma ser grave nas pessoas sensíveis como a senhora.
-
Se fosse apenas isso... A questão é que, mesmo sem saber quem sou me procuram
como se eu fosse a chave da salvação para tudo e todos. De repente, me julgam capaz
de resolver todos os problemas do mundo. Ora, eu
não sou Deus! Não posso livrar alguém de suas muitas mortes. Definitivamente,
não sirvo pra isso.
-
Muitas mortes!? Julgo que estou entendendo a senhora. Não há só uma morte, mas
várias, e cada ser humano é senhor das
suas, desde que as enfrente. No entanto,
transferem todas as suas mortes para a senhora. Tanta carga lhe fez
sobrevir o estresse, não foi?
-
Estou pra ficar louca com tudo isso!
-Poxa,
dona Felicidade! Como chegaram a tanto, como isso foi possível? Vejo-a extenuada,
cansada, pressionada por tanta incompreensão. Não sei o que dizer... Talvez... Bem,
só me resta sugerir...
-
O quê, pelo amor de Deus!
-
A sra. deveria procurar um analista, Dona Felicidade. Claro, nem todos se dão
bem, mas para muitos funciona. .
-
Jamais! Conheço-os muito bem: eles me usam de forma imprópria, como remédio
para seus doentes. Dizem: “procurem dona
Felicidade, ela resolverá seus problemas”. Ora, como um remédio pode procurar a si como remédio?
-
A sra. tem razão, desculpe minha insensatez. É que me causa amargura lhe ver assim,
infeliz. Queria muito que a sra. continuasse feliz. Para bem da vida humana, pelo
menos. Senão...
-
E quem lhe disse que me incomoda ser infeliz? E por que a morte me assustaria?
Acredite, com tanta gente falando asneira a meu respeito, dia e noite, até que
gostaria de ser infeliz, só para que me deixassem em paz, compreende? Estou
prestes a adotar um lema: Infelicidade ou morte!
ewerton.neto@hotmail.com
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